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INSTITUTO
HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Fundado
em 27 de dezembro de 2006.
VOLUME
XX
Montes
Claros
Minas Gerais - Brasil
2018
NOTAS
DOS
COORDENADORES DA EDIÇÃO
A
ordem de publicação dos trabalhos dos associados
efetivos obedeceu à sequência alfabética
dos nomes dos autores. Em seguida, foram ordenados os trabalhos
dos associados correspondentes e convidados; A Revista não
se responsabiliza por conceitos e declarações
expedidos em artigos publicados, nem por eventuais equívocos
de linguagem nela contidos. A revisão dos originais
foi feita pelos próprios autores dos artigos publicados.
Art.
2º - O IHGMC tem como finalidade pesquisar, interpretar
e divulgar fatos históricos, geográficos, etnográficos,
arqueológicos, genealógicos e suas ciências
e técnicas auxiliares, assim como fomentar a cultura,
a defesa e a conservação do patrimônio histórico,
artístico, cultural e ambiental do município de
Montes Claros e região Norte de Minas.
INSTITUTO
HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Sobrado de Dulce Sarmento
Rua Cel. Celestino, 140 - Centro - 39400-014 - Montes Claros/MG
(Corredor Cultural Padre Dudu)
REVISTA
DO INSTITUTO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Publicação Semestral
Diretor e Editor
Dário
Teixeira Cotrim
Conselho Editorial
Dário
Teixeira Cotrim
Wanderlino Arruda
Sebastião Abiceu
João de Jesus Malveira
Editoração e Diagramação
Gráfica Editora Millennium Ltda.
Dário Cotrim, Clarice Sarmento, Felicidade Patrocínio,
Marilene Tófolo, Sebastião
Abiceu, Cláudio Prates, Yury Tupinambá, Alberto
Sena Batista, Beto Caldeira e
Wanderlino Arruda
Impressão
Gráfica Editora Millennium Ltda.
ISBN: 978-85-67049-89-2
CAPA: Praça da Estação
SUMÁRIO
Diretoria 2018–2019 - 07
Associados Efetivos - 10
Associados Eméritos - 12
Associados Honorários - 12
Associados Correspondentes - 13
Homenagem a Associados Falecidos - 15
Apresentação - 17
Amelina Chaves
Para os Amigos que se Foram - 21
Antônio Augusto Pereira Moura
A Expansão dos Domínios Fechados em Montes
Claros - 25
Clarice Sarmento
A Boneca de Leonel - 46
Dário Teixeira Cotrim
A Boneca de Leonel - 49
Dóris Araújo
Ethomar Santoro - 53
Felicidade Patrocínio
Amelinha: Festa na Missa de Ressurreição
- 57
Harlen Soares Veloso
“Soarinho”: Um Homem Zeloso Pelo Bem Comum
- 60
Ivana Ferrante Rebello
Manoel Ambrósio de Oliveira: Um Escritor do Norte
de Minas Gerais, do Início do Século XX - 68
Jânio
Marques Dias
O Espaço Geográfico do Sertão Norte
Mineiro e Suas Múltiplas Visões de Mundo e de
Sagrado - 78
José Ponciano Neto
Maçonaria: “Segredos” que Instigam.
Eles Existem? - 88
Juvenal Caldeira Durães
O Talento que Surpreende - 95
Lázaro Francisco Sena
Cabo Santana, Você Conhece? - 98
Leonardo Álvares da Silva Campos
Prefácio - 106
Manoel Messias Oliveira
A Saga do Coronelismo - 111
Mara Narciso
Quando um Ídolo Vira Estrela, Torna-se Lenda -
117
Maria da Glória Caxito Mameluque
Lar das Velhinhas: Centro Feminino de Longa Permanência
- 120
Maria de Lourdes Chaves
O Bardo Lola Chaves – Historinha Seresteira - 126
Marilene Veloso Tófolo
Mirabela - 128
Narciso Gonçalves Dias
Terra da Criatividade - 133
Wanderlino Arruda
O Livro “Reflexões” de Marcelo Freitas
- 136
Virgínia Abreu de Paula
Crise de Saudade numa Tarde de Chuva - 141
Pedro Ribeiro Neto
A Arte Rupestre - 147
DIRETORIA
DO INSTITUTO HISTÓRICO E
GEOGRÁFICO DE MONTES CLAROS
Fundado em 27 de dezembro de 2006.
COMISSÃO FUNDADORA 2006-2007
Dr. Dário Teixeira Cotrim
Dr. Haroldo Lívio de Oliveira
Jornalista Luís Ribeiro dos Santos
Dr. Wanderlino Arruda
DIRETORIA
2018-2019
PRESIDENTE
DE HONRA |
Palmyra
Santos Oliveira |
PRESIDENTE |
Dário
Teixeira Cotrim |
1º
VICE - PRESIDENTE |
Lázaro
Francisco Sena |
2º
VICE - PRESIDENTE |
Sebastião
Abiceu dos Santos Soares |
DIRETOR-SECRETÁRIO |
Maria
Aparecida Costa |
DIRETOR-SECRETÁRIO ADJUNTO |
Maria
da Glória Caxito Mameluque |
DIRETOR DE FINANÇAS |
José
Ferreira da Silva |
DIRETOR
DE FINANÇAS ADJUNTO |
José
Jarbas Oliveira Silva |
DIRETORA
DE PROTOCOLO |
Wanderlino
Arruda |
Diretor
de Comunicação Social |
Silvana
Mameluque Mota |
Diretor
de Arquivo, Biblioteca e Museu |
Dorislene
Alves Araújo |
CONSELHO
CONSULTIVO
Membros
Efetivos
Maria de Lourdes Chaves
Terezinha Gomes Pires
Virgínia Abreu de Paula |
Membros
Suplentes
Magnus Dener Medeiros
Hélio Veloso de Morais
Maria Jacy de Oliveira Ribeiro |
CONSELHO
FISCAL
Membros
Efetivos
Evaldo Jener de Fátima
Expedito Veloso Barbosa
Narciso Gonçalves Dias |
Membros
Suplentes
Américo Martins Filho
Antônio Augusto Pereira Moura
Roberto Carlos Moraes Santiago |
COMISSÃO
DE GEOGRAFIA E ECOLOGIA
Rita de Cássia Oliveira Bichara
José Ponciano Neto
Evany Cavalcante Brito Calábria
Maria Regina Barroca Peres
Vânia Rosália Veloso Assis Dias
COMISSÃO
DE HISTÓRIA E ARQUEOLOGIA
Denilson Meireles Barbosa
Leonardo Álvares da Silva Campos
Clésio Kefren Paulino
Manoel Freitas Reis
César Henrique Queiroz Porto
COMISSÃO DE ANTROPOLOGIA,
ETNOGRAFIA E SOCIOLOGIA
Maria Ângela Figueiredo Braga
Hélio Antônio Maia
Jânio Marques Dias
Frederico Assis Martins
Eliane Maria Fernandes Ribeiro
COMISSÃO DE CLASSIFICAÇÃO E DE
ADMISSÃO DE SÓCIOS
Amelina Chaves
Marilene Veloso Tófolo
Juvenal Caldeira Durães
Zoraide Guerra David
Maria Lúcia Becattini Miranda
COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO E PUBLICAÇÃO
Júnia Velloso Rebello
Yury Vieira Tupinambá de Léllis Mendes
Ivana Ferrante Rebello e Almeida
Daniel Tupinambá Lélis
Maria Clara Vieira Lage
COMISSÃO
DE VISITA E APOIO
João
de Jesus Malveira - Coordenador
Edvaldo Aguiar Froes
Ângela Martins Ferreira
Felicidade Maria do Patrocínio Oliveira
Harlen Soares Veloso
COMISSÃO
DE PROMOÇÕES E EVENTOS
Ana
Valda Xavier Vasconcelos
Josecé Alves dos Santos
Teófilo de Azevedo Filho (Téo Azevedo)
Maria de Lourdes Chaves (Lola Chaves)
Augusta Clarice Guimarães Teixeira (Clarice Sarmento)
LISTA
DE SÓCIOS EFETIVOS DO IHGMC
CD |
Sócios |
Patronos |
01 |
Edvaldo
de Aguiar Fróes |
Alpheu
Gonçalves de Quadros |
02 |
Milene A. Coutinho Maurício |
Alfredo de Souza Coutinho |
03 |
Antônio Alvimar Souza |
Antônio
Augusto Teixeira |
04 |
Maria
do Carmo Veloso Durães |
Antônio
Augusto Veloso (Desemb.) |
05 |
Dóris
Araújo |
Antônio
Ferreira de Oliveira |
06 |
Marcos Fábio Martins Oliveira |
Antônio
Gonçalves Chaves |
07 |
Maria Aparecida Costa |
Antônio
Gonçalves Figueira |
08 |
Jânio
Marques Dias |
Antônio
Jorge |
09 |
Narcíso
Gonçalves Dias |
Antônio
Lafetá Rebelo |
10 |
Maria Florinda Ramos Pina |
Antônio
Loureiro Ramos |
11 |
Sebastião Abiceu dos Santos Soares |
Ary
Oliveira |
12 |
Antônio Augusto Pereira Moura |
Antônio
Teixeira de Carvalho |
13 |
Cesar Henrique Queiroz Porto |
Ângelo
Soares Neto |
14 |
Ana
Valda Xavier Vasconcelos |
Arthur
Jardim Castro Gomes |
15 |
Magnus Denner Medeiros |
Ataliba
Machado |
16 |
VAGA |
Athos
Braga |
17 |
Expedito
Veloso Barbosa |
Auguste
de Saint Hillaire |
18 |
Frederico
Assis Martins |
Brasiliano
Braz |
19 |
Paulo
Hermano Soares Ribeiro |
Caio
Mário Lafetá |
20 |
Felicidade Maria do Patrocínio Oliveira |
Camilo
Prates |
21 |
Terezinha
Gomes Pires |
Cândido
Canela |
22 |
Silvana
Mameluque Mota |
Carlos
Gomes da Mota |
23 |
Hélio
Veloso de Morais |
Carlos
José Versiani |
24 |
José
Ponciano Neto |
Celestino
Soares da Cruz |
25 |
VAGA |
Corbiniano
R Aquino |
26 |
Harlen
Soares Veloso |
Cyro
dos Anjos |
27 |
Regina Maria Barroca Peres |
Dalva
Dias de Paula |
28 |
Hélio
Antônio Maia |
Darcy
Ribeiro |
29 |
VAGA
|
Demóstenes
Rockert |
30 |
Maria
Lúcia Becattini Miranda |
Dona
Tirbutina |
31 |
Clarice Sarmento |
Dulce
Sarmento |
32 |
José
Catarino Rodrigues |
Edgar
Martins Pereira |
33 |
Wanderlino Arruda |
Enéas
Mineiro de Souza |
34 |
Geralda Magela de Sena e Souza |
Eva
Bárbara Teixeira de Carvalho |
35 |
Antônio
Ferreira Cabral |
Ezequiel
Pereira |
36 |
Felicidade Vasconcelos Tupinambá |
Felicidade
Perpétua Tupinambá |
37 |
Evaldo
Gener de Fátima |
Francisco
Barbosa Cursino |
38 |
Maria Inês Silveira Carlos |
Francisco Sá |
39 |
VAGA |
Gentil
Gonzaga |
40 |
Maria da Glória Caxito Mameluque |
Georgino
Jorge de Souza |
41 |
Reinine Simões de Souza |
Geraldo
Athayde |
42 |
VAGA |
Geraldo
Tito da Silveira |
43 |
Benedito de Paula Said |
Godofredo
Guedes |
44 |
Roberto Carlos M. Santiago |
Heloisa
V. dos Anjos Sarmento |
45 |
VAGA |
Henrique
Oliva Brasil |
46 |
Eliane Maria F Ribeiro |
Herbert
de Souza – Betinho |
47 |
Amelina
Fernandes Chaves |
Hermenegildo
Chaves |
48 |
Maria das Dores Antunes Câmara |
Hermes Augusto de Paula |
49 |
José Ferreira da Silva |
Irmã
Beata |
50 |
Délio Pinheiro Neto |
Jair
Oliveira |
51 |
Evany
Cavalcante Brito Calábria |
João
Alencar Athayde |
52 |
Ângela
Martins Ferreira |
João
Chaves |
53 |
Vânia
Rosália Veloso Assis Dias |
João
Batista de Paula |
54 |
Cláudio
Ribeiro Prates |
João
José Alves |
55 |
Lázaro Francisco Sena |
João
Luiz de Almeida |
56 |
Ivana Ferrante Rebelo |
João Luiz Lafetá |
57 |
Euprônio
Costa Campos |
João
Novaes Avelins |
58 |
Maria Ângela Figueiredo Braga |
João
Souto |
59 |
VAGA |
João
Vale Maurício |
60 |
Manoel Messias Oliveira |
Jorge
Tadeu Guimarães |
61 |
Clésio
Kefren Paulino |
José
Alves de Macedo |
62 |
José
Jarbas Oliveira Silva |
José
Esteves Rodrigues |
63 |
VAGA |
José
Gomes Machado |
64 |
Palmyra
Santos Oliveira |
José
Gomes de Oliveira |
65 |
Maria de Lourdes Chaves |
José
Gonçalves de Ulhôa |
66 |
Fabiano Lopes de Paula |
José
Lopes de Carvalho |
67 |
Denilson
Meireles |
José
Monteiro Fonseca |
68 |
Benjamim
Ribeiro Sobrinho |
José
Nunes Mourão |
69 |
Rita
de Cássia Oliveira Bichara |
José
(Juca) Rodrigues Prates Júnior |
70 |
VAGA |
José
Tomaz Oliveira |
71 |
Edwirges Teixeira de Freitas |
Júlio
César de Melo Franco |
72 |
Júnia
Veloso Rebello |
Lazinho
Pimenta |
73 |
VAGA |
Lilia
Câmara |
74 |
Filomena
Alencar Monteiro Prates |
Luiz Milton Prates |
75 |
Alceu
Augusto de Medeiros |
Manoel
Ambrósio |
76 |
Manoel
Freitas Reis |
Manoel
Esteves |
77 |
Maria Jacy de Oliveira Ribeiro |
Mário
Ribeiro da Silveira |
78 |
Américo Martins Filho |
Mário
Versiani Veloso |
79 |
Valdecy
Gouveia Rodrigues |
Mauro
de Araújo Moreira |
80 |
Vaga |
Miguel
Braga |
81 |
Juvenal Caldeira Durães |
Nathércio
França |
82 |
Josecé
Alves dos Santos |
Nelson
Viana |
83 |
Daniel
Oliva Tupinambá de Lélis |
Newton
Caetano d’Angelis |
84 |
Itamaury Telles de Oliveira |
Newton
Prates |
85 |
VAGA |
Armênio
Veloso |
86 |
Zoraide Guerra David |
Patrício
Guerra |
87 |
VAGA |
Pedro
Martins de Sant’Anna |
88 |
João
de Jesus Malveira |
Plínio
Ribeiro dos Santos |
89 |
VAGA |
Robson
Costa |
90 |
Teófilo Azevedo Filho (Téo) |
Romeu
Barcelos Costa |
91 |
Wesley Caldeira |
Sebastião
Sobreira Carvalho |
92 |
VAGA |
Sebastião
Tupinambá |
93 |
Dário Teixeira Cotrim |
Simeão
Ribeiro Pires |
94 |
Luiz Pires Filho |
Teófilo
Ribeiro Filho |
95 |
Marilene Veloso Tófolo |
Terezinha
Vasquez |
96 |
Yure
Vieira Tupinambá de Lelis Mendes |
Tobias
Leal Tupinambá |
97 |
Leonardo Alvares da Silva Campos |
Urbino
Vianna |
98 |
Mara Yanmar Narciso |
Virgilio
Abreu de Paula |
99 |
Virgínia Abreu de Paula |
Waldemar
Versiani dos Anjos |
100 |
Maria Clara Lage Vieira |
Wan-dick
Dumont |
Sócios
Correspondentes
Adriano
Souto - Belo Horizonte - MG
Alan José Alcântara Figueiredo - Macaúbas
- BA
Alberto Sena Batista -Grão Mogol - MG
André Kohene - Caetité - BA
Armênio Graça Filho - Rio de Janeiro - RJ
Avay Miranda - Brasília - DF
Carlos Lindemberg Spínola Castro - Belo Horizonte - MG
Carmem Netto Victória - Belo Horizonte - MG
Cláudia Correia Costa - Carvalho Luz - MG
Cintia Bernes - Belo Horizonte - MG
Célia do Nascimento Coutinho - Belo Horizonte - MG
Daniel Antunes Júnior - Espinosa - MG
Dêniston Fernandes Diamantino - Januária - MG
Enock Sacramento - São Paulo - SP
Eustáquio Wagner Guimarães Gomes - Belo Horizonte
- MG
Fernando Antônio Xavier Brandão - Belo Horizonte
- MG
Flávio Henrique Ferreira Pinto - Belo Horizonte - MG
Genoveva Ruisdias - Belo Horizonte - MG
Hermano Baggio - Pirapora - MG
Honorato Ribeiro dos Santos - Carinhanha - BA
Jeremias Macário Vitória da - Conquista - BA
João Martins - Guanambi - BA
José Francisco Lima Ornelas - África do Sul
Jorge Ponciano Ribeiro - Brasília - DF
José Walter Pires - Brumado - BA
Manoel Hygino dos Santos - Belo Horizonte - MG
Maria do Carmo de Oliveira - Porteirinha - MG
Moisés Vieira Neto - Várzea da Palma - MG
Pedro Oliveira - Várzea da Palma - MG
Regina Almeida - Belo Horizonte - MG
Reynaldo Veloso Souto - Belo Horizonte - MG
Terezinha Teixeira Santos - Guanambi - BA
Wellington Caldeira Gomes - Belo Horizonte - MG
Zanoni Eustáquio Roque Neves - Belo Horizonte - MG
Zélia Patrocínio Oliveira Seixas - Aracajú
- SE
Zilda de Souza Brandão (Bim) - Belo Horizonte - MG
ASSOCIADOS
HONORÁRIOS
Djalma
Souto Santos
Edilson Carlos Torquato
Irany Telles de Oliveira Antunes
Girleno Alencar Soares
João Carlos Rodrigues Oliveira
José Antônio Correa Mourão
Luís Ribeiro dos Santos
Mardete Dias Silveira
Newton Carlos do Amaral Figueiredo
Pedro Ribeiro Neto
Raquel Veloso de Mendonça
HOMENAGEM
A
ASSOCIADOS FALECIDOS
EPITÁFIO
Para
um túmulo de amigo
“A morte vem de manso, em dia incerto e fecha os olhos
dos que têm mais sono...”
(Alphonsus de Guimaraens - ossa mea, I.)
Dário
Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires
APRESENTAÇÃO
Estamos completando agora vinte volumes da
Revista do nosso Instituto
Histórico. É um trabalho árduo e ao mesmo
tempo gratificante, pois é a realização
de um sonho, superando todas as expectativas. É uma realidade.
Podemos dizer que o Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros se alicerçou de uma vez por todas com
a sua sede própria no antigo sobrado de Dulce Sarmento.
Portanto, “entendemos que a história não
representa apenas memória, porque esta pressupõe
tradição, passado, apologética, valores
no lugar dos quais se impõem verdade, tempo histórico
voltado para o presente e visão crítica”.
Em síntese, descobre-se que a história, além
da arte memorialista, é o caminho mais curto para a perfeição
e a valorização do conhecimento humano. Portanto,
durante esses quase doze anos acreditamos que era possível
fazer a história acontecer. E ela está acontecendo!
Dizer
que Montes Claros é uma cidade sem memória chega
a ser um acinte imperdoável. Aqui estão os mais
consagrados escritores do Estado de Minas Gerais, quiçá
do Brasil. Em razão disso o Norte de Minas e o Vale de
Jequitinhonha terão uma biblioteca exclusiva na sede
do Instituto para eternizar os valores de nossas letras. Por
outro lado, é bom que se diga que as Revistas do Instituto
têm publicados textos que resgatam a história e
a memória da cidade e da região.
Portanto, esperamos que o leitor encontre nas páginas
que se seguem os registros ou algo semelhante que possam lhe
trazer o prazer da leitura e a oportunidade de conhecer melhor
e mais a nossa história. Pois é sem dúvida
que estamos contribuindo com uma parcela razoável de
estímulo e dedicação à pesquisa,
tão útil para o engrandecimento de nossa entidade.
Se algum mérito possa ter esta Revista, o transferimos
aos seus participantes. São eles: Amelina Chaves, Antônio
Augusto, Clarice Sarmento, Dóris Araújo, Harlen
Veloso, Ivana Rebello, Jânio Dias, José Ponciano,
Juvenal Caldeira, Lázaro Sena, Leonardo Campos, Manoel
Messias, Mara Narciso, Glorinha Mameluque, Felicidade Patrocínio,
Lola Chaves, Marilene Tófolo, Narciso Dias, Pedro Ribeiro,
Wanderlino Arruda e Virgínia de Paula. Enfim, essa circunstância
nos conforta e nos recompensa e paralelamente afirmamos categoricamente
que a cidade de Montes Claros tem, sim, memória!
Amelina
Chaves
Cadeira N. 47
Patrono: Hermenegildo Chaves
PARA
OS AMIGOS QUE SE FORAM
Elthomar Santoro , Haroldo Lívio,
Yvonne Silveira e Ildeu Braúna
“Tudo
tem seu tempo determinado”.
Por
mais que contestamos estas palavras, ainda assim nada podemos
fazer, pois ninguém mudar o destino das coisas de Deus.
Somos frágeis diante do poder maior. Por isso eles se
foram, segundo a crença, voaram para o infinito em busca
da sonhada paz celestial. Será que ela existe? Jamais
alguém voltou para nos contar. O lado invisível
das coisas está apenas na imaginação dos
homens e na fé que os alimentam, como um lenitivo paras
nossas dores.
ELTHOMAR SANTORO foi o primeiro adiantar
sua partida. Lembro-me sempre da sua figura exótica,
contestador e criativo, um grande músico, sempre que
me encontrava me abraçava com força e cantava
nos meus ouvidos, assim: “Meu amor se você for embora,
eu me mato, eu me mato...”, em seguida ele me beijava,
estouvadamente, roçando a barda no meu rosto. Gostava
dos seus gestos, sabia que eram sinceros e autênticos.
Pedia-me conselhos como se faz a uma pessoa mais velha. Admirava
suas atitudes, incompreendidas por muitos. Como todos os poetas
ele sonhava além da sua realidade. Será sempre
um amigo inesquecível. É parte do cancioneiro
popular.
HAROLDO LÍVIO DE OLIVEIRA foi um diplomata,
de educação aprimorada e grande historiador. Nos
o encontrávamos na Feira de Arte, chamava atenção
pela sua elegância, sempre bem vestido, sua figura empunha
respeito a nossa Academia de Letras pela sua sabedoria, sem
ostentação, pois nada fazia para aparecer. Escrevia
por amor a nossa história e seus personagens que marcaram
uma época. Nas manhãs de domingo quando me encontrava
sempre dizia: “Amelina, você é a dama da
Cultura, escreve brincando qualquer tema, especialmente sobre
os Amores Proibidos”. Palavras que me levaram a titular
um dos romances. Elogios exagerados de quem ama a escrita, mas
eu ficava feliz ao encontrar nas suas palavras o alimento para
a minha ilusão de escritora. Foi um homem tão
sábio e simples. A sua partida nos deixou um vazio imenso
de saudade!
YVONNE DE OLIVEIRA SILVEIRA a doce mulher Que
viveu um século entre nós, uma estrela que nada
vai ofuscava seu brilho, além de amiga, éramos
confidentes pelos conhecimentos familiares, pois Olinto Silveira
era irmão de criação de minha mãe,
ela pouco falava, mas a grande escritora Maria Luiza Silveira
sua sobrinha, assim que me encontra fala do nosso parentesco
de coração e convivência em Brejo das almas
(Francisco Sá) Meu pai; Antônio Clementino. Primeiro
soldado destacado em Francisco Sá. Como um dos admiradores
da Professora Dizia: “Yvonne nasceu para ser rainha, seu
porte altivo sustenta uma coroa”. Assim ela viveu entre
nós sem nunca alterar a voz. Vez por outra, nos lançamento
de livros, o confrade Wanderlino Arruda brincava com ela dizendo:
“Yvonne tem inveja de Amelina”. Quando ela estava
a sós comigo me dizia que Wanderlino estava certo e complementava:
“Morro de inveja de você por ter tido tantos filhos”.
Admirável mulher, amiga por longos anos. Fiz para ela
um poema e o grande poeta Téo Azevedo musicou magistralmente
tornando-se uma bela canção gravada em um disco
em sua homenagem que diz:
“Yvonne mulher canção,
Que segue cantando a vida e o Amor
E estrela que nada ofusca
Porque busca da vida o doce sabor."
Assim segue todos os poemas e canções tornam-se
poucos para a riqueza da sua vida. Tivemos uma amizade sólida,
cercada de confiança e confidências recíprocas.
Viajamos muito para o Brejo das Almas (Francisco Sá),
no seu fusca verde. Ela sabia dos meus filhos e netos, tanto
que publicou no seu livro “Cantar de Amiga” uma
poesia para minha neta Ludimilla quando fez 15 anos. Admirava
o Roldão pela sua arte, sempre elogiava a sua criação.
Para falar de todos os momentos vividos das longas conversas,
só mesmo um livro. De memórias assim ela se foi,
deixando um vazio que jamais será preenchido.
De
repente o mistério eterno chamado morte, vira sua atenção
para nossa arte, sem aviso nem piedade e levou Ildeu Braúna,
de forma abrupta.
ILDEU LOPES DE JESUS (ILDEU BRAÚNA)
poeta que cantou a Lenda do Arco-Íris, fato que também
causou um vácuo em nossos corações, pois
sua partida provou que ele era muito amado. Poeta que não
chegou no Sacolejo do Navio, apareceu de leve montado no burrinho
pedrês emprestado pelo mestre João Guimaraes Rosa,
quando se encontraram Lá Pelas Bandas do São Francisco.
No susto da sua partida; penso que ele foi levado pelo arco-íris
da sua grande criação. Com certeza foi Botar o
Papo em Dia com os anjos travessos que moram nas nuvens, ou
foi programar um grande Circuladô das Veredas ou levar
o berrante para Nivaldo Maciel tanger o gado nas verdes matas
do Senhor. Desculpas vãs para nos consolar dos desígnios
do Criador.
Enfim, voltando às lembranças apenas para aliviar
a saudade do meu amigo querido Ildeu Braúna, das nossas
longas conversas, onde qualquer assunto era válido: livros,
política e os amores vividos entre um copo de cerveja
e outro. Local? Pouco importava; Lugar chique, ou num barzinho
qualquer da cidade. Valia à pena o carinho e a amizade
pela mulher mais velha que podia ser sua mãe, mas o acompanhava
como uma adolescente e cheia de sonhos. Sei que ele também
me admirava profundamente. Sua marca na minha família
jamais será esquecida. Como algo de bom que aconteceu
na minha longa existência. Dizer mais o que? Senhor, que
seja feita a sua vontade. Amém! - Montes Claros, numa
noite de solidão!
Ildeu
Braúna e Amelina Chaves.
Antônio
Augusto Pereira Moura
Cadeira N. 12
Patrono: Antônio Teixeira de Carvalho
A
EXPANSÃO DOS CONDOMÍNIOS FECHADOS EM
MONTES CLAROS - MG
AS
“ILHAS DE SOSSEGO” E OS REFLEXOS
NA CONFIGURAÇÃO DA CIDADE
UMA ANÁLISE ESPACIAL
As
modificações urbanas que acontecem nas cidades
se caracterizam por assimilar as novas tendências e costumes
dos seus moradores. A forma de ocupação residencial
das cidades apresenta uma sinalização, portanto,
a caminhar dentro desses novos costumes e modos de vida. Segundo
Ferrari (1979, p. 208), “a cidade é um fato histórico,
geográfico e, acima de tudo social”. Compreender
a formação das cidades nos faz entender melhor
o que acontece nos dias atuais.
Sabe-se que a maioria das pessoas hoje vive em cidades de diferentes
tamanhos e formas e que se tornam grandes desafios para que
os estudiosos, planejadores e teóricos consigam elaborar
modelos e planos que possam traduzir esta complexa rede de relações.
Dentro desta ótica de crescimento e desenvolvimento,
observam-se certos padrões e tendências que acabam
por se repetir em lugares diferentes. Um desses padrões
observados em, praticamente, todos os países é
o da segregação espacial ligada às áreas
residenciais. Caracteriza-se por ser mais disperso, fragmentado
e excludente. São formados núcleos residenciais
isolados. São os chamados Condomínios horizontais
fechados1. Esses condomínios fechados se tornaram também
o grande atrativo da especulação imobiliária
e são responsáveis por novas configurações
no espaço urbano. A terminologia ou definição
pode variar de lugar – Gated Communities, nos Estados
Unidos, Countries, na Argentina ou
Figura
1 - Mapa de localização de Montes Claros;
Fonte: LIMA, 2016.
Condomínios
Fechados, no Brasil, mas sabe-se que essa realidade está
presente por todo o ocidente. Montes Claros, cidade situada
no Norte de Minas Gerais, integrante da Microrregião
de Montes Claros, não foge a essa lógica.
O Município de Montes Claros ocupa uma área de
3.568,941km2, com uma população, segundo o IBGE
(2015) estimada de 394.350 habitantes, sendo que aproximadamente
94% da população encontra-se na área urbana
do município.
Observa-se que, nos últimos anos, a cidade de Montes
Claros vem passando por grandes alterações, em
função do seu desenvolvimento econômico.
Os indicadores de renda, de novos investimentos e o aumento
do número de alunos nas instituições de
ensino superior têm sido considerados entre os maiores
do Brasil. Destacam-se ainda os novos investimentos comerciais
com a expansão e implantação de novos shoppings,
os quais vem consolidar
a posição da cidade como uma referência
para mais de 80 municípios de sua área de influência,
incluindo alguns do Sul da Bahia. Existem hoje, apenas para
exemplificar, 3 cursos de Medicina e 3 cursos de Arquitetura
e Urbanismo, cursos tradicionalmente localizados em regiões
cujo potencial de crescimento e desenvolvimento exigem grandes
investimentos.
Segundo Corrêa (1989), o espaço urbano é:
_________________
1
“A utilização do termo “condomínio
horizontal fechado” (CHF’s) é visto como
uma questão que ainda não está totalmente
resolvida, desta forma continua sendo objeto de discussão
entre os estudiosos no assunto. Perante tal polêmica quanto
à definição do termo, percebe-se o uso
de diferentes denominações, tais como: condomínios
fechados; condomínios horizontais; loteamentos fechados;
condomínios urbanísticos; condomínios exclusivos;
bairros fechados; condomínios especiais; ilhas fortificadas;
guetos verdes; enclaves fortificados; entre outras. ”
(BARROS, 2012, p.17)
espaço
urbano capitalista – fragmentado, articulado, reflexo,
condicionante social, cheio de símbolos e campos de lutas
– é um produto social, resultado de ações
acumuladas através do tempo, e ngendradas por agentes
que produzem e consomem espaço. São agentes sociais
concretos, e não um mercado invisível ou processos
aleatórios atuando sobre um espaço abstrato. A
ação destes agentes é complexa, derivando
da dinâmica de acumulação de capital, das
necessidades mutáveis de reprodução das
relações de produção, e dos conflitos
de classe que dela emergem.
(CORREA, 1989, p. 11)
________________
Esse
espaço urbano de lutas e símbolos reflete, portanto,
as demandas sociais, culturais e econômicas das populações.
Ainda baseado em Correa (1989) e seu agentes produtores do espaço
urbano, pode-se compreender que a cidade é o resultado
da atividade destes agentes. É a partir do desequilíbrio
entre os agentes em suas ações, mais fortes ou
menos fortes em regiões do país, que ocorrem situações
distintas nas cidades. Em áreas onde existe uma ação
mais forte dos proprietários dos meios de produção,
a cidade se configura diferente daquela onde os agentes imobiliários
ou o Estado têm ações mais fortes. O equilíbrio
entre as ações dos agentes tende a produzir uma
cidade mais democrática. Quando ocorre o desequilíbrio,
a especulação imobiliária e ocupações
inadequadas podem surgir. Invasões de áreas, segregações
e outras dificuldades surgem na medida que há uma distorção
entre essas ações.
Dentro
dessa fragmentação e segregação,
o condomínio fechado surge como um produto imobiliário
que tem como principal atrativo responder às demandas
sociais presentes no momento de segurança e tranquilidade.
Os
loteamentos fechados são um novo produto imobiliário
e, como todas as outras mercadorias, são obrigados a,
sempre, se renovar, lançando produtos cada vez mais atrativos
no mercado. Esses produtos, cada vez mais elaborados e bem estruturados,
provocam profundas transformações na estrutura
das cidades, pois ocorre uma nítida passagem da segregação
sócio espacial para a fragmentação urbana,
inclusive nos espaços não metropolitanos
(SPOSITO 2006 Apud ESTEVES e NOGUEIRA 2013, p. 29).
___________________
Os
condomínios fechados iniciam sua escalada no Brasil,
inicialmente, nas grandes metrópoles. São Paulo,
Rio de Janeiro, Belo Horizonte foram as pioneiras neste modelo
de implantação. No entanto, com o crescimento
das cidades de porte intermediário no Brasil, em importância
econômica e estratégica no desenvolvimento da economia
do país, este modelo de assentamento também começa
a se tornar um fenômeno importante e que tem propiciado
mudanças na configuração destas cidades.
Quando se fala em condomínios fechados, dois aspectos
principais são levantados: a questão da segurança
propiciada e a possibilidade da construção de
“ilhas de sossego ou verdadeiros paraísos”.
Este termo “ilhas de sossego” que é utilizado
neste trabalho surge a partir da leitura de Becker (2005), de
Quadros (2008), Moura (2003) que utilizam termos similares,
como ilhas urbanas, ilhas de luxo e contraste, espaços
de sossego e Barroso (2010) que se referência ao termo
ilhas e também paraísos artificiais. Na sociedade
atual e de acordo com a dinâmica imobiliária, os
atrativos do lugar acrescidos da segurança e de construções
de imagens de sonho e sossego permeiam as propagandas e conquistam
os possíveis moradores.
Esses condomínios fechados representam uma espécie
de modelo ou padrão de determinadas classes sociais e
passam a ser objetivo ou meta para parte dessa população.
Para
muitos, morar nesses loteamentos significa a realização
de um sonho. As cidades médias têm apresentado
esse fenômeno de forma mais ampla, também ligado
ao conceito de segurança e status. Curiosamente, nas
cidades médias, os loteamentos não se encontram
muito longe do centro da cidade. Estes estão acontecendo
ainda dentro do perímetro urbano em vazios ou áreas
loteadas e ainda não totalmente ocupadas.
Essa
configuração mais próxima dos centros,
não mais em áreas de periferias, tem contribuído
para a construção de cidade de muros e cercas
onde bairros, que antes eram plenamente acessíveis a
todos, têm-se tornado um emaranhado de quadras e grandes
áreas cercadas, criando grandes espaços fechados
e levando a uma “medievalização” dos
espaços.
De
cidadãos confiantes e seguros, passamos a ser consumidores
do medo, e, aqueles que possuem maior poder aquisitivo, buscam
proteção nos condomínios fechados (“medievalização”
das cidades) que estão sendo construídos na cidade
contemporânea, com um novo conceito de morar, com segurança,
exclusividade entre os iguais, isolamento, lazer e serviços.
Anunciados nos meios de comunicação pelo mercado
imobiliário como ilhas de segurança, felicidade,
liberdade e status social. (BARROSO, 2010, p. 88).
A
proliferação desses espaços modifica a
forma de relação do pedestre com a cidade, modifica
a forma de deslocamento e a interação das pessoas
com o espaço urbano.
A
busca por essa tranquilidade do morar, pela segurança,
pelo “viver entre iguais” tem provocado uma segregação
espacial maior e modificado, em especial nas cidades menores,
a relação de vizinhança que se percebia
em outros tempos no interior do Brasil. Percebe-se, hoje, um
sem número de pessoas que se deslocam de espaços
fechados para
outros (condomínio, edifício de escritório,
campus universitário, shopping centers) sem vivenciar
a cidade. Alguns desses condomínios têm abrigado
além das residências, escritórios, comércios,
escolas, minimizando ainda mais esse contato com a “cidade
extramuros”.
Parece ressurgir dentro desta nova realidade um mundo utópico
onde as questões e desejos ligados ao consumo e à
realização pessoal permitem a “fabricação”
de espaços de acordo com o grupo que faz parte dessa
realidade.
Comparando as leis das cidades idealizadas, os condomínios,
em termos de regras de conduta e ordenamento espacial, podem
ser uma derivação do próprio pensamento
utópico. As regras viabilizam a vida em comunidade, a
vigilância promove a ordem e a disciplina, a paisagem
homogênea, diminuindo-se a impressão das desigualdades
econômicas entre os moradores, os muros possibilitam o
isolamento da paisagem exterior, estabelecendo um plano finito
protegendo o espaço residencial e os seus habitantes
(DACANAL, 2004, p. 62).
Harvey (2009, p. 219), criou o termo “disneyficação”
para definir aspectos associados a um espaço supostamente
feliz, harmonioso e sem conflitos, apartado do mundo real; construção
feita para entreter; história inventada; cultivo de nostalgia
de um passado mítico; perpetuação do fetiche
pela cultura da mercadoria; um agregado de objetos e coisas
de todo o mundo numa ideia de diversidade e existência
multicultural, mesmo que tudo se dê na forma de compartimentos;
lugar limpo, higienizado e mitologizado, esteticamente perfeito.
Essa discussão caminha nos próximos parágrafos
para Montes
Claros, buscando compreender os reflexos e as modificações
impostas
à cidade a partir desse elemento que é o condomínio
fechado.
A
formação da cidade de Montes Claros se assemelha
à formação tradicional das cidades coloniais
brasileiras, em que as famílias de melhor poder aquisitivo
constroem seus sobrados e casarões nos arredores da igreja
na praça principal. A expansão das atividades
comerciais trouxe o desenvolvimento, levando à abertura
de novas ruas e acessos. Ao mesmo tempo em que a cidade se expandiu,
o comércio se intensificou, e as residências localizadas
nas áreas centrais passaram a ser utilizadas para este
fim e as residências foram se afastando do centro para
as chácaras do entorno.
De
acordo com Leire e Pereira (2008), o Norte de Minas pode ser
classificado como uma região de transição,
por estar localizado na região Sudeste do país,
mas possuir trações econômicos e fisiográficos
bastante similares à região Nordeste. A relação
desta região do Norte de Minas com a pobreza, seca e
isolamento regional causa uma visão dualista, uma vez
que, por outro lado se encontram presentes, também, nichos
de riqueza e modernidade.
A
cidade de Montes Claros, dentro deste contexto, reflete essa
situação de dualismo, uma vez que, como principal
centro urbano da região, agrega em suas características
um polo comercial, político, econômico e cultural,
gerando, portanto, condições e situações
similares à da região.
Diferente
de outras cidades que se caracterizaram por uma verticalização,
Montes Claros não experimentou essa situação
de imediato. Seja em função do sítio, seja
em função da falta de leis de incentivo, a cidade
acabou por crescer de forma horizontal, ocupando espaços
e criando vazios entre os novos loteamentos que foram surgindo
ao longo de sua história. Tais vazios puderam, mais tarde,
ser loteados e ocupados dentro de uma conhecida política
de especulação imobiliária. Hoje, 160 anos
após sua emancipação, a cidade tem definida
claramente sua área central, área de bairros residenciais
mais nobres, área industrial, área com faculdades
e universidades e ainda não possui instrumentos claros
de políticas públicas, e nem serviços
especializados. A vocação da cidade tem-se firmado
como centro comercial e de prestação de serviços
principalmente no setor educacional e de saúde. Essas
transformações, ainda em curso, não diminuem
o papel crucial da cidade como elemento polarizador. As direções
preferenciais de crescimento urbano seguiram na trajetória
norte, sul e leste. A região oeste, cujo o valor urbano
é mais elevado, teve um crescimento mais lento.
A
cidade foi-se formando com os problemas peculiares das cidades
médias brasileiras, com um crescimento desordenado e
as disparidades sociais são cada vez mais visíveis
na paisagem urbana (Figura 02).
Figura
02 - Mapa de crescimento e expansão da malha urbana da
cidade de Montes
Claros de 1970 a 2014. Fonte: Lima, 2016.
Assim
sendo, a leitura que se faz hoje da cidade é de que ela
apresenta um caráter predominantemente urbano, que já
reproduz, em outra escala, os problemas das metrópoles.
A intensidade do processo de urbanização sobrecarregou
a estrutura urbana existente e as tentativas de planejamento
urbano ficaram na retórica de meros discursos. Quando
muito, foram desenvolvidos planos de intervenção
urbanística setorial para resolver ou amenizar problemas
já vivenciados pela população (PEREIRA,
2003). A cidade expressa, na atualidade, as profundas desigualdades
existentes na sociedade brasileira. Onde, de um lado, tem-se
a modernização e, do outro, a marginalidade, a
segregação socioespacial, a degradação
ambiental e a violência. A malha urbana, que já
se encontra sem grandes vazios e ainda bastante horizontal em
termos de tipologia de edificações, apresenta
regiões com bairros pobres e ocupações
irregulares inseridas no meio de áreas de ocupação
consolidada.
Não
são encontradas, em Montes Claros, áreas favelizadas
como nas grandes cidades, onde estas estão localizadas
em morros e encostas, visto que a cidade se situa em uma área
de topografia favorável, com algumas exceções.
As favelas e bairros pobres acabam se configurando em platôs,
mas com ruelas e becos característicos das grandes cidades.
A diferença é que estão “escondidas”,
atrás de edificações de outros bairros
vizinhos e não são visíveis de longe, no
meio da cidade.
Ao se analisar a concentração e distribuição
de renda do município, consegue-se perceber os setores
de cada uma das faixas de renda e as tendências de expansão
urbana.
Figura
03 - Mapa de uso residencial por classe de renda- Montes Claros
Fonte: Lima, 2016.
O
mapa de uso residencial por classe de renda apresentado na Figura
03 esclarece bem o que foi discutido até o momento. A
região oeste apresenta a concentração de
mais alta renda e os setores nordeste e sudeste, uma expansão
e crescimento de bairros de baixa renda.
Com isso, os condomínios fechados, objeto de estudo deste
trabalho, se localizam exatamente na faixa descrita e especializada.
Caracterizam-se, portanto, por uma baixa densidade de ocupação,
em geral com lotes maiores que a média do restante da
cidade e ocupado por uma população classificada
pela alta renda.
O final dos anos de 1970 e início da década de
1980 foi bastante decisivo no crescimento urbano da cidade de
Montes Claros. A ideia de condomínio fechado era antiga
na cidade, mas se reduzia a um pequeno grupo de dez casas, localizadas
na região próxima ao centro, denominados
hoje Condomínio Jacinto Ataíde e o Condomínio
Panorama. Ambos construídos no final dos anos de 1970
e se caracterizavam por uma ocupação predominantemente
familiar. O projeto do Bairro Ibituruna datado do final dos
anos de 1970 (16/05/1978) representava a expansão da
região de mais alta renda do município e tinha,
em sua configuração, um projeto bem ambicioso.
Distinguindo-se da maioria dos outros bairros por apresentar
lotes, em geral, maiores que a média usual até
então praticada, o bairro Ibituruna foi sendo ocupado
aos poucos e se caracterizou por abrigar residências espaçosas
e com áreas de lazer. Os lotes, em geral, eram maiores
que 500m2. Não se percebeu também uma ocupação
imediata e, até o final dos anos de 1980, menos de 30%
dos lotes estavam ocupados.
Figura
04 - Mapa de localização dos Condomínios
de Montes Claros
Fonte: Lima, 2016.
Os
condomínios localizados no bairro Ibituruna conforme
as figura 04 e 05 se tornaram o grande fator impulsionador de
ocupação dos vazios até então ali
existentes.
Figura
05 - Mapa dos Condomínios – Bairro Ibituruna, Montes
Claros
Fonte: Lima, 2016.
Os
condomínios fechados em Montes Claros tiveram uma forma
peculiar de se desenvolveram. Como os condomínios Jardim
Panorama e o Jacinto Ataíde, citados anteriormente, apresentavam
uma configuração quase familiar, considera-se,
de fato como o primeiro condomínio de Montes Claros,
o Portal das Arueiras, que acontece no final dos anos 1980,
mas somente se consolida no final da década de 1990.
Naquele momento as pessoas não viam o condomínio
fechado como uma opção. A percepção
de insegurança ainda não tinha o apelo que tem
nos dias atuais. Logo, a população não
via atrativo em adquirir lotes em condomínios fechados
e o valor dos lotes era menor que o valor dos lotes fora do
condomínio no mesmo bairro.
Na medida que se torna uma tendência, logo em seguida
surgem outros: Portal das Acácias, Portal da Serra, Vale
Verde, Vivendas do Lago e o Bairro Ibituruna passa por um novo
processo de ocupação com loteamentos dentro do
loteamento.
Em
2007, surge a lei de parcelamento municipal, que procura regular,
regularizar e tentar disciplinar essa nova modalidade de ocupação.
O
primeiro grande loteamento fechado construído em Montes
Claros por uma grande empresa urbanizadora de outra região,
foi o Condomínio Gran Royalle Pirâmide, tendo sido
liberado para construções em agosto de 2012. É
o primeiro, também, a propor novos serviços e
áreas de lazer diferenciadas em relação
aos demais. Ao mesmo tempo, são desenvolvidos projetos
de condomínios horizontais menores com casas semelhantes,
como o Vila Gardens ou com residências já projetadas
e modelos semelhantes, como o Villa Toscana. Percebe-se ainda,
na região leste da cidade, a ocupação similar
com vilas com casas de menor porte, dotadas também de
áreas de lazer e convívio.
Montes
Claros observa, portanto, em um curto espaço de tempo
uma tendência por esse tipo de ocupação
similar a outras cidades de mesmo porte já citadas anteriormente
como Divinópolis, Uberlândia, São José
do rio Preto entre outras. A concentração dos
condomínios de alta renda na região do Bairro
Ibituruna se justifica muito em função das oportunidades
encontradas. O bairro já possuía infraestrutura
de asfalto, água e esgoto, era pouco ocupado e com quadras
inteiras em posse de poucos proprietários. Além
disso, a legislação local ainda funcionava sem
muitas restrições e a percepção
da nova tendência pelo mercado imobiliário possibilitou
uma mudança na forma de sua ocupação.
A
seguir, apresenta-se uma tabela com a listagem dos condomínios
fechados existentes (aprovados ou em aprovação)
no Município de Montes Claros até a data de fevereiro
de 2016 e considerações acerca de cada um deles.
Tabela 1 – Lista dos condomínios fechados e vilas
implantados ou em
implantação em Montes Claros
Observações:
* O Residencial Villa Gardens e o Residencial Vila Bella Toscana,
O Condomínio Jacinto Ataíde e o Condomínio
Jardim Panorama são Condomínios Horizontais ou
vilas pela lei municipal. Não há alteração
do sistema viário. Desenvolvemse em um lote ou gleba
de maiores dimensões e os moradores possuem fração
ideal das ruas não públicas e espaços comuns
de lazer das vilas. ** Em fase de estudo e aprovação.
Os
condomínios fechados tornaram-se uma parte significativa
da realidade das cidades brasileiras. As cidades médias,
como Montes Claros, já convivem com essa situação
e não podem se abster de absorver tal situação
em seu planejamento. Existe alternativa? Há algo que
possa ser feito? A legislação municipal já
prevê sua implantação?
Faz
- se necessário, portanto, um estudo sobre esta questão
e uma avaliação do reflexo dessa implantação
na cidade. Reconhece-se que a região do Bairro Ibituruna
é a que mais vem sendo afetada por essas ocupações.
Avaliando
as entrevistas feitas com os moradores, constatouse que a segurança
é o fator principal para que os condomínios sejam
ocupados. Observa - se ainda que os novos condomínios
têm aumentado suas áreas de lazer, uma vez que
essa demanda também foi observada na pesquisa trabalhada.
Os
loteamentos fechados iniciais na cidade se caracterizavam por
apresentar uma pequena quantidade de lotes, não necessariamente
muito maiores que os lotes dos bairros próximos, porém
com áreas de lazer pequenas ou quase inexistentes. A
chegada de grandes empresas loteadoras na cidade, como o Gran
Viver Urbanismo que implantou o Gran Royalle Pirâmide,
que se encontra em fase de aprovação e implantação
do Gran Park Montes Claros. O Alphaville Urbanismo, com o Alphaville
Montes Claros modificou o cenário, à medida em
que foram apresentadas à população novas
formas de ocupação e implantação
nas áreas da cidade. No caso destas novas configurações,
as áreas de lazer e as áreas de preservação
confere pontos positivos ao marketing de vendas dos empreendimentos.
Da forma como estão sendo implantados os loteamentos
na cidade de Montes Claros, não se percebe ainda uma
alteração da morfologia urbana da cidade. Observam-se,
no entanto, novas lógicas de organização
em determinadas regiões da cidade.
Espacialmente
falando, os condomínios de alta renda apresentam um eixo
dominante de ocupação ainda com áreas vazias
e tal eixo deve ser objeto de planejamento, uma vez que sua
implantação tenderá a refletir na malha
urbana e na mobilidade de parte da cidade. A legislação
em vigor, mesmo tratando dos condomínios, não
abrange as possíveis questões de mobilidade que
devem surgir em breve a partir dessa continuação
da ocupação.
Com
a sequência de implantação de condomínios
e a vias serem ladeadas pelos muros, a ruptura do tecido urbano
no quesito do transporte público e deslocamentos é
um desafio.
Observa-se
que os atuais condomínios preconizam um grande apelo
pela natureza e pela importância ambiental e, oferecem
vantagens como negócio imobiliário. Diferentemente
dos primeiros condomínios cujos proprietários
das glebas e incorporadores eram locais, a chegada das grandes
incorporadoras alterou a forma de negócios, a partir
de permutas de áreas com os proprietários locais
e, com isso, ampliado as áreas dos condomínios.
O avanço, portanto, para as áreas periféricas
com atrativos ambientais e vizinhas dos espaços rurais
é a nova tendência local.
Quando
se analisa na cidade, voltando o olhar para a quantidade de
condomínios e a perspectiva de novos, observa-se que
a migração das pessoas, ainda que de forma lenta,
mas contínua, evidencia-se em um quadro sem volta. Assim,
o desafio está em fazer com que esses condomínios
possam vir a compor a malha urbana de uma maneira em que haja
possibilidade de não se ficar refém de uma estrutura
intramuros, pois não se vê uma perspectiva, nos
próximos anos, de reversão dessa tendência.
As
novas relações entre os espaços públicos
e privados nesses empreendimentos, bem como sua inserção
no espaço da cidade são situações
e desafios para o planejamento urbano.
À
medida que se compreende o espaço urbano como algo coletivo
e o espaço das cidades como ideais de liberdade e igualdade,
sem separações ou segregações, essa
realidade atual vem trazendo uma inquietação.
Pode-se
dizer que os muros que separam os condomínios abrigam
também uma separação daqueles que procuram
um processo de marcar distinção, espaço
e poder. A legislação própria e os códigos
de conduta internos, também são elementos que
reforçam esta ideia de sociedade paralela e diferente.
Os muros criam a sensação da segurança,
estabelecem a distância entre o condomínio e o
restante da cidade e delimita o uso, a apropriação
e a sensação de pertencimento do morador e do
usuário em relação ao condomínio
e à cidade. Um misto de relações claras
e objetivas de estar e pertencer, misto de relações
objetivas e subjetivas que estão permeadas o tempo todo
de símbolos que definem e determinam a construção
da cidade.
Constatou-se, pela pesquisa, que o fato de uma homogeneidade
de classe, o morar entre pares não necessariamente garante
a sociabilidade. Percebe-se, no entanto, que as crianças
naqueles condomínios que apresentam áreas de lazer,
convivem mais entre elas e podem criar um clima mais sociável
e de amizade.
Alguns incômodos da cidade, como barulho, discussão
entre vizinhos, carros em porta de garagem, desrespeito ao patrimônio
coletivo etc. não são, porém, deixados
para fora dos muros. Acontecem também nos condomínios.
É inegável o apelo imobiliário hoje dos
condomínios e se percebe como se torna importante para
a gestão municipal que esse mercado seja atendido em
suas demandas, uma vez que sua expansão gera empregos
e movimenta a economia local, algo muito bem visto pelas administrações
municipais. A legislação, portanto, neste quesito
é sempre demandada de ajustes para atender a essas necessidades.
Esses condomínios têm hoje o preço do solo
mais valorizado que os bairros abertos na mesma região,
exatamente por venderem a ideia de segurança e apresentarem
atrativos como áreas de lazer e vias mais bem cuidadas,
por exemplo, mesmo com um custo a mais de uma taxa de condomínio.
A
visão negativa dos loteamentos como áreas privativas,
não democráticas, segregadas somente são
percebidas por pessoas que estudam assunto, mas dificilmente
pelo cidadão no seu dia a dia. Observa-se exatamente
o contrário. Esses condomínios se tornam o sonho
de consumo dessa população.
Segundo Da Silva et al. (2012) boa parte da população
não conhece os condomínios fechados, além
de suas muralhas e portarias. Poucos tem acesso e visão
crítica sobre a legislação urbana, mas
boa parte vê o condomínio assim como um produto
na vitrine que desperta o desejo de adquirir.
Assim sendo, não cabe condenar ou julgar tal forma de
ocupação. Entende-se que é bastante pertinente
serem feitos ajustes na legislação local, em busca
de resultados mais adequados. É essencial, no entanto,
que a mobilidade e as centralidades sejam objetos de maior atenção
e cuidado, para que se possa conseguir uma Montes Claros, mesmo
separada por muros, mais democrática nas relações
de ir e vir e de convívio entre as pessoas.
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fechados e a vizinhança (in)desejada: um estudo em Uberlândia/mg.
270f. Tese de Doutorado. Universidade Federal de Uberlândia.
Uberlândia, 2008. PAULA, Hermes Augusto de. Montes Claros,
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PEREIRA, Anete Marília. Cidade média e região:
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Tese de Doutorado. Uberlândia, 2007. PEREIRA, Anete Marília;
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QUADROS, Caroline Souza de. A vida em separado: estudo de caso
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Acesso em 10 de jul. 2014.
SPOSITO, M. E. B. (Org.). Textos e contextos para a leitura
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SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. Loteamentos
Fechados em Cidades Médias Paulistas – Brasil.
In: SPOSITO, E, S; SPOSITO, M. E. B; SOBARZO, O. Cidades médias:
produção do espaço urbano e regional. São
Paulo: Ed. Expressão Popular, 2006.
Clarice
Sarmento
Cadeira N. 31
Patrono: Dulce Sarmento
A
Boneca de Leonel
O
fato folclórico tem as seguintes características,
aceitas e tornadas oficiais pelos folcloristas nacionais e internacionais:
Tradicionalidade, Oralidade, Anonimato, Funcionalidade e Aceitação
Coletiva.
Examinando a representação (tida por alguns como
fato folclórico) da Boneca de Leonel, vejo que esta foge
aos padrões que motivam os demais gigantões de
armação de manifestações populares
brasileiras, tais como a Maria Angú, o Boi e a minhota
- folguedos das festas do Divino em São Paulo, ou os
bonecões do carnaval de Olinda. Senão vejamos:
Tradicionalidade: Esta manifestação não
tem origem nem antecedente citadino ou regional. Tal como se
apresentava, era uma cópia ou teve forte inspiração
na Maria Angú paulista; as mesmas feições
e o mesmo tipo de acompanhamento instrumental. E Leonel viajava
muito a São Paulo, vindo talvez daí a inspiração
para sua boneca.
Também
não foi passada através das gerações,
já que não teve antecedentes e seus filhos ou
outros não continuaram a representação.
Foto
de Alberto Sena
Anonimato
e Aceitação Coletiva: O único que se apresentou
com esta boneca foi o próprio Leonel, o acontecimento
tendo morrido, portanto, com seu criador. A transmissão
não se efetivou, não foi aceita e continuada pelo
povo, não se multiplicou, nem nos mesmos padrões
ou outros semelhantes, por esvaziamento da finalidade a que
se destinava (propaganda de casas comerciais)
Funcionalidade (razão, destino, função).
Esta existia, mas não nos padrões típicos
das demais manifestações, que são: Em louvor
a um Santo de devoção, pagamento de promessas,
na perpetuação de costumes e crenças ou,
ainda, nas soluções populares para as práticas
e afazeres diários da vida social.
Pelo exposto, não considero a Boneca de Leonel uma manifestação
folclórica, baseando minha opinião nestas considerações
acima expostas e opiniões de folcloristas de renome,
alguns dos quais consultei.
Dário
Teixeira Cotrim
Cadeira N. 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires
A
BONECA DE LEONEL
Lembro-me
perfeitamente quando aqui desarrumei o meu farnel de viagem,
isso no ano de 1968, para trabalhar no Armazém Itapoã
do meu saudoso tio Zinho e estudar no Colégio Tiradentes
da Polícia Militar de Minas Gerais. Naquela época
apreciar a desenvoltura da Boneca de Leonel, desfilando animadamente
pela rua Rui Barbosa, anunciando as promoções
das Casas Pernambucanas, era o que mais interessava a nossa
curiosidade de chegante. Pelo que se sabe, a história
da Boneca de Leonel teve inicio no ano de 1952 e a sua última
apresentação aconteceu no dia treze de dezembro
de 1970. Esporadicamente, depois desta data, ela aparecia algumas
vezes dando o ar de sua graça para depois esvaecer-se
por definitivo.
Leonel Beirão de Jesus nasceu no dia 25 de dezembro de
1918 e morreu no dia 29 de outubro de 1969. Pela importância
do seu trabalho, os edis de Montes Claros, por unanimidade,
denominaram a rua em que ele morava de Avenida Leonel Beirão
de Jesus.
Registra a escritora Maria Generosa Ferreira Souto que a história
da boneca começou com Seu Nuno, um jovem português
que
tinha muitos admiradores na cidade de Montes Claros e dentre
eles o proprietário da Casa Ramos e o amigo comum Francisco
José de Oliveira (Chico Preto), este que tinha a incumbência
de manejar a boneca (que naquela época se chamava Boneca
Maria Bambah Sororó), na feitura das propagandas das
casas comerciais pelas ruas do centro comercial da cidade. Depois,
com a morte de Seu Nuno, o rapazola Leonel Beirão de
Jesus que já ensaiava o manejo de suas engrenagens, assumiu
o comando da boneca e passou, com a participação
de Francisco José de Oliveira e a conduzi-la pelas ruas
da cidade, em substituição ao seu criador. Também
a participação do garoto João Pereira de
Aguiar carregando os cartazes das promoções foi
muito importante. Com a mudança de comando, o nome original
– Maria Bambah Sororó – deixou de existir
e as pessoas passaram a chamá-la de Boneca de Leonel,
em homenagem a Leonel Beirão de Jesus.
Era uma vibrante festa a presença da Boneca de Leonel
nas ruas centrais da cidade de Montes Claros, com as suas belas
evoluções e o encantamento de suas cores, conquistando
os meninos medrosos e a admiração dos adultos,
no ritmo alucinado do bloco Estrela do Mar, que depois ficou
conhecido como sendo o conjunto da Família dos
Bicudos. O ilustre confrade Téo Azevedo explica a origem
desse apelido, afirmando que todos os componentes do conjunto
eram irmãos e tinham os lábios salientes. Eram
eles: o Velho João (na sanfona), o Zezinho (na caixa),
o Orlando (no surdo) e o Geraldo (no violão). Ainda fazia
parte desse conjunto de músicos o Dimas (no pistão)
que não era parte da família dos “bicudos”.
Comum mesmo era a presença de Leonel Beirão de
Jesus à frente do folguedo, sempre vestido de branco,
anunciando as promoções das Casas Pernambucanas.
No livro A Questão Folclorística à Luz
da Escola, a sua autora Maria Generosa considera a Boneca de
Leonel um tema folclórico, fazendo coro com o que pensa
a professora Maria José Colares Moreira. Entretanto,
segundo a acadêmica Clarice Sarmento, a Boneca
de Leonel não faz mais parte do calendário folclórico
de Montes Claros. E a professora Clarice tem razão em
afirmar isso, haja vista que a continuação da
tradição é que credencia a folia a essas
condições naturais. Entretanto, o cantador de
viola, Téo Azevedo, afirma que “após a sua
morte – de Leonel Beirão – transformou-se
em folclore, cultivado por vários Grupos Folclóricos
do Norte de Minas”. Ora, desde o ano de 1970 que a Boneca
de Leonel não mais alardeia pelas ruas da cidade e, em
razão disso tem crédito a afirmativa da maestrina
Clarice Sarmento. Sobre a asseveração de Saul
Martins de que a folclorização dos eventos acontece
depois que o folguedo “generaliza-se e incorporase a tradição
do povo” é genuinamente correto. Mas, não
foi isso que aconteceu com a Boneca de Leonel.
Há muitas informações sobre a origem da
Boneca de Leonel. Outra, não menos importante, encontra-se
no livro Montes Claros
do
Meu Tempo, do jovem escritor José Jarbas Oliveira Silva.
Informanos ele que “Leonel Beirão de Jesus fez,
mandou fazer ou importou de Olinda, em Pernambuco, uma boneca
de uns três a quatro metros de altura”. Realmente,
pode ter sido desta forma a percepção de Seu Nuno
na criação do seu invento. Assim como Maria Generosa
Ferreira Souto, o confrade Jarbas Oliveira também não
assinalou a fonte da informação em sua obra, todavia,
o leitor pode, com certeza, aceitar como verdadeiras as observações
obtidas e registradas neste despretensioso documentário
por Jarbas e Maria Generosa.
O poeta Mário de Andrade, que foi um dos primeiros a
lutar pela propagação dos estudos da “coisa
popular” já tinha a convicção de
que “nada melhor [do] que as tradições para
retemperar a saúde da alma brasileira”. Pois bem,
independente de ser ou não ser parte da tradição
da “coisa popular” de Montes Claros, a Boneca de
Leonel fez a alegria de muita gente miúda durante quarenta
anos. Entretanto, há outros quarenta anos que ela não
mais tempera os entretenimentos do nosso povo, como antes fazia.
Esse afastamento tirou-lhe a condição de ser um
tema folclórico.
Leonel Beirão de Jesus, antes de sua morte, recebeu a
Câmara Municipal de Vereadores, em sua morada, no dia
primeiro de outubro de 1969, quando lá os ilustres vereadores
foram lhe entregar o título de Cidadão Benemérito
de Montes Claros, atendendo projeto do eminente vereador Wanderlino
Arruda. “Leonel Beirão sempre foi um homem
do povo – e ainda disse naquela ocasião o vereador
proponente – que a homenagem era uma demonstração
de gratidão e apreço pelos relevantes serviços
prestados ao Município de Montes Claros, com Assistência
Social por meio de sua empresa funerária”.
Viva Montes Claros, a cidade da arte e da cultura!
Dóris
Araújo
Cadeira N. 5
Patrono: Antônio Ferreira de Oliveira
Elthomar
Santoro
Elthomar
Santoro Júnior, nasceu no dia 06 de dezembro de 1957,
em São João da Ponte – MG. Ele foi o pioneiro
do Rock em Montes Claros. Compôs mais de 500 canções,
várias delas de sucesso nacional. Contudo, ficou mais
famoso com a música “Disparate”, mais conhecida
como “Rapariga do Bonfim”, música feita em
parceria com seu irmão Ismoro da Ponte .
Elthomar era considerado o avô do Rock montes-clarense.
Além de poeta, compositor, ator, cantor e roqueiro, Elthomar
Santoro era teatrólogo, chegou a ganhar o prêmio
Mambembe de teatro da Secretaria de Cultura de São Paulo,
com a peça de sua autoria “O caso das galinhas
do Prefeito.
Elthomar viveu a maior parte da sua vida aqui, em Montes Claros,
onde também faleceu , na manhã de segunda-feira,
do dia 29 de setembro, de 2014. Foi nesse dia, orvalhado pelo
pranto, ou melhor, na noite desse dia, que escrevi este meu
adeus ao Poetamigo
Santoro.
Ao
Avô do Rock Montes-clarense, Elthomar Santoro
Hoje,
dia 29 de setembro de 2014, às 22 horas, cá estou
no pronto- socorro do hospital São Lucas. Paciente, impaciente,
aguardando atendimento.
Há, exatamente, três dias que ando perrengue. Uma
tossezinha “infuzada” que não me larga. Uma
”marvada” indisposição que me toma
todo o corpo, talvez por culpa da febre intermitente... E uma
bruta e “indigna” de uma dor de cabeça, que
só alivia a troco de analgésico.
O jeito foi procurar ajuda especializada, já, que, a
automedicação não estava resolvendo, não
estava surtindo o efeito esperado.
Passei o dia inteirinho querendo e precisando ir até
o Centro Cultural dar o meu último adeus ao poeta, no
entanto, meu corpo desobedecia e contrariava a minha vontade.
Foi,
assim, que, presa em um hospital, permiti que o meu pensamento
vadiasse em busca das lembranças de um passado não
muito distante. E, lá, estava ele, o poeta. Seu sorriso
estampou- se nítida e instantaneamente em minha memória.
Ouvi o seu riso fácil, espontâneo, treteiro e sonoro
como água de riacho sertanejo. Seu olhar travesso repousou
em mim o seu inquieto brilho. Veio, quase vacilante, o corpo
miúdo, franzino, guardador de uma alma gigante. Senti
o poder do seu abraço, e o frescor do seu beijo em minha
fronte... O poeta veio até mim... Veio se despedir. Então
compreendi o autêntico ser humano que era ele.
Projeto
Livros na Praça, com Charles Boavista, Raphael Reys,
Sebastião Abiceu,
Dóris Araújo e Elthomar Santoro.
O
poeta, mesmo sem o saber, era um enfrentador de moinhos. Um
domador de palavras. Um amansador de rimas. Um colecionador
de utopias.
O poeta, como todo poeta, acreditava na Arte como objeto transformador
do mundo. Era um fazedor de pontes . Um demolidor de muros.
O poeta tinha a língua afiada feito navalha, e um destemido
coração de menino.
Partiu
o poeta. Em silêncio, sem alarde, sem pompas, levando
consigo o que realmente possuía, o que era realmente
seu por direito: sua genialidade.
Deixou- nos estupefatos, surpresos, saindo de fininho. Galgando
os degraus do infinito, foi animar outras plagas.
Partiu, hoje, Elthomar Santoro Junior, o avô do Rock montesclarino.
Ao poeta, o nosso adeus!
Montes Claros, 29 de setembro de 2014
Felicidade
Patrocínio
Cadeira N. 20
Patrono: Camilo Prates
AMELINHA:
FESTA NA MISSA
DE RESSURREIÇÃO
Eu
a conhecia à distância, nossa aproximação
se deu pela mútua participação na Academia
Feminina de Letras e o seu desejo de ingressar no Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros.
Chamou-me a atenção a sua personalidade exuberante,
as suas vestes e ornamentos vistosos, a alegria incontida e
a sua autenticidade. Desde o inicio fizeram-se aparentes as
nossas afinidades, destacando entre todas, a cultura e o gosto
pela vida.
Naquele, pouco mais de metro e meio de pessoa, latejava um coração
de menina, de adolescente ardorosa e ao mesmo tempo de uma mulher
vigorosa que adquirira, ou sempre possuíra a sabedoria
do bem viver. Pouco sei da vida de Amélia Prates Souto,
mas sei que foi por um bom tempo, diretora e educadora em uma
das mais importantes escolas fundamentais da cidade, o Grupo
Escolar Gonçalves Chaves. Sei também, que era
viúva, genitora e progenitora de uma extensa e fértil
descendência, com filhos e netos espalhados pelo Brasil
e até Europa. No entanto, o primordial sobre si mesma
ela oferecia
desde o primeiro contato, no acolhimento e na alegria. No seu
abraço largo, cabiam todos, sem discriminação
de raça, cor, credo e preferências, era o seu sorriso
um convite à amizade.
Vaidosa, gostava da cor e se vestia de maneira jovem. Braceletes
nos braços, colares e brincos que variavam conforme a
ocasião. Gostava de escrever. Tive o prazer de conhecer
muitos dos seus artigos publicados em jornais da cidade retratando
uma Montes Claros antiga e bucólica.
Ausente da cidade no dia do seu repentino falecimento, ao retornar,
eu fiquei chocada com a notícia. Não tendo podido
acompanhar o seu sepultamento, no sábado compareci a
sua missa de ressurreição na capela do asilo de
São Vicente de Paula.
Fiquei impressionada com tudo que vi. Pessoas em quantidade
lotavam o recinto, amontoavam-se pelos cantos das paredes, nas
portas e janelas, tentando encontrar espaço espremiam
o padre num diminuto canto do altar. Todos queriam fazer-lhe
uma última homenagem. .Música no ar, luzes, cantoria,
leituras emocionadas de belos textos sobre sua pessoa e vida,
destacando-se o artigo de Yedde Zuba que a retratou fielmente.
Tocada pela beleza do momento retirei os olhos do pároco
oficiante e percorri com muita atenção todo o
ambiente. Lá estavam parentes, amigos, autoridades, religiosos,
a cultura da cidade. As pessoas estavam todas bem arrumadas,
até mesmo, elegantes.
Aos meus olhos, uma festa, mais do que isto, uma linda festa
e não poderia ser diferente em se tratando de Amelinha.
Quem viveu intensamente como ela, quem foi ao mesmo tempo a
Marta e a Maria, figuras bíblicas evocadas no evangelho
da sua missa, só poderia mesmo festejar esta passagem
como uma mudança de vida. É que Amélia,
além de ter escolhido viver com alegria, acreditava na
ressurreição, pois tinha já se tornado
ministra da eucaristia.
Por
tudo isto, profundamente emocionada eu fiquei a imaginála
no último instante, a olhar para o alto e a dizer-lhe
como o grande poeta Bandeira.
Amelinha
Souto
“O
meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta, com cada coisa em seu lugar.”
Sua presença valeu, Amélia.
Muito obrigada!
Harlen
Soares Veloso
Cadeira N. 26
Patrono: Cyro dos Anjos
“SOARINHO”:
UM HOMEM
ZELOSO PELO BEM COMUM
Recém-chegado
ao Instituto Histórico e Geográfico de Montes
Claros, eu observei atentamente a produção textual
de seus valorosos membros em algumas das revistas já
publicadas. Percebi um grande número de artigos a respeito
de figuras marcantes do passado da região e das famílias
dos respectivos autores.
Admiro e considero louvável esse resgate da memória
dos antepassados, pois eles foram, cada um ao seu modo, protagonistas
da História. Merecem homenagem e recordação
que mantenha viva a força inspiradora de seus bons exemplos.
Nessa mesma toada, inauguro a minha participação
no IHGMC com um registro a respeito da vida de meu bisavô
materno.
Gregório Soares Caldeira nasceu em Juramento/MG
no dia 30/12/1891. Recebeu o mesmo nome do pai e sua mãe
foi Senhorinha Rodrigues Caldeira.
Em livros paroquiais antigos encontra-se a anotação
de seu batismo, ocorrido no dia 09/09/1892, na Fazenda Canoas
(região de Juramento/MG):
Fonte:
familysearch.org
Casou-se
com Emerenciana Rodrigues Soares (“Dona Bela”) e
o casal teve numerosa descendência a partir dos filhos
Azamor Soares Caldeira (pai de Zelita, minha Mãe); Jaime
Soares Caldeira; João Batista Soares Caldeira; e Leônidas
Soares Caldeira, além de Iolando Soares Caldeira.
Era conhecido como “Soarinho”,
apelido diminutivo que contrasta com a grandeza de sua pessoa.
Foi homem de reconhecida capacidade de empreendimento e de espírito
caridoso, sendo merecedor do respeito e admiração
dos que com ele conviveram, eternizada
em relatos que perpassam gerações através
dos testemunhos de familiares e amigos.
Foi proprietário da fazenda Decamão, em Juramento/MG,
onde edificou uma sede em que consta a inscrição
do ano de sua construção: 1923. Transferiu-se
posteriormente para Montes Claros/MG, adquirindo uma área
que atualmente corresponde às imediações
do Colégio Marista, abrangendo os bairros São
José e Roxo Verde. Sua casa localizava-se em frente à
Praça existente na confluência da Rua Padre Champagnat
com a Av. Santos Dumont. Ali providenciou a perfuração
de poço artesiano e, por se tratar de ponto geograficamente
mais elevado do bairro, fornecia água para muitos vizinhos,
gratuitamente.
Soarinho é reconhecido como benemérito da Sociedade
São Vicente de Paulo, cuja sede no bairro São
José encontra-se em terreno por ele doado. Está
registrado em ata da referida instituição o elogio
à sua “operosa atividade, boa vontade, honra e
dignidade”.
O
atual presidente da instituição, Hermelindo Rodrigues
Malveira, registrou o depoimento de um de seus Confrades mais
antigos, o Sr. Laurindo Martins da Conceição,
a seguir transcrito:
“Confrade Gregório Soares.
Soarinho, como ele era conhecido, foi o fundador da Conferência
Santa Terezinha da Sociedade São Vicente de Paulo no
ano de 1953, juntamente com os Confrades Malaquias Pimenta,
Chiquinho Pinto e Gentil Calixto de Carvalho. Ele doou o terreno
para construir a Conferência e pagou os pedreiros Laurindo
Martins da Conceição e Manoel Raposo (todos os
dois eram confrades Vicentinos) para levantar as paredes da
sede. Antes, a Conferência Santa Terezinha se reunia na
Escola Simeão Ribeiro, na Praça do Roxo Verde.
Mais tarde um pouco, Soarinho comprou dois barracões
ao lado da sede e doou para a Conferência. Soarinho era
uma pessoa zelosa pelo bem comum. Ele doou, ao lado dos barracões
da Conferência, um terreno para a Prefeitura construir
um posto de saúde do bairro e adjacências. Mais
tarde, o posto foi desativado e passou a ser uma escola, onde
muitos dos nossos contemporâneos estudaram. Depois de
um bom tempo, com o desativamento da escola, Soarinho comprou
o prédio da Prefeitura e doou para a Conferência.
Ele pensou no futuro. Hoje, a Conferência é uma
das poucas de Montes Claros que têm um patrimônio,
que é alugado para três moradores, cuja renda nós
revertemos em favor dos mais pobres, como construção
de várias casas, doação de materiais de
construção para pessoas que não têm
como comprar, além de cestas básicas todos os
meses para nossos assistidos”.
A propósito, ‘Seu’ Laurindo faleceu em maio
de 2017, aos 90 anos de idade, cerca de um mês depois
de dar esse depoimento (e aqui abro um parêntesis para
ressaltar a importância do registro da história
oral, pelo valioso testemunho dos idosos).
Também merece destaque o fato de que Soarinho contribuiu
para a edificação do Colégio São
José, através da venda por preço simbólico
de parte do terreno onde está construída a escola.
Por esse gesto, recebeu, juntamente com a esposa Emerenciana,
uma dedicatória no Livro dos Benfeitores do então
Ginásio São José, dos Irmãos Maristas,
assim redigida:
Foto:
arquivo de Jaime Prates Caldeira
“Ao
venerando montesclarense Gregório Soares Caldeira e Exma.
esposa Emerenciana Rodrigues Soares. A Associação
dos Amigos do Progresso de Montes Claros faltaria ao seu dever
de gratidão se omitisse, neste momento festivo em que
as obras do ginásio São José, dos Irmãos
Maristas, caminha para a sua conclusão, pelo que, recebam
esta homenagem singela, porém nascida do desejo unânime
dos associados para firmar no tempo a colaboração
expressiva dos nobres montesclarenses que, efetuando uma venda
por preços mínimos de terrenos de alto valor,
tornou possível esta grande realização.
Em testemunho do que acima está expresso, juntamos dois
exemplares da ‘gazeta do povo’ que publicou a 6ª
ata de gratidão, oferecida aos Beneméritos vendedores
dos terrenos do patrimônio do ginásio. Que esta
visita histórica de 26-6-952 do nosso Bispo Dom Luiz
Vitor Sartori, seja uma bênção de Deus para
os estimados amigos e toda família. Montes Claros, 3-8-952.
Pela Associação dos Amigos do Progresso, Gentil
Gonzaga, Tesoureiro”.
Um
interessante relato familiar nos dá conta de que, por
ocasião das Bodas de Ouro de Soarinho e Emerenciana,
ele providenciou um grande almoço para os assistidos
pela Conferência de São Vicente de Paulo. O banquete
aos pobres foi servido um dia antes da festa com os parentes.
Cioso de sua reputação, ele quis com isso evitar
qualquer tipo de suspeita de que porventura teriam sido oferecidas
aos assistidos as sobras da comemoração.
Reunião
familiar nas Bodas de Ouro (foto de arquivo pessoal)
Católico
fervoroso, “Soarinho” tinha o hábito da oração
diária do Terço em família. Eram comuns
suas romarias para Bom Jesus da Lapa/BA e Aparecida do Norte/SP.
Nas atas da Conferência de São Vicente, há
registros de sua firme orientação no sentido do
comparecimento obrigatório à missa aos domingos,
sinalizando a importância da comunhão. No âmbito
da atuação na entidade, ressaltava ele a necessidade
de visita aos pobres assistidos, enfatizando para os Confrades
a grande importância do ato.
Este ano de 2018 marca o cinquentenário do falecimento
de Soarinho, ocorrido em 26/10/1968, em Montes Claros. Na ocasião,
suas roupas foram doadas à Conferência Vicentina
para distribuição aos necessitados. Em ata de
15/12/1968, foi registrada a sugestão de mudança
do nome da Rua São Vicente de Paulo para Rua Gregório
Soares Caldeira, como “condecoração de honra
ao fundador da Conferência”.
É este, pois, um breve relato sobre a vida de Soarinho,
que marcou sua passagem por esse mundo com a vivência
autêntica da fé Cristã, sedimentada em obras
de caridade, deixando um edificante exemplo de amor a Deus e
ao próximo.
Foto:
arquivo pessoal
Foto:
arquivo pessoal
Ivana
Ferrante Rebello
Cadeira N. 56
Patrono: João Luís Machado Lafetá
Manoel
Ambrósio de
Oliveira: um escritor do
Norte de Minas Gerais, do
início do século XX.
Manoel
Ambrósio de Oliveira nasceu na cidade de Januária,
norte de Minas Gerais, em 8 de dezembro de 1865. Atuou como
professor, historiador, folclorista, escritor e jornalista.
Ocupou a cadeira 75 no Instituto Histórico e Geográfico
de Minas Gerais e antecipou trabalhos em várias áreas
como antropologia, ecologia, economia e sociologia. Sua obra
mais conhecida é o livro de contos Brasil Interior, objeto
deste estudo, escrito em 1912 e só publicado em 1934.
Foi reeditado e publicado em 2015, pela Universidade Estadual
e Montes Claros/UNIMONTES.
O januarense é também autor do livro Brasil do
Vale (1909), ainda inédito, que apresenta um conjunto
de contos populares nos quais aparecem registro de adivinhações,
parlendas, ditados populares, orações e rezas.
O livro conta com 390 folhas datilografadas, divididas em 3
seções, requerendo estudo e publicação.
Publicou pela Imprensa Oficial o romance Hercília (1923),
editado anteriormente em formade
folhetim no Jornal a Luz, e, pela Editora Moção,
Ermida do Planalto
(1945) e Os Laras (1938).
No livro Brasil Interior, lê-se o relato de palestras
populares e lendas do povo barranqueiro – conforme é
conhecido o morador das barrancas do Rio São Francisco
– além de evidenciar crenças, ritos, mitos
e expressões vocabulares. Em sua literatura, ele irá
trazer ao lume aspectos culturais, sociais, geográficos,
históricos e linguísticos da região sertaneja
que compreende o Norte de Minas, ou seja, do “interior”
mineiro, constituindo-se, assim, um exemplar do que se poderia
chamar de literatura regional.
A prosa regionalista supera, segundo Alfredo Bosi, vestígios
idealistas românticos do passado, imergindo vigorosamente
na realidade brasileira. No entanto, Bosi distingue o termo
regionalismo, considerando a presença de duas tendências:
o regionalismo “sério”, que implica íntimo
sentimento da terra e do homem e o regionalismo exótico
e “pitoresco”, apenas simulacro da nossa consciência
local.
Semelhante à abordagem de Alfredo Bosi, Afrânio
Coutinho (2004) assevera que há várias maneiras
de interpretar as chamadas produções regionalistas.
Em sua análise, duas acepções são
destacadas: a primeira é a visão errônea
de um regionalismo medíocre, que se vale de um provincianismo
de “mau sentido”, portador, segundo o crítico,
de um conteúdo limitado capaz de acirrar a rivalidade
entre as regiões. Outro sentido que se dá ao regionalismo
é aproximá-lo de localismo literário e
da exposição do pitoresco, que para ele, é
uma forma do escapismo romântico de gerações
ultrapassadas.
A publicação, em 1912, da obra Contos Gauchescos,
de João Simões Lopes Neto, traz ao regionalismo
brasileiro novas tendências, que, para a crítica
especializada, estariam associadas às requisições
do pré-modernismo brasileiro, seguido do livro Urupês
(1918), de Monteiro Lobato. Equiparando-se aos dois livros supracitados,
o livro Brasil Interior, de Manuel Ambrósio, é
composto de 22 contos e suaescrita
também data de 1912, coincidindo com a publicação
da obra de Simões Lopes. A coletânea de Ambrósio
retrata mitos da região norte-mineira, representado cenas
e paisagens típicas das margens do Rio São Francisco.
Resulta em 12 lendas recontadas, que compõem a primeira
parte, 13 contos e 15 contos do imaginário regional e
universal. A linguagem da obra prima pelo veio dialetal e poético,
rico em substrato humano.
Não se pode deixar de mencionar o lapso temporal existente
entre a redação da coletânea e sua edição,
que somam 22 anos. O decurso de tempo talvez encontre ressonância
nas distâncias territoriais impostas aos habitantes do
sertão norte-mineiro, decorrentes do atraso, da ausência
de políticas públicas que amparassem o homem do
sertão em suas necessidades e o colocasse em diálogo
efetivo com setores urbanizados do país e até
mesmo com o restante do estado de Minas Gerais. Este afastamento,
por outro lado, ocasionou na preservação de um
linguajar diferenciado, que contém ressonância
do falar português, de tradição humanística,
com alguma influência do espanhol.
Nos contos de Manoel Ambrósio, encontramos diferentes
registros linguísticos que representam as graduações
sociais e suas nuances: a do narrador, a dos oficiais, a dos
fazendeiros, a dos vaqueiros, a dos pescadores, entre elas.
Como cada grupo social retratado utiliza formas e expressão
próprias, vê-se, no final da edição,
um glossário de termos. Essa riqueza linguística
e o tratamento poético que, às vezes, a linguagem
assume, leva-nos a uma irrefutável aproximação
entre a escrita de Manoel Ambrósio e a de Guimarães
Rosa, salvaguardadas todas as diferenças.
Os temas da obra de Ambrósio são ligados à
paisagem, às relações sociais locais e
ao cotidiano dos habitantes, mas não têm a conotação
filosófica e a densidade emocional que caracterizam a
ficção rosiana.
No
entanto, não se justifica o fato de Manoel Ambrósio
de Oliveira ser quase um desconhecido nas letras nacionais.
A leitura de Brasil Interior é suficiente para se pensar
que a escrita de Ambrósio não foi indiferente
às influências de um realismosocial que se disseminava
na época, mesmo sem alcançar devidamente seu lugar
ao lado de notáveis prosadores regionalistas e padecendo
da atenção arrefecida da crítica.
Para Diogo Vasconcelos, em “O FOLCLORISTA Manoel Ambrósio”(1974),
a análise converte-se para aspectos da vida e obras de
Manoel Ambrósio, ressaltando sua atuação
como educador, jornalista, historiador, poeta, autor teatral
e prosador. Caracterizando o mineiro como um “homem a
frente de seu tempo”, Vasconcelos afirma que o januarense,
antecipando-se aos antropólogos, sociólogos e
economistas e ecologistas de hoje, numa época em que
tais ciências praticamente não se existiam, empreendeu
estudos profundos nessas áreas. Todavia, faltam estudos
sobre a obra ficcional do autor, sob o fulcro da literatura,
inclusive para refletir sobre sua importância e influência,
conforme se pretende demonstrar no presente texto.
É preciso destacar que no processo de composição
do livro Brasil Interior sobressaem os “causos”,
conforme o próprio autor os trata, admitindo sua profunda
relação com a literatura oral. Dividido em três
partes – “Palestras Populares”, dedicada à
recolha de lendas ribeirinhas, “Narrativas”, constituída
de contos, nos quais se privilegia a figura do narrador e contador
de histórias e, novamente, “Palestras Populares”,
em que se destacam a recolha de elementos folclóricos,
reencenados em narrativas curtas. Os títulos de cada
parte fornecem uma ideia da organicidade da obra e enfatizam
o propósito de o escritor fornecer suporte à memória
local, a partir de um conjunto de costumes, ritos, e valores,
nos quais a experiência humana, contudo, sobressai.
Sobre
o livro, Vasconcelos reconhece que não se pode negar
que nele haja folclore, mas se trata de um “folclore literatizado”,
trazido a lume sob o manto do pitoresco, do insólito,
sem perder a perspectiva da representatividade literária.
Ao dar ênfase à figura do contador de histórias,
sempre presente nos contos que integram o livro, Ambrósio
revivifica o hábito peculiar brasileiro de contar histórias,
celebrando a matriz oralizante que, conforme sabemos, patenteia
a narrativa escrita ocidental. Tal hábito ainda resiste
na região conhecida como o sertão do Urucuia,
local em que se desenvolvem as histórias do livro Brasil
Interior que, anos depois, seria celebrizado na ficção
de Guimarães Rosa.
No trecho em destaque, verificamos uma descrição
desse contador de histórias, que atua como narrador dos
contos de Ambrósio:
Contava com gosto, como um dos mais antigos homens do seu
tempo, suas velhas xistosas lendas com o sorriso e simplicidade
de crédula creança com limpeza e graça
taes, que não era muito possível a qualquer tentar
uma dúvida que sahisse de sua boca. Assim, em dias de
bom humor, de pachorra e minuciosidades entre amadores de tradicções,
costumava contar uma das suas e cuja palestra ainda que pouco
desfigurada no fundo, todavia, corporizava-se por assim dizer
em suas palavras sérias, calmas, intelligentes e inflexíveis.
(AMBRÓSIO, 1934 p.30).
O narrador, portador de instrumental sofisticado de linguagem,
transfere a voz para um contador de casos que, de posse de sua
faculdade de narrar, utiliza termos regionais, provérbios
locais e expressões populares que colocam o leitor em
contato com os feitos extraordinários e os elementos
fantásticos que compõem as narrativas.
O livro resulta, então, como um singular hibridismo que
alia à narrativa realista, os apelos da fantasia e as
seduções dos jogos verbais.
Na organicidade da obra, que condensa surpreendente variedade,
encontramos histórias que beiram o documental, outras
que assimilam o registro folclórico; algumas funcionando
como o quase-drama da difícil vida ribeirinha e ainda
outras que integram narratividade e poesia, numa linguagem interessante
e vivaz.
Tais elementos são suficientes para que se identifiquem,
na ficção de Ambrósio, novas perspectivas
sobre o sertanejo, resultando num produto de relativa originalidade,
performatizado no plano da enunciação. Os contos
do livro são aglutinadores de uma realidade mais vasta
que a do seu mero argumento, e, por isso, influem no leitor
uma força que faz suspeitar da modéstia de seu
conteúdo aparente e da brevidade do seu texto.
Os personagens do livro dividem-se em pescadores, que se aventuram
em busca de riquezas; vaqueiros que se metamorfoseiam em seres
fantásticos; monstros e seres imaginários, como
serpente, o caapora, o bicho-homem, o dourado; gente que faz
mandigas e recorre a todos os sortilégios para se proteger
dos perigos que existem nas profundas águas do Rio São
Francisco.
As histórias evidenciam as forças que evolam do
sertão adentro, onde predominou a cultura do gado vacum
e cavalar e a mitificação da relação
do homem e da natureza, como vemos no conto “Mãe
D’Água”. Na narrativa, um pescador deseja
a riqueza, por meio da descoberta do ouro e do diamante, que
estão nas profundezas do Rio São Francisco e bem
guardados pela Mãe d’Água. No fundo do Rio,
existe um palácio de pedras preciosas, em que mora a
guardiã das águas, com suas vestimentas preciosas
e seu canto sedutor. O pescador, em sua lida cotidiana, ambiciona
a riqueza fácil, mas esta não está ao alcance
dos homens comuns.
As narrativas, ainda que contenham enredos simplificados e efeitos
moralizantes, são, no entanto, reflexões sobre
a vida. Durante a leitura das histórias, percebe-se um
desejo puramente humano de escapar
a um cotidiano enfadonho, que abre espaço ao sonho e
aos acontecimentos insólitos. Mas, como se conclui, ao
cabo da leitura, a repetição da existência
cria comportamentos essenciais à compreensão do
mundo e à sobrevivência social.
Há casos em que os conflitos sociais são sobressaltados,
como é o caso de “Três Bundas”, cuja
trama se passa em 1835. O protagonista é um negro, “roliço
e de singular musculatura, com andar majestoso e grave, mais
parecia um general à frente de um exército, do
que um comum cidadão”. Sua altivez torna-o figura
ameaçadora às autoridades locais e, por tal motivo,
é sentenciado à morte pelo frágil delegado
português. O contraste interposto entre as estruturas
físicas do negro e do português são argumentos
para se representar as relações de força
e fraqueza, poder e submissão, características
da sociedade do século XIX.
A questão étnica surge com alguma frequência
no livro de Ambrósio, como também percebemos em
“O Rei do Rosário”, onde o mulato, eleito
rei da festa de Nossa Senhora do Rosário, mostra-se indignado,
conforme se vê no excerto:
Ele,
doente da branquidade, manteiga de sebo, homem da alta sociedade,
estava no caso de fazer uma festa, porém, condigna,
do império; pois que, festas de negros não passavam
de um abuso de confiança, um desaforo intragável,
um insulto direto e falta de consideração à
sua pessoa qualificada [...]. De tais honras absolutamente
não precisava; seria um imenso favor não se
lhe tocar nesse sentido; que sua cabeça jamais cingira
uma coroa da santa negra. (AMBRÓSIO, 1934, p. 64).
O fim do mulato é a metamorfose em um “cadáver
tão disforme pelo rosto como nunca se vira antes”,
condenado a trabalhar incansavelmente no dia da festa de Nossa
Senhora, por força de uma maldição. O lobisomem
e o diabo, representantes do lendário universal, surgem
também, tipificando, no entanto, tensões própriasdo
viver ribeirinho. Também se registra a figura do caapora,
descrito como caboclo pequeno, encantado, de pé redondo,
cocho, com um olho único no meio da testa. Como registra
Manoel Ambosio, nas narrativas populares representam-se:
Sonhos,
aparições de almas do outro mundo, contos
reais, contos mentirosos, contos de contos, historietas absurdas,
casos virgens, ignorados, infalíveis descrições,
velhos e novos retiros, velhas e novas tentativas, exemplos
aos milhares, aos milhões, toda essa farandulagem de
grandeza e interminável sede e desejos de opulências
que transpiram da indigência, como da abastança,
usuraria, poderia dar um verdadeiro tesouro, realíssimo:
de formosas lendas, de belos episódios edificantes,
necessários, de homens, de usos, de costumes, de lugares,
de remotíssimas eras, repintadas de quadros da vida
nacional com suas emoções, suas reminiscências,
seus sofrimentos, afrontas, vinganças e heroísmos
patrióticos, que os séculos vão envolvendo
na poeira esmagadora de seus mistérios (AMBRÓSIO,
1934, p. 10).
As lendas e narrativas populares registram processos de integração
do homem com a natureza e o espaço em que vive, as formas
de apropriação e o domínio sobre o invisível.
No conto “Caboclo D’Água”, o personagem,
caprichoso e vingativo, é responsabilizado pelas tragédias
decorrentes das enchentes do rio:
Na
ocasião das enchentes grandes, rói furiosamente
a base dos barrancos, quebra formidáveis barreiras,
abre solapões profundos, devasta ilhas e margens até
derrubar o rancho, beira no chão o desditoso; depois,
satisfeito, qual grosso tronco de árvore bóia
parado, ou então resvala pelo meio do rio (AMBRÓSIO,
1934, p. 33).
Mesmo sendo vasta a relação de autores mineiros
que figuram no cenário da literatura nacional como expoentes
na produção literária brasileira, ainda
assim, alguns escritores mineiros têm sua trajetória
literária
pouco conhecida, no período que antecede a metade do
século XX, como parece ser o caso do escritor Manoel
Ambrósio de Oliveira. A lacuna encontra muitas explicações;
a maior parte com respaldo na distância geográfica
de certas cidades mineiras aos grandes centros de consumo e
nas questões, sempre problemáticas, que dizem
respeito ao estabelecimento do cânone literário,
com todas as suas especificidades.
Independente de tais questões, os estudos literários
voltam-se, atualmente, para a revisão de alguns conceitos,
além de se ter, já, como ponto pacífico,
a necessidade de se estabelecer outros lugares, para que autores,
de alguma forma segregados das universidades, das salas de aula
ou das bibliotecas, encontrem um jeito legítimo de circularem
e serem lidos.
Determinadas circunstâncias como a localização
geográfica, os meios de distribuição e
as condições dessa distribuição
podem interferir na forma como um autor é lido ou recebido
em sua época. O escritor Manoel Ambrósio de Oliveira
e suas obras foram relegados ao esquecimento, figurando como
um nome quase desconhecido no cenário da literatura de
Minas Gerais e da brasileira.
Não se pode, nesses casos, separar o homem de sua obra,
mormente porque não se sabe, claramente, se foi o homem
e suas circunstâncias provocadores do descaso sobre seu
produto literário, em seu tempo – como ocorreu
com os escritores Cruz e Souza e Lima Barreto, por exemplo,
ambos dotados de um talento inquestionável – ou
se devido ao fato de sua literatura ser mesmo desprovida de
maiores qualidades, o que decretaria definitivamente seu esquecimento.
Há um grupo de estudos, criado e coordenado por mim,
que se dedica aos “Intérpretes dos Gerais”,
cujo foco se orienta por destacar e valorizar autores da literatura
dos Gerais mineiros, esquecidos pelo tempo. No caso específico
desta pesquisa, destaque-se a necessidade de se ler mais a ficção
de Manoel Ambrósio de Oliveira. Sua obra revela seu lugar
de origem, suas vivências culturais e o linguajar característico
de sua região, bem como ilustra as vicissitudes sociais,
o descaso político e a miséria que circundavam
seu lugar de origem. Os contos de Manoel Ambrósio de
Oliveira representam para a literatura de Minas Gerais o que
representou João Simões Lopes para a literatura
do Rio Grande do Sul. É preciso, entretanto, que se tire
das bibliotecas a grossa camada de poeira que as escondem, para
deixar que se contem, novamente, as histórias que foram
esquecidas.
Manoel
Ambrósio de Oliveira
REFERÊNCIAS:
AMBRÓSIO, Manoel. Brasil Interior: Palestras populares-folclore
das margens do rio S. Francisco. São Paulo: Editora Nelson
Benjamim Monção, 1934. ASSIS, Machado de. Instinto
de nacionalidade In: Obra completa.III, 1962. p. 806.
CORTÀZAR, Julio. Alguns Aspectos do Conto. Valise de
Cronópio. São Paulo: Perspectivas, 2004.
COUTINHO, Alfredo. A literatura no Brasil. In: Historiografia
Literária em novo Rumo. 7ed. São Paulo: Global,
2004. GOTLIB, Nádia Battela. Teoria do Conto, 1990.
VASCONCELOS, F. O FOLCLORISTA Manoel Ambrósio. Separata
de “Itaytera”, nº 18. (Edição
do instituto cultural do cariri patrocínio da comunidade
de Januária Minas Gerais, 1974).
Jânio
Marques Dias
Cadeira N. 08
Patrono: Antônio Jorge
O
ESPAÇO GEOGRÁFICO DO
SERTÃO NORTE MINEIRO E SUAS
MÚLTIPLAS VISÕES DE MUNDO
E DE SAGRADO
A
natureza sertaneja nos apresenta diversos eventos que com o
passar do tempo adquiriram horizontes místicos e nos
deram uma observação de um mundo imaginário
capaz de transformar o conhecimento humano em uma experiência
especial com o transcendental. Para constatar a veracidade desta
afirmativa iremos buscar, nos teóricos, informações
para legitimação e construção do
cenário místico sertanejo encontrado desde a preparação
da terra para o plantio até a colheita do produto semeado.
No
entanto, ao falar da mística sertaneja, devemos ter uma
preocupação para não perder o foco ou cair
em uma armadilha, tratando
o tema simplesmente com o olhar voltado para o moderno, pois
nosso intuito aqui é mostrar as afinidades entre práticas
cotidianas e a religiosidade local. Simbolicamente, a sociedade
sertaneja apresenta uma devoção a terra e reafirma
sua amplitude no entendimento, na identificação
e na experiência com o sagrado.
Para nosso conhecimento e aplicabilidade do objeto em estudo
vamos dar ênfase, no primeiro momento, a relação
entre sertão-sertanejo-sagrado que formam o eixo de nossa
indagação e reflexão. Esses termos são
ligados pela situação particular da região,
parte norte do Estado de Minas Gerais, beneficiada pelo Rio
São Francisco, por nascentes de córregos e veredas
cujas águas possuem um significado místico. Como
a região é muito rica em recursos naturais, particularmente
florestais, é fundamental analisar neste estudo a relação
das florestas e seu mundo invisível, criado a partir
da necessidade de satisfazer a mente humana.
Nos dizeres de Luis da Camara Cascudo, sertão é
o interior, composto por uma fauna e flora nada semelhante ao
restante do mundo, “é folcloricamente mais ligado
ao ciclo do gado e com a permanência
de costumes e tradições antigas” (CASCUDO,
1984). Na atualidade, o nome fixou-se no Nordeste Brasileiro
e aqui destacamos o sertão do Norte de Minas Gerais que
durante boa parte da história do Brasil foi considerado
como um espaço hostil e marginal. Um território
onde violência e religiosidade fizeram parte da construção
da memória e da narrativa sertanista.
As imagens sertanejas dos homens e mulheres construídas
pela literatura e pelo poder vigente fizeram ver um território
estratificado com pequenos núcleos urbanos nos quais
apresentam uma ordem desigualitária, que coronéis,
padres e pobres, estão sempre sob custódia das
fronteiras municipais, por nascentes, rios e monumentos arquitetônicos
construídos a partir da especulação religiosa.
Individualizado pela Coroa Portuguesa, o sertão foi rejeitado
e por vários séculos foi isolado da chamada modernização
metropolitana.
Os
pequenos núcleos urbanos e as comunidades rurais demarcaram
o território e transformou o sertão norte mineiro
numa propriedade inviolável com uma classe econômica
que exerceu sua superioridade, baseada no exclusivo e no excludente.
A identidade do superior foi marcada pela propriedade, limites,
terror e invasão. O rico e o pobre, o urbano e o rural
só sentiam iguais nos espaços chamados sagrados
ou durante as missas e festividades religiosas, mas permaneciam
incomunicáveis entre si, por uma forte divisão
mental que censuram os contágios entre meios diferentes
que permaneceram intactos até recentemente.
Padres e Coronéis eram homens predominantemente portugueses,
“embora tenha havido presença residual de espanhóis,
franceses, holandeses e ciganos” (WEHLING, 2005), reproduziram
no sertão uma sociedade estamental de onde provinha,
adaptando-a às novas condições. Trouxe
seus valores, sua organização, suas regras familiares,
patrimoniais e obrigacionais, “tudo temperado por duas
situações contraditórias: de um lado, a
sensação de liberdade do Novo Mundo, onde as péias
sociais seriam mais frouxas, a mobilidade mais fácil,
a presença do Estado mais tênue, e do outro, a
sensação resumida na expressão que afirmava
não haver pecado além do equador” (WEHLING,
2005).
Refugiados dos espaços produtivos, negros, marginais
e indígenas formaram a camada pobre do sertão,
dominaram espaços, criaram palavras e vulgarizaram a
fé. A religiosidade popular surgiu a partir de uma necessidade
de adaptação do espaço sagrado português
com a realidade sertaneja. No primeiro momento, pela escassez
do clero, que visitavam os lugarejos de época em época
e vomitando o ódio através das pragas e maldições
e demais gêneros verbais, proliferava o medo do sobrenatural
e a necessidade da salvação da alma. As diferentes
violências religiosas, durante o período colonial
no sertão, produziram práticas religiosas diversificadas,
de acordo com a realidade de cada comunidade e sua predominância
étnica.
A
cultura negra, marcada pela macro-religiosidade africana, “sofreu
e sofre processo de mestiçagem com índios e brancos,
alterando alguns diferenciais e fazendo complexas combinações”
(LIBÂNIO; MURAD, 2003. p. 263). As consequências
desta mestiçagem foi o surgimento de um fenômeno
religioso apropriado de inúmeras místicas. As
múltiplas crenças que invadiram o sertão
travaram diversas batalhas político-sócio-culturais
e religiosas. Como consequência dessas batalhas, em primeiro
lugar vai desaparecer o espírito colonizador, nasceu
uma sociedade sertaneja, com um convívio social e com
os apadrinhamentos que solidificaram as limitadas solidariedades
urbanas e rurais. Em seguida, invadidos pela universalidade,
travam-se lutas pelo direito de cultuar e respeitar a significação
da fé sem interpretações atravessadas pela
chamada violência simbólica fruto da dominação
e personificação cristã.
O perfil do sertão progressista, o investimento na pecuária
e na agricultura e o crescimento populacional no período
colonial atraíram pessoas de muitas regiões do
Brasil e do mundo. Viajantes, comerciantes, judeus, turcos chegaram
ao sertão mineiro, promissora fronteira mercadológica.
Trouxeram divisas, movimentaram o comércio e praticaram
suas religiões longe do elemento aniquilador. Essas práticas
estão representadas no cotidiano do homem sertanejo como
costumes ancestrais. O exercício dessas práticas
religiosas adicionadas às práticas católicas
foi à condição primeira para nascimento
da tradição religiosa sertaneja. Outro grupo destacado
aqui são os ciganos, presentes no sertão desde
o período aurífero, que segundo Rodrigo Corrêa
Teixeira, apresenta múltiplas identidades. “Não
são um grupo religioso ou uma nacionalidade” (TEIXEIRA,
2007). A diferença é muito grande, pois na realidade
não existem ciganos, mas sim diversas comunidades chamadas
de ciganas mantendo relações de semelhança
e/ou dessemelhança com as outras. A história do
cigano no sertão é uma viagem nas diferentes religiões
com as quais vários grupos ciganos, sucessiva e contraditoriamente,
tiveram contato. Outro destaque, no meio cigano, é a
concepção de mundo
manifestada na sua universalidade. A influência na língua
e na estética e notadamente percebida em alguns lugares
onde os acampamentos ciganos eram mais freqüentes no sertão.
Quanto às questões dos valores e princípios
religiosos vamos destacar Fernando de Azeredo que afirma: A
religião teve, no período colonial, uma influência
sem dúvida predominante e quase exclusiva na organização
do sistema de cultura que, tanto no seu conteúdo como
nas suas formas e instituições, acusa fortemente
essas relações de estreita dependência entre
cultura e a religião (AZEREDO, 2010). No sertão
não é diferente, contudo, é bom frisar
que a religião estava de mãos dadas com a violência,
devido a dispersão geográfica, padres e administradores
de capelas acumulavam bens e possuíam escravos. Os homens
de negócios (judeus) mantinham relações
de amizade com os Cristãos e não era de se assustar
quando era avaliada a extensão dos negócios e
o nível da fortuna acumulada pela a igreja católica
durante o período colonial no sertão norte mineiro.
Atualmente podemos perceber como foi o envolvimento dessa igreja
colonial, quando encontramos várias cidades que surgiram
e desenvolveram em terrenos tidos como “terra de santo”.
Nesse território desenvolveu-se uma cultura e uma religiosidade
própria de cada lugar de acordo com a história
e a devoção ao santo proprietário, transformado
mais tarde em padroeiro. As diversidades de atividades econômicas
são bem visíveis no final do século XVIII,
terras de plantar, casas de viver, paiol, senzalas, estrebarias
e capela para demonstrar sua devoção ao santo
protetor constituíam os bens que pertenciam um senhor
de família no sertão mineiro.
Nesse sistema de relações vamos encontrar uma
sociedade patriarcal organizada a partir de bens adquiridos
e transformados em poderes políticos e religiosos. Arno
Wehling ao enfocar ao enfocar a sociedade brasileira do período
colonial, debate o tema é chega a seguinte conclusão:
Sob a égide de um estado que impunha determinado modelo
social e religioso às comunidades que viviamnos
seus limites legais, mesclaram-se ou apartaram-se portugueses
transplantados, indígenas e africanos de diferentes culturas,
cada qual trazendo consigo suas instituições e
seus quadros mentais (WEHLING, 2005).
A
partir das considerações de WEHLING (2005), podemos
afirmar que a sociedade Sertaneja, implantada a partir do modelo
colonial, foi à fusão de várias populações,
com mobilidades e miscigenação tão ou mais
intensas que outras sociedades coloniais brasileiras. Essa sociedade
apresentou-nos uma capacidade de habitar um espaço inédito,
de segredos e de reflexões em torno desses segredos,
com linguagens e poderes. Sem intervenção do elemento
dominador, sem a imposição dos saberes sagrados
legitimados pela cristandade católica. O sertão
criou seu modo de conquista com gestos e palavras revestidos
de poderes e de autoridades que ficaram registradas na tradição
de cada localidade.
Assim registrou Vera Lúcia Felício Pereira pelas
suas andanças pelo sertão:
Um
dos mais respeitados narradores do lugar recusa-se a contar
seus casos para pessoas desconhecidas, gente diferente que
ele sabe não fazer parte da comunidade onde viver.
Essa atitude fundamenta-se na crença de que aqueles
que escutam se tornam donos da palavra ouvida e, ao partirem,
levam consigo a essência vital, a força de
uma linguagem inerente ao contexto de vida do grupo. (PEREIRA,
1996. p. 49)
Essas narrativas funcionam como um elemento mantenedor da vida
cotidiana, que mesmo inseguros a respeito das “energias”
que são liberadas, ao contar pequenas histórias,
são ligadas a outras culturas, correndo o risco de perder
seu valor sagrado e dominador, a partir das múltiplas
infrações assumidas pelas diferentes pessoas “estrangeiras”
que desafiam o local com questionamentos e perguntas, produzem
violências e censuram a tradição e a mística
de um povo.
A
paisagem sertaneja, inserida ao contesto nacional a partir de
meados do século XX, apresentou eventos frente a um discurso
cultural, transformando a marginalidade sertaneja em algo sagrado.
Apossou e reajustou o saber, o conhecimento e a crença
local em função das provocações
religiosas e culturais, das demandas pentecostais e da desmaterialização
do mundo globalizado. Com a inserção do sertão
norte mineiro no calendário cultural e religioso nacional,
um dos primeiros saldos favoráveis para o sertão
foi a conscientização do sertanejo, amplamente
discutida e compartilhada com outras culturas mineiras, através
de festivais, festas de padroeiros e de santos locais culminou-se
com a chamada invenção da tradicionalidade sertaneja.Reunidos
para celebrar a identidade local, os sertanejos apresentam publicamente
através de gestos, palavras e objetos sagrados ou não
as características que marcaram e marcam a vida sertaneja.
O sagrado foi revestido de peculiaridades, priorizando sua potência
ordenadora e a conservação das características
de cada grupo social surgido a partir da crença de cada
comunidade, aqui destacamos a etnia predominante, principal
elemento condutor do sagrado. No território sertanejo
é notadamente explicito que a manifestação
do sagrado está diretamente ligada ao meio rural, mundo
da pecuária e da agricultura, espaço marcado pela
partilha da fé.
Com a popularização dos costumes sertanejos, o
poder público conduziu as crenças e as tradições
religiosas para outros universos culturais e sociais. As roupas
coloridas, cuja cor indica o santo de devoção
e a música com os instrumentos utilizados para produzila
e transformá-la em prazer, foram vistas, durante muito
tempo, pela maioria dos sertanejos como indicio de atraso e
inconvenientes a fé padronizada pela cristandade católica.
Nas manifestações das religiosidades locais, o
sertanejo consagra seus bens e sua vida através de rituais
que para Carlos Alberto Steil “são fundamentais
não só porque situam seus participantes num universo
simbólico que configura a sua realidade, mas sobretudo
por causa de sua forma performativa, o que os torna essenciais
para construção das identidades dos próprios
grupos.” (STEIL, 1996. p.115)
Graças
às manifestações religiosas realizadas
por homens e mulheres, dentro do espaço sertanejo, fica
evidente que a tradição sagrada com suas raízes
etnográficas tendem a crescer e sair da marginalidade
a partir de acumulação de informações
e documentações como forma de resistência
e preservação da fé e da cultura dos diferentes
povos que apropriaram do sertão norte mineiro. Nas últimas
décadas, os lideres religiosos ligados em alguns grupos
com preceitos religiosos determinados por uma religião
têm apresentado um desejo crescente de controlar as vidas
dos povos sertanejos em geral, apropriando de informações
e documentações, fosse para preservá-las
ou para destruílas.
Contudo, o fato de apropriação da fé local
pelo “estrangeiro” e a tentativa de transformá-la
em algo maléfico, resultou-se no surgimento de vários
movimentos de afirmação de determinadas etnias,
com recriações de mitos e reafirmações
étnicas fundamentalmente expressas na conservação,
na expressão, na valorização e na forma
de manifestação da fé e da cultura originária.
“Corpo vivo, etnias e culturas correspondentes, fortemente
enraizadas na tradição, apresentam novas configurações
diante de mudanças nos processos civilizatórios
e no contato com outras culturas” (LIBÂNIO; MURAD.
2003.p. 263).
No sertão em uma mesma época, como por exemplo,
o da tradicional festa do padroeiro, apresenta uma multiplicidade
heterogênea de modos de lidar com o sagrado e sua inter-relação
com a realidade, que sofrem diferenças de localidade
para localidade cujos os ritos e experiências com o sagrado
quebram a aparente uniformidade na seqüência temporal
dos relatos apresentados por devotos e observadores. Nem tudo
do que se apresenta ou é formulado apresenta concordância
com os lugares comuns ou de origem do sagrado, e é por
isso que devemos prestar ação nas vozes, nas brechas
do
vocabulário local e nos pensamentos que modelam os sentidos
e as alternativas sagradas do sertanejo.
Para os sertanistas, existe uma urgência em resgatar a
memória daqueles que são as vozes do sertão
e alinhando com elas entender os conflitos de significação
dos atos sagrados que solidificaram a partir de um contingente
constituído e instituído de uma cultura heterogênea
e sob o controle de um estado que, somente de longe, parecia
inalterável. Para homens e mulheres sertanejas que aderiram
ao metafísico a partir da consciência, espírito,
história, técnicas de lidar com a terra, plantio,
semente e fruto. Foi partir de suas ideologias que mentalmente
elaboraram um projeto civilizatório, que imprime sistematicamente
seu outro lado mais obscuro e sertanejo (natureza, corpo, inconsciente,
rito e mito). O que deveria incorporar uma ideologia do modelo
colonial, que é um modelo branco, dominador e urbano
não aconteceu. A pluralidade etno-cultural impôs
sua força através de corpos/ línguas e
cultura/sagrado, uma pluralidade que simboliza a contra memória
do colonizador.
Antes de abordar o que uma produção literária
referente ao sertão nos apresenta e analisar a ótica
sertaneja dentro de um mundo globalizado a partir de regras
do mercado cultural e religioso. Nosso olhar deverá estar
voltado para o sertanejo, não com um homem marginal,
armado e cheio de representações negativas, mas
como um ser que interroga e dar sentido sua identidade. Nada
mais real entre os registros sertanejos que: a heterogeneidade
humana, a cultura plural e as contradições religiosas.
A identidade religiosa, analisada a partir das representações
sociais, é o resgate vivencial de uma consciência
sertaneja. De um sertão marginal para o sertão
cultural, de um sertão cristão para um sertão
hibrido. A força da mistura reuniu conhecimentos e ensinou
homens e mulheres a valorizar cada instrumento e gesto entre
o profano e o sagrado, como motivo e oportunidade de traçar
um caminhoque
reúne todos os elementos fundamentais e ilimitáveis
para a valorização simbólica e diversificada
da vida sertaneja.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:
AZEVEDO Fernando. A Cultura Brasileira. 7ed. São Paulo:
Edusp, 2010. CASCUDO, Luiz da Camara. Dicionário do Folclore
Brasileiro. 5ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 1984.
LEITE, Fábio. A Questão Ancestral - África
Negra. São Paulo: Palas Athena, 2008. LIBÂNIO,
J. B. e MURAD, Afonso. Introdução à Teologia
- Perfil, Enfoques e Tarefas. 4ed. São Paulo: Loyola,
2003.
PEREIRA, Vera Lúcia Felício. O Artesão
da Memória no Vale do Jequitinhonha. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 1996.
STEIL, Carlos Alberto. O Sertão das Romarias - Um Estudo
Antropológico Sobre o Santuário de Bom Jesus da
Lapa/ Bahia. Petrópolis-RJ: Vozes, 1996.
TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. Ciganos em Minas Gerais. Belo
Horizonte: Crisálida, 2007.
WEHLING, Arno e WEHLING Maria José C. M. Formação
do Brasil Colonial.
4ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
José
Ponciano Neto
Cadeira N. 24
Patrono: Celestino Soares da Cruz
MAÇONARIA:
“Segredos” que
instigam. Eles existem?
“A
Maçonaria proclama a prevalência do espírito
sobre a matéria,
pugnando pelo aperfeiçoamento moral e social da humanidade,
por
meio do cumprimento inflexível do dever, da prática
desinteressada da
beneficência e da investigação constante
da Verdade”.
Mesmo
enlaçados pelo juramento a não revelar os segredos
- alguns maçons revelam a complexidade da sociedade que
chegou ao século 21 com o mesmo poder e influência
de milhares de anos atrás, e, este poder de aglutinação
- quando forte - é para o bem.
Oriundas da Grécia, Egito, Pércia, Roma e mundo
Judeu de outrora; as práticas ritualísticas, principalmente
a iniciação, enfim, desde antiguidade até
hoje na maçonaria moderna permeiam os seus mistérios.
Todos os maçons fazem um pacto de não revelar
o que acontece dentro dos templos maçônicos, porém,
alguns membros da Lojaajudam
a desmitificar o comportamento e rituais desta sociedade secreta
mais cobiçada do globo terrestre. - Neste sentido vou
esclarecer alguns equívocos.
Mas, qual o significado de maçom? O significado de Loja?
O que é a iniciação? - Vou ficar rico se
entrar para a maçonaria?
- A palavra “freemason” é de origem inglesa
que significa pedreiro – que em grafia portuguesa Maçom.
Os maçons foram responsáveis pelas construções
de Templos (inclusive de Salomão), catedrais, castelos
e Fortes de defesa, foram os criadores dos códigos, toques
e sinais para se identificarem se pertenciam ou não à
Ordem.
Mantinham em segredo até as plantas das construções
dos templos e catedrais.
As Lojas Maçônicas não são similares
as lojas de vendas do comercio – a palavra Loja é
de origem inglesa, do verbete “lodge” que significa
ALOJAMENTO. São compostas de doze colunas com símbolos
zodiacais – cordas - abóboda celeste e outros que
fazem parte da ritualística e do aprendizado. Para reunir
em uma loja, são necessários no mínimo
sete maçons.
São inúmeras perguntas sobre a iniciação.
A mais freqüente é se existe pacto de sangue ou
morte de um bode ou outro animal. – afirmo que tudo é
mentira – nosso pacto é com DEUS e filosófico,
queremos que todos os irmãos aperfeiçoem como
ser humano – nosso livro é a Bíblia Sagrada,
no caso dos países Islâmicos onde existem Lojas
da Maçonaria Regular a ritualística é embasada
no Alcorão. A iniciação equivale a “Ressurreição”,
quando o irmão renasce para a purificação.
Ficar rico na maçonaria? É mentira! Você
terá as portas mais abertas para crescer de todas as
formas, encontrará mais facilidades. Mas, rico não!
- Ficar rico, dependerá do trabalho na vida profissional
de cada maçom.
Sobre
o Esquadro, o Compasso e o “G”, são as ferramentas
do pedreiro, e lembra ao maçom que ele nunca deve perder
a retidão – ser honesto e integro. A letra “G”
no centro significa GOD em inglês, cujo sentido expede
a DEUS e ainda, à Geometria.
E os segredos? O maior segredo da maçonaria é
o próprio maçom, que, deve ter como base os conceitos
de Liberdade, Igualdade e Fraternidade e ter desejo de evolução,
tanto economicamente, para melhorar a qualidade de vida da família
e principalmente o progresso intelectual – se um maçom
não acompanhar os princípios maçônico
ele não é um MAÇOM. Um dia será
convidado a sair da Ordem maçônica.
Sabemos que ninguém é 100% certinho. Inclusive
Eu! Tenho lá meus defeitos! Mas, tem que manter a integridade;
não ser mentiroso, ambicioso ou falso, não pode
prejudicar o Irmão e muito menos outras pessoas do mundo
“profano” (aquele que não é do mundo
maçônico).
Quando alguém souber que qualquer maçom está
trapaceando, primeiro procure saber se é maçom
regular e, que Loja pertence – pode ser de uma loja espúria.
Mas, se ele pertence a uma Loja do Grande Oriente do Brasil
– GOB; das Grandes Lojas Estaduais ou da COMAB –
Confederação Maçônica do Brasil,
a pessoa tem que imediatamente procurar o Venerável da
Loja correspondente e fazer a denuncia. A maçonaria tem
que ser transparente com a sociedade.
Como qualquer instituição; na maçonaria
existem irmãos paramentados que nem deveriam passar à
porta de um templo – enquanto, tem homens que NÃO
são maçons que deveriam está dentro da
Ordem há muito tempo.
Estes maçons que não seguem o Código Disciplinar
Maçônico são passivos de serem retirados
da Ordem. Ou seja, expulsos!
Para isso acontecer, tem que ser um crime relevante. Não
é um abalroamento no trânsito, um desentendimento
pessoal ou um malentendido
que devem ser considerados atitudes graves. Mas, para expulsar
um maçom as pessoas afetadas têm que levar ao conhecimento
da Loja do infrator com documentos comprobatórios; não
é ficar por ai dizendo que a maçonaria tem homens
desonestos sem comprovar.
Como já citei, tem maçom infratores, uns usam
a maçonaria indevidamente na política sem o consentimento
das Ordens citadas - outros usam o “santo nome em vão”
para levar vantagens ilícitas, mas, isso não é
maçonaria. A MAÇONARIA É FEITA DE HOMENS
JUSTOS, LIVRES E DE BONS COSTUMES.
Como
já diz. Em todas as religiões existem pessoas
criminosas, na maçonaria não é diferente.
Mas isso vai acabar – basta o irmão maçom
INDICAR só homens dignos e não, aquele colega
de boteco, futebol, parente ou amigo de infância –
pode está dando um tiro no pé da maçonaria.
O perfil do candidato é importante para ingressar na
Ordem Maçônica.
Maçonaria não é reformatório ou
sanatório e, nem instituição financeira;
posso dizer que seja um PURGATÓRIO, onde o homem entra
para purificar a sua pessoa – este é um dos grandes
segredos da maçonaria. Cada reunião é para
discutir diversos assuntos, mas, o principal é para combater
a ignorância e despotismo – glorificar a verdade
e a justiça e promover o bem-estar da pátria,
fomentar as virtudes e acabar com os vícios que destroem
as famílias.
A maçonaria verdadeira não aceita os inimigos
da humanidade, como: os hipócritas, que enganam; os ambiciosos
que usurpam e os corruptos e sem princípios que abusam
da confiança do povo. Temos muitos políticos “maçons”
que são assim! Desde Brasília- DF até Montes
Claros. Porém, estão sendo desvendados e afastados.
Os que não são afastados pela loja, desconfiam
e pedem o “Quite placet” para dar um tempo e ajuizar-se.
Situação que se altera conforme o Venerável
Mestre. Mas, a decisão final é da assembleia.
“Nenhum
maçom será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de Lei”.
Já ocupei o “Trono do Rei Salomão”,
fui Venerável Mestre da nossa loja - que é o presidente,
portanto, sei muito bem o que é tomar uma decisão
em assembléia. É como construir todos os dias
um novo Templo em Jerusalém com a labuta dos nossos irmãos
pedreiros aprendizes, companheiros e mestres.
Símbolos
da Maçonaria
José
Ponciano Neto
Apoio
maçônico:
- Para decidir se a maçonaria vai apoiar “isto
ou aquilo” é necessário que todas as lojas
tomem conhecimento, e, se aprovado pelas as assembleias, ai
sim!... podemos dizer que: “A maçonaria apoia ou
aprova. Não sendo assim, é “fake news”.
Falar em nome da maçonaria tem que ter a anuência
de todas as lojas das três potências, GOB,
GLMMG e COMAB.
Por isso que, cada maçom ou profano tem o direito de
votar naquele candidato que é melhor para a Nação
ou para seu Estado, restringi-lo a isso, é retroagir.
É voltar aos tempos do coronelismo com seus currais eleitorais
– cada um vota naquele que achar melhor, e o melhor, nem
sempre é da região. Somos livres para tomar decisões
com relação ao nosso voto.
Embasado
nas concepções filosóficas e em doutrinas
teosóficas e religiosas; afirmo que se o mundo fosse
maçônico e adotasse os seus princípios,
não teríamos conflitos, corrupção,
política falsa e a violência.
- Os mistérios (ocultismo) espirituais e de regeneração
do Homem
na Ordem Maçônica excitarão aos olhos profanos
por muitos anos. Tudo
em nome de DEUS e do bem!
T.’.F.’.A.’.
(*) José Ponciano Neto: Past Venerável Mestre
da Loja Deus, União e Trabalho Nº 3310 – Deputado
Federal no Grande Oriente do Brasil em Brasília (GOB)
- Ex. Diretor Financeiro do Conselho dos Veneráveis do
Norte de Minas (CONVENORTE) – Membro Tesoureiro da Academia
Maçônica de Letras do Norte de Minas e Membro do
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros.
Juvenal
Caldeira Durães
Cadeira N. 81
Patrono: Nathércio França
O
TALENTO QUE SURPREENDE
Eu,
em mil novecentos e cinquenta e oito, comecei minha carreira
profissional na saudosa Escola Normal, da rua Cel. Celestino.
Cheio de entusiasmo e no meio de uma elite pensante e renomada
do norte de Minas, passei a relacionar e conhecer de perto os
mais ilustres e conceituados profissionais do ensino.
Entre essas pessoas, destaco a D. Dulce Sarmento, famosa pianista,
que na ocasião, era professora e ex-diretora daquele
grande estabelecimento de ensino, onde eu ministrava minhas
aulas de Matemática, ouvindo los acordes melódicos
de seu piano e as vozes maviosas de suas alunas.
Não demorou em aparecer a sua sobrinha Clarice Sarmento,
até então desconhecida no magistério, para
auxiliá-la nas suas atividades musicais. Mocinha, loira
e delicada, que nos surpreendeu com o seu futuro brilhante no
passar do tempo. Mas, o talento de cada um é individual
e intocável, porém, não deixa de aflorar
espontaneamente, como os brotos de uma árvore viçosa.
Clarice,
com seu talento e simpatia, foi despontando e tomando o seu
devido lugar no ensino da música naquela escola. Pianista
nata e eficiente sucedeu automaticamente a sua tia Dulce Sarmento
que aposentara. Então, professora titular da Escola Normal,
transformada posteriormente na Escola Estadual ” Prof.
Plínio Ribeiro”/EEPPR, ela continuou seu trabalho.
Mais tarde, com a criação da Escola Estadual de
Artes e Música instalada naquele velho prédio,
Clarice assumiu a posição de professora e de diretora
da nova escola que posteriormente, deixou de ser unidade e,
foi transferida com o seu corpo docente para o Centro de Ciências
Humanas (CCH)/UNIMONTES, como um departamento e sob a minha
direção, ocasião em que eu fiz as acomodações
necessárias para o novo órgão e inauguração
da foto da ex-diretora Clarice na galeria dos diretores do Centro
de Ciências Humanas, onde deverá permanecer junto
aos grandes mestres do passado.
Não contentando só com suas realizações
anteriores, ela entra para o Conservatório Estadual “Lorenzo
Fernandez”/CELF, onde foi professora regente e maestrina
do coral, com desempenho surpreendente, apresentando peças
de grandes compositores, com sucesso.
Rosa Terezinha, sua ex-aluna e grande admiradora, lembra com
saudade do seu tempo no Conservatório. Naquela ocasião,
ela participou de um coral com mais ou menos cem vozes, criado
especialmente para celebrar, sob a eficiente regência
da professora Clarice, as comemorações dos quarenta
e cinco anos de existência do CELF. Foram apresentadas,
com brilhantismo, três grandes obras: “O coro dos
Peregrinos”, em alemão, de Richard WAGNER; “A
missa de SCHUBERT”, obra completa; e “Carmina Burana”,
de CARL ORFF.
Hoje,
aposentada na Escola Estadual “Prof. Plínio Ribeiro”,
que sucedeu a velha Escola Normal; na UNIMONTES e no Conservatório
Estadual “Lorenzo Fernandez”, Clarice não
cruzou os Mbraços,
tornando-se membro da Academia Montes-clarense de Letras e do
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros/IHGMC,
onde participa de suas atividades literárias, com eficiência
e zelo.
Finalmente,
podemos dizer com segurança que, Clarice é uma
cidadã que dedicou sua força de trabalho à
sociedade de Montes Claros e do Norte Minas, com esmero artístico,
profissional e amor, cumprindo sua missão com dignidade
que poderá servir de exemplo para a nossa Comunidade
e posteridade.
Lázaro
Francisco Sena
Cadeira N. 55
Patrono: João Luiz de Almeida
CABO
SANTANA, VOCÊ
CONHECE?
Quem
palmilha o centro histórico de Montes Claros, mais precisamente
atrás da igreja Matriz de São José e Nossa
Senhora, de repente depara com a rua Cabo Santana, que se estende
da rua Cel. Celestino até à praça de estacionamento
do Mercado Central, cruzando com as ruas José de Alencar
e Padre Teixeira. No seu quarteirão inicial, entre os
prédios da atual Secretaria de Cultura e do Museu Regional,
recebe o curioso e jocoso epíteto de Beco da Vaca, em
referência a um encontro nada convencional de viventes
que, num passado remoto, demandavam o piscoso rio Vieira, em
busca de suas límpidas e refrescantes águas. Para
lá desciam as diligentes lavadeiras, com suas trouxas
de roupa para lavar; de lá regressavam algumas vacas
leiteiras, após saciar a sede naquela fonte tão
acolhedora. Quando se encontram na apertada via, umas se apavoram
com os chifres e os berros das vacas, e outras se assustam com
as trouxas de roupa suja. Daí ninguém mais ficou
sabendo pra onde correr, com as mulheres perdendo suas trouxas
e as vacas subindo pelas calçadas. Bem, esta é
apenas uma das inúmeras versõesdo
episódio que enriquecem o anedotário popular.
O certo é que a presença de vaca naquele nobre
espaço da cidade, mesmo não sendo raridade para
a época, marcou definitivamente o local, pelo inusitado
de seu desfecho. Só falta mesmo colocar uma placa de
identificação naquela via, tão bem conhecida
por Beco da Vaca.
Rua Cabo Santana (Beco da Vaca)
Voltemos,
contudo, ao nosso assunto: afinal, quem foi o Cabo Santana?
Para mim, sertanejo e interiorano, a primeira ideia que surge
é de alguma homenagem a um “velho” cabo de
polícia, figura tão marcante em nossas comunidades
de outrora, como foi o sempre lembrado cabo Piloto em Montes
Claros. Nada disso: sem desmerecer o usuário da antiga
farda cáqui, que durante muito tempo exerceu a segurança
pública comunitária, a vez aqui é do uniforme
verde-oliva, do Exército brasileiro, usado honradamente
por um jovem montesclarense. Para ilustrar este texto, vejamos
o que escreveu o preclaro historiador Nelson Vianna, em sua
obra “Serões Montes-clarenses”,
publicada pela editora Itatiaia, páginas 150 e 151:
“Pelos fins da rua Padre Teixeira, na sua extremidade
oeste, ficava a famosa rua do Pinhãozeiro, de nefandas
recordações. A via pública que ali se formou,
não se sabe por que cargas d’água, recebeu
a denominação de 15 de Julho. Este nome foi substituído
pelo de Cabo Sant’Ana, em comovente solenidade realizada
a 1º de maio de 1945, em homenagem à memória
do bravo pracinha montesclarense, Geraldo Martins de Sant’Ana,
morto em combate na Itália, a 9 de novembro de 1944,
lutando em prol da Liberdade, contra as hostes do nazismo.”
Assim como o nosso historiador não sabe a razão
do nome “15 de Julho” atribuído àquela
rua, também não explicou quais foram as “nefandas
recordações”, que ficamos devendo aos nossos
leitores.
Antes de escrevermos esta crônica, visitamos a Sra. Raymunda
Cândida de Santana, de 89 anos de idade, irmã sobrevivente
do nosso personagem, residente à rua Padre Teixeira,
nº 67, no cruzamento com a própria rua Cabo Santana,
Ali conhecemos também o Sr. Thiers Antônio Penalva
Ribeiro, sobrinho de Da. Raymunda e do Cabo Santana, que nos
transmitiu valiosas informações sobre o herói
montes-clarense da 2ª Guerra Mundial, algumas delas não
citadas pelos nossos historiadores, tais como: que o nascimento
do Cabo Santana aconteceu quando a família morava na
rua Justino Câmara; que o Cabo Santana seguiu para a Itália
como voluntário, e como voluntário participou
da batalha em que foi vitimado; que a sua morte teria sido provocada
por estilhaços de granada; que a notícia do infausto
acontecimento foi trazida para a família por três
colegas sobreviventes da batalha. Da galeria de retratos e de
recordações da família na casa de Da. Raymunda,
copiamos a foto que aparece a seguir:
Cabo Geraldo Martins de Santana
Os
dados biográficos e as informações que
adiante transcrevemos foram extraídos da cópia
de um pequeno relatório elaborado e encaminhado pelo
próprio pai do Cabo Santana, escrito em uma página
datilografada, contudo sem data e sem destinatário, podendo
todavia ter sido destinado ao historiador Nélson Vianna,
no ano de 1945, pela fidelidade e semelhança constante
de suas informações no livro “Efemérides
Montes-clarenses”.
Geraldo
Martins de Santana, filho de Antônio Martins de Santana
Primo e Josefina Cândida de Santana, nasceu em Montes
Claros, no dia 29 de março de 1923.
“Fez o curso primário nas Escolas Anexas à
Escola Normal Oficial de Montes Claros, sendo muito estimado
pelos colegas, por ser reservado e bastante estudioso.”
“Em 14 de dezembro de 1935, recebia o diploma do curso
primário, não tendo continuado os estudos, porque
em Montes Claros, naquele tempo, não dispunha de um estabelecimento
de ensino que facilitasse ao pobre trabalhar e estudar.”
Diploma do Curso Primário do Cabo Santana
Consta
do relatório que, muito cedo, Geraldo Martins de Santana
manifestou grande desejo de servir à Pátria e,
aos dezessete anos, seguiu para Belo Horizonte, onde se apresentou
como voluntário para incorporar-se ao Exército,
em 05 de janeiro de 1941. Um pequeno defeito na mão direita
e o fato de não ter ainda completado 18 anos de idade
trouxeram-lhe algum embaraço para a incorporação,
contudo, em 1º de março do mesmo ano, conseguiu
ingressar no 10º Regimento de Infantaria, naquela capital.
A promoção a Cabo ocorreu em 14 de setembro de
1942. Quando o Brasil fez sua declaração de guerra,
o Cabo Santana foi transferido para o 11º Regimento de
Infantaria em São João d´El Rei, a partir
de 13 de janeiro de 1944, passando a integrar a Companhia de
Metralhadoras do 3º Batalhão. Dali foi transferido
para o 6º Regimento de Infantaria, com sede no Rio de Janeiro,
sendo incorporado à Força Expedicionária
Brasileira e seguindo para a Itália com o primeiro contingente.
Ainda, segundo o relatório, morreu nas operações
do vale do Rio Reno, no dia 9 de novembro de 1944, sendo sepultado
no cemitério americano de Vada, de onde seus restos mortais
foram trasladados, em 1945, para o cemitério militar
brasileiro de Pistoia, para jazer na quadra C, fileira 10, sepultura
117.
Na parte final do relatório, consta a seguinte observação:
“Quanto à partida do primeiro contingente para
a Itália e os combates em que o Cabo Santana tomou parte,
somente o Ministério da Guerra poderá fornecer
melhores esclarecimentos. A vida militar ele não revelava
à família, ocultando até nos últimos
momentos a partida para a Itália. Anexo, segue um retrato
do Cabo Santana e uma cópia da carta do Ministério
da Guerra comunicando a sua morte”. Em nossa pesquisa,
não encontramos a cópia da carta aqui mencionada.
É ainda o Dr. Nélson Vianna quem nos informa,
em suas “Efemérides Montes-Clarenses” que,
em janeiro de 1961, os despojos do Cabo Santana, como os de
todos os pracinhas sepultados na Itália, foram removidos
para o Monumento Nacional erguido no Rio de Janeiro.
Ao pesquisarmos sobre o Cabo Santana junto ao arquivo da Câmara
Municipal de Montes Claros, contamos com o interesse e a cortesia
dos funcionários Iara e Werley daquela casa, que não
mediram esforços para nos ajudar. Daí, foi possível
encontrar documentos produzidos durante o mandato do prefeito
Simeão Ribeiro Pires, nos quais se manifesta a intenção
de homenagear os “pracinhas” falecidos nos campos
de batalha da Europa. Senão, vejamos:
1 – Projeto de resolução, assinado pelo
vereador Robinson Crusoé de Macedo, para autorizar a
ereção de um monumento, nos seguintes termos:
“Como homenagem póstuma aos heróis expedicionários
falecidos nos campos de batalha do velho continente, fica o
senhor Prefeito Municipal autorizado a erigir um monumento em
uma de nossas praças públicas, representada com
o busto do montesclarense, Cabo Geraldo Santana.”
2 – Resolução nº 40, de 28 de dezembro
de 1959, acatando a proposta do vereador Robinson Crusoé,
assinada pelo presidente da Câmara, Dr. João Valle
Maurício, e pelo secretário, Sr. Pedro Martins
de Sant´Ana, que era irmão do homenageado.
3 – Contrato de serviço para construção
do monumento e da herma do Cabo Santana, datado de 5 de fevereiro
de 1960, assinado pelo então prefeito, Dr. Simeão
Ribeiro Pires e pelo escultor João Scuotto.
4 – Carta assinada pelo prefeito, Dr. Simeão Ribeiro,
datada de 7 de fevereiro de 1961, dirigida ao Dr. Carlos Phelinto
Prates, em Belo Horizonte, solicitando fazer contato com o escultor,
que não cumprira o contratado no prazo estabelecido e
nem dele se teve notícias até aquela data.
5 – Resposta do Dr. Carlos Prates, informando que, apesar
de sucessivas idas a seu local de trabalho, não se encontrou
com o tal escultor, e nem mesmo a família dele sabia
de seu paradeiro, concluindo ser ele um “irresponsável
incorrigível”, pela desordem que viu em sua oficina.
O Dr. Simeão ainda agradeceu ao Dr. Carlos Prates, com
quem falou sobre a adoção de medidas policiais
contra o indigitado escultor, mas nada mais encontramos sobre
o assunto. Acreditamos ter caído na “vala do esquecimento”,
pela passagem inexorável do tempo. Restanos, agora, preservar
o que ainda existe sobre a memória do Cabo Santana, não
mais em forma de pedestal ou estátua em praça
pública, mas de uma forma mais simples e objetiva, quem
sabe afixando uma placa informativa no Museu Regional, ali mesmo
na esquina da rua Cel. Celestino? Vale lembrar que o centenário
do Cabo Santana acontecerá a 29 de março de 2022.
Leonardo
Álvares da Silva Campos
Cadeira N. 97
Patrono: Urbino Vianna
Prefácio
A
‘‘Arte Rupestre na Pré-história do
Médio São Francisco”, este o título
do novo livro de Dário Teixeira Cotrim a somar em nossa
precaríssima bibliografia sobre os primórdios
do ameríndio, a qual só constava de um único
título, de 1982, “O Homem na Pré-história
do Norte de Minas”, por coincidência de nossa autoria.
O autor da nova obra, mesmo achando que desta constariam apenas
notas colacionadas em inúmeros municípios brasileiros
para um público relativamente leigo, traz a lume, na
verdade, um brilhante apanhado sobre como foi, como aconteceu
e como se vivificou a presença do homem primitivo nas
Américas, mormente em Minas Gerais e Bahia, chegando
mesmo até São Raimundo Nonato, no Piauí,
no Parque da Capivara.
Assim ele adentra também no fascinante Brasil subterrâneo,
como cavernas e abrigos aqui, ali e acolá, uma vez que
os mais antigos nativos americanos tinham sua moradia em tais
cavidades adentrando pelo subsolo, inseridas presentemente em
cursos superiores de Geologia,
na cadeira de Espeleologia (estudo de cavernas). A gênese
das nossas cavernas calcárias e um brilhante estudo de
orografia da Serra Geral vem enriquecer a nova produção
de Dário Cotrim.
As
hipóteses da chegada das primeiras levas de humanos no
continente americano são mostradas com bastante clareza,
com ênfase para a teoria mais aceita pela comunidade científica,
que foi a penetração via Estreito de Bhering,
no último período glacial, ou seja, da Ásia
para o Alasca, proeza de asiáticos ou mongoloides, isto
é, moradores que deixaram o que hoje se conhece por Mongólia
em busca de maior fartura alimentar e menor competitividade
entre grupos rivais.
Esses primeiros ameríndios, sempre irrequietos em seu
nomadismo, desceram de norte para sul, até os corredores
andinos, atingindo Minas Gerais, principalmente a região
arqueológica de Lagoa Santa, e chegando também
à região setentrional, com datações
em achados arqueológicos lá e no norte-mineiro
pelo C-14, mas nada ultrapassando treze mil anos antes da data
presente.
Já no Piauí, continua mostrando, com acerto, Dário
Teixeira Cotrim, foram levantadas datas bem mais antigas, de
50 mil anos a pouco menos de 100 mil anos antes da data presente,
o que sugere outra rota de migração humana que
não aquela via Estreito de Bhering (pelo Atlântico,
mais provável, ou por uma ponte Ásia-Austrália-Antártida-Terra
do Fogo).
E, se houve entre os mongoloides também o elemento negroide,
este recentemente notabilizado pelo crânio de Luzia, originário
de Lagoa Santa, ocorrência também registrada em
São Raimundo Nonato, é importante observar que
não se encontraram, quando do descobrimento das Américas,
índios com tal cor de pele, o que sugere que aqueles
antigos imigrantes africanos foram dizimados pelos sucessores
dos asiáticos no continente americano, provavelmente
em práticas antropofágicas.
Aliás,
diga-se de passagem, o desaparecimento de determinadas espécies
nunca foi fato incomum na pré-história. Tomemos
como melhor exemplo o hominídeo conhecido por “Australopithecus
afarensis”, para muitos paleoantropólogostido erroneamente
como ancestral do homem, mesmo possuindo esse aborígene
somente 1,15 metro de altura e tendo sido mais adaptado para
uma vida arborícola, além de ter sido dotado de
pernas com capacidade extremamente limitada para se mover a
pé.
Seu fóssil mais famoso é Lucy, uma fêmea
descoberta na Etiópia em 1974 e que conhecemos no Museu
de História Natural dos Estados Unidos, em Nova Yorque,
em 2017. Se muitos querem o “Australopithecus afarensis”
como um ser bípede, estudos recentes mostraram que Lucy
passava grande parte do seu dia, ou ao menos um terço
de sua vida, em árvores, possuindo braços fortes
o suficiente para subidas regulares em suas ramagens superiores,
ao passo que suas pernas eram relativamente fracas, não
utilizadas na escalada e ineficazes para caminhar. Outra pesquisa,
publicada em setembro
de 2016 na revista “Nature”, concluiu que Lucy morreu
ao cair de uma árvore particularmente alta, ao pular
de um galho para outro, conclusão a que se chegou ao
se analisar uma fratura óssea nos restos fossilizados
desse hominídeo.
Dito hominídeo apareceu há 3,18 milhões
de anos, enquanto o primeiro homem, o “Homo habilis”,
ostenta pouco menos na escala evolucionária, ou seja,
2,8 milhões de anos atrás. O certo é que
o “afarensis” coexistiu tanto com o “habilis”
e mesmo com o seu sucessor evolucionário, o “Homo
erectus”, cujos fósseis mais velhos são
de 1,6 milhão de anos atrás. Além de fabricar
utensílios, o “erectus” aprendeu a usar o
fogo e foi contemporâneo dos últimos “Australopithecus
afarensis” e outros hominídeos tardios, que afinal
desapareceram aí, incapazes de competir com a nossa espécie
anterior à presente, provável responsável
por sua extinção. O “Homo erectus”
– que por fim evoluiu para o “Homo sapiens”
primitivo (cujo tipo moderno somos nós) - deixou a África
rumando para a Ásia, começando efetivamente o
domínio do homem na Terra.
A obra, então, se enriquece tratando das pinturas e gravuras
rupestres em paredes sob-rocha, as ainda intrigantes sinalações
rupestres, em Minas Gerais e Bahia, carecendo ainda de uma tradução
ou compreensão por nós, ditos modernos.
O autor de “A Arte Rupestre na Pré-história
do Médio São Francisco”, demonstrando ter
estudado e aprofundado no assunto, com o seu total domínio
nas páginas do seu novo livro, traz então esses
nômades ocupantes de cavernas, caçadores e coletores,
para a vida voltada basicamente para a agricultura, ou seja,
estabelecidos em aldeias.
Como se não bastasse, vem mais para a história
antiga do Brasil, quando aqui aportou Pedro Álvares Cabral.
Osíndios que os portugueses já então encontraram
nada sabiam daquelas sinalações rupestres nem
da vida em abrigos-sob-rocha dos seus ancestrais, interessando-se
mais pelas quinquilharias que lhes davam os portugueses, como
colares e espelhos.
Muitos foram catequizados, outros escravizados, com o que o
Brasil verdadeiramente primitivo se rendeu, infelizmente, ao
modernismo genocida dos europeus, o que novamente Dário
Cotrim vai mostrando nas páginas de sua nova produção,
verdadeiro checkup da presença humana neste continente,
dos seus albores até serem desastrosamente encontrados
pelos europeus brancos que para cá vieram em galeões.
Frise-se agora que, fugindo ao lugar-comum, “A Arte Rupestre
na Pré-história do Médio São Francisco”
deixa de ser uma produção literária para
abraçar, na verdade, conotações didático-científicas,
mormente a Paleoantropologia.
E, como nos mostrará o tempo, vindo a lume, tal livro
estará, com certeza, fadado a ser festejado e aclamado
por sua riqueza de
Capa do Livro de Dário Teixeira Cotrim
abordagens
seguras, perquirições e valiosas informações
sobre nossas províncias espeleológicas e sítios
arqueológicos, somandose à bibliografia - não
só regional, como nacional e, quem sabe, internacional
-que trata do maior mistério da Terra: os primeiros tempos
do animal mais bem-sucedido, intrigante e misterioso da história
da Terra: o HOMEM!
Manoel
Messias Oliveira
Cadeira N. 60
Patrono: Jorge Tadeu Guimarães
A
SAGA DO CORONELISMO
O
coronel da Guarda Nacional, personagem proeminente do período
monárquico, patenteado pela Secretaria de Justiça
e Negócios do Estado, com poderes jurídicos, militares,
policiais e institucionais, tinha sua autoridade pavimentada
numa sociedade feudal e apoiava-se na sua milícia particular
formada de jagunços. Na sua maioria homem rude, bruto,
e violento, sem nenhuma dignidade para o cargo, mas vingativo
e capaz de mandar fuzilar quem os contrariasse. O povo era explorado
até no direito de
sonhar. De modo especial, na região do Médio São
Francisco, da qual pertencemos.
Motivado pela transição do regime monárquico
para o republicano no final do século XIX e início
do século XX, o antes e o depois, chefiava os partidos
políticos influenciando, sobremaneira, na estrutura política,
social e econômica do Brasil de então.
Apesar da instituição do regime republicado a
maioria das leis, e dos costumes vigentes na Monarquia prosseguiram
e perduraram, influenciando
a política local, durante a Primeira República.
Afinal, um regime político monárquico não
termina assim, como um jogo de futebol, com o apito de um juiz,
ou como em um filme com a palavra “fim” e as luzes
da sala se acendendo.
Nas lutas dos coronéis não havia heróis
e nem mocinhos, mas opressores e oprimidos. Os coronéis,
não obstante possuírem tanta terra e tanta riqueza,
suas ambições não tinham limites. Orgulhosos
e arrogantes matavam, torturavam, oprimiam, exigiam fidelidade
e submissão de seus agregados como condição
para viverem em seus domínios. Os agregados encarnados
nos pobres, não tinham opção a não
ser a de se submeterem aos desmandos dos tiranos.
No sertão do Médio São Francisco, a despeito
das demais regiões nacionais, os coronéis protegidos
e defendidos por jagunços, traziam os agregados sob rigoroso
controle, submetendo-os aos seus caprichos, sobretudo no tocante
às eleições partidárias. Daí,
as expressões “curral eleitoral” e “voto
de cabresto”. Os agregados eram forçados a seguir
as opções políticas do patrão, votando
nos seus candidatos, sob pena de expulsão das suas terras
e, como consequência, submetidos a uma implacável
perseguição.
Benesses para os correligionários e chicotes para os
adversários.
Naquela época, o país assistiu, então,
a uma campanha eleitoral apaixonada; não faltaram traições
nos bastidores, enfrentamento nas ruas e comícios dissolvidos
a bala.
Ainda nos presentes dias assistimos interesses egoístas
sendo colocados acima dos ideais mais nobres, que deveriam ser
cultivados com dedicação e sinceridade em benefício
de um todo social: o povo.
Na década de 1920, o país vivia o auge da política
do “Café com Leite”, com a predominância
do poder nas mãos dos paulistas, grandes produtores de
café, e dos mineiros, que produziam leite, em uma clara
evidência da força do setor agrário desses
estados.
Em
1930 Júlio Prestes de São Paulo ganhou nas urnas
a eleição para Presidente da República,
mas Getúlio Vargas venceu nas armas, não aceitou
o resultado dos votos e em menos de três semanas a República
Velha estava no chão.
O Brasil de norte a sul, com o fim da República Velha
e reconquistada a paz, batia continência para os novos
ventos que sopravam amenizando o clima hostil da Nação.
O coronelismo findou-se com o Estado Novo de Vargas, levando
o país à democratização. Não
há como negar esta verdade.
Só quem não viveu a guerra pouco festeja a paz.
Em seguida, com forte apoio popular, centralizou rapidamente
o poder, Getúlio Vargas nomeou Interventores Federais
em todos estados sob promessa de mudança nos costumes
políticos do país.
Na luta contra o extremismo político, com o orgulho desmesurado
e a ação intuitiva, o diálogo seria o melhor
caminho. Sob argumento de que não podia haver convivência
sadia e fraterna, nem o exercício responsável
da política fora do diálogo considerado a arte
do convencimento, não da imposição, por
isso humanizava e tornava os indivíduos mais tolerantes.
Existe nisso muita coisa fantasiosa. Muitas lendas que, mesmo
sem autenticidades, enaltecem o assunto. As informações
que nos foram repassadas, nem sempre são fidedignas e
na maioria equivocadas, que acabam sendo alvo de muitas especulações.
Pois bem! Acobertados sob o manto de um fantasmagórico
regime político da época dos coronéis e,
por eles, situado acima de todas e quaisquer siglas partidárias,
garimpeiros e fazendeiros se tornaram arquimilionários
com posições sociais elevadas e, em cujos apogeus,
se sustentaram por todo o tempo em que durou a República
Velha. Um poder exercido de maneira absoluta e arbitrária,
cuja tibieza moral envergonhava os homens de bem, isentos de
falcatruas. Gozavam
de um poder absoluto, mesmo porque o poder sempre foi inquestionável
numa sociedade despótica, mantido através
da opressão, por força de muito “tutu”.
Num regime que adota o despotismo, segundo Montesquieu, “somente
um governa, sem leis e sem regras”. O chefe tem como característica
ser dominador e insensível, para manter no poder arrebata
tudo sob a sua vontade e o seu capricho, não importando
os meios.
Ora! Só existe justiça onde existem leis, sendo
estas, portanto, um fenômeno social, não estando
incluída nas faculdades naturais, como acontece com nossos
sentidos ou paixões. Nesse aspecto, se a lei determinasse
muito para poucos e pouco para muitos, seria considerada justa.
Na segunda vertente, poderíamos considerar a regra: “Não
fazer aos outros, o que não queres que te façam”.
As guerras entre os coronéis tinham o seu móvel
básico na disputa pela posse de mais terras e pela conquista
do poder político. Como o Governo não conseguisse
marcar presença na vastidão do território
brasileiro, criou-se a Guarda Nacional, que passou a vender
patentes para os proprietários das fazendas. O título
mais importante na hierarquia das patentes era de “coronel”,
donde nasceu a denominação de “coronelismo”.
Já o título da Guarda Nacional, criado no Império,
conferia aos coronéis status e autoridade para controlar
a ocupação da terra e garantir apoio político
ao Imperador e, posteriormente, ao Presidente da República.
Na ausência do Poder Público, os coronéis
representavam a Justiça, a lei e a ordem.
Como dito antes, a sociedade feudal dos coronéis da Guarda
Nacional, tinha suporte na sua milícia particular formada
por jagunços, com escora na autoridade do delegado municipal
e no poder discricionário do juiz, igualmente municipal,
escolhidos e de nomeações recomendadas pelo coronel
chefe político. Este impunha
No
tempo do Coronelismo
a
“ordem” pela força da carabina, do bacamarte
e do punhal. Atraía muitos “paus-mandados”
para as suas fazendas, oferecendo-lhes espaço para cultivar
e com eles formavam um exército que era acionado, quando
atacados pelos jagunços de outros coronéis; e
eventualmente, também atacavam outros fazendeiros para
ampliar o próprio latifúndio.
A Guarda Nacional, subdividida em Batalhões de Infantaria,
resultou num verdadeiro Exército de Ocupação
de terras. O fazendeiro, chefe político, não comprava
terras, as recebia por doação das Fazendas Gerais
originárias das Sesmarias. Esse sistema vigorou com muita
força e vigor no Norte de Minas.
Tomavam posse no Batalhão da Comarca, recebia farda da
Guarda Nacional e uma espada, após jurar obediência
às autoridades civis e militares superiores. Isso dava-lhes
direito e poderes para formar uma milícia particular,
armada, para defender a si, a seus direitos e domínios.
Graciliano
Ramos, em Memórias do Cárcere, relaciona três
procedimentos criminosos, comuns naquela época: homicídio
– a vida de uma pessoa tinha pouco valor; furto de gado,
o juiz sempre absolvia o ladrão; furto de cavalos, este
não tinha perdão, o ladrão pagava com a
vida.
A Guarda Nacional foi extinta, acabaram as patentes, mas persistiu
por muito tempo o ranço do coronelismo, com ideologia
política e privilégios encantados.
Mara
Yanmar Narciso
Cadeira N. 98
Patrono: Virgílio Abreu de Paula
Quando
um ídolo vira
estrela, torna -se lenda
A
profissão de carroceiro era um grande peso para João
Faria, mas na segunda quinzena de agosto, virava rei com reinado,
capacete bordado encimado com longos penachos de pavão,
de onde partiam fitas coloridas cobrindo sua roupa branca, pelas
costas, da cabeça aos pés, e uma rainha, Nossa
Senhora do Rosário. Seu brilho não era dado por
ninguém menos que ele mesmo, catopê desde os oito
anos de idade, aos 17 se tornou Mestre do Segundo Terno de Catopês
de Nossa Senhora do Rosário. Nas Festas de Agosto, o
Mestre se desvinculava do mundo real, e flutuava alto, usando
sua crença como asas. A devoção era o que
movia aquele homem pobre em bens e rico em fé, humildade,
convicção e dom de comando, com os quais orientou
dezenas de homens dançantes durante 55 anos. Com simultâneos
modéstia e orgulho, mostrava num dos quartos da sua casa,
um quase sacrário, os instrumentos de percussão
que tinha produzido. Tocava todos, exceto o tambor.
Três raças constituíram a Nação
Brasileira: os catopês são os negros, os marujos
são os portugueses e os caboclinhos, os índios.
A
congregação dos três grupos católicos
são as Festas de Agosto, que em 2017 não foram
tão mágicas quanto as demais. O batuque aconteceu,
mas não aconteceu aquele batuque inconfundível,
que saía apenas da caixa de João Faria. Sem melindrar
os demais, que compareceram, houve um vácuo naquela apresentação
sem alegria. Estavam ressentidos com a ausência temporária
do Mestre, que, adoentado, não acompanhou o cortejo,
mas, paramentado, com a fita azul cruzada no peito, da cor do
manto de Nossa Senhora, esperou os demais na Igreja do Rosário.
Agora, há um buraco permanente. A verdadeira alma dos
catopês se foi no dia 10 de janeiro de 2018, aos 74 anos.
Partiu o grande artista do ritmo, o pai de todos, aquele catopê
tradicional por natureza e devoto convicto das suas tradições
religiosas. Adaptou-se o quanto pôde, pacientemente administrou
os flashes, a TV e as interpretações. Estudiosos
e curiosos explicavam aos catopês o que eles representavam,
desde a 1ª festa documentada em 23 de maio de 1838, há
quase 180 anos.
João Faria, o imortalizado Mestre Catopê foi selo
dos Correios, assunto de matérias jornalísticas,
capa de revista, presença em diversos vídeos,
cuja imagem era a assinatura da festa. Era alguém que
se expressava verbalmente de forma pouco clara, e sua comunicação
natural, para a qual não encontrava páreo, era
a música, o canto, o ritmo, a dança, a organização,
a confecção dos instrumentos. Seu som invocava
toda a magia do sagrado, levando a multidão para seu
mundo irreal. Quando vivo, seus comandados lhe devotavam admiração
e respeito cegos, seja na presença ou na ausência
do seu guia. Agora, seu neto Yuri Farias Cardoso, de 18 anos,
assumirá o posto do avô. No ano passado cumpriu
esse papel, agora, lamentavelmente, será em caráter
definitivo.
- “A cultura montes-clarense, agora, padece com a partida
do Mestre João Faria, um catopê de ritmo marcante,
inigualável.” (Wagner Gomes no perfil da sua mãe
Maria das Dores Guimarães Gomes).
-
“Grande Mestre João Faria, as Festas de Agosto
ficarão mais silenciosas sem o som da sua caixa e sem
a alegria contagiante do seu Mestre. Que os anjos e Nossa Senhora
do Rosário o recebam com grande festejo.” (Solon
Queiroz)
- “Figura emblemática das Festas de Agosto. Fará
falta. Siga em paz, Mestre!” (Terezinha Lígia Fróis)
- “Viva João Faria na Pátria Espiritual!
Por aqui se cala mais um tamboril e ficamos mais pobres de catopês.
Vá em paz irmão. Você cumpriu bonito seu
papel. Que Nossa Senhora do Rosário te receba com amor
e carinho.” (Tino Gomes)
- “Mestre João Faria, agradecemos por nos ensinar
que a alegria e a força de um povo estão em suas
raízes culturais.” (Raquel Souto Chaves)
- “Mestre João Faria era o catopê original,
de raiz. Tive a alegria de conviver com ele e desfrutar de sua
sabedoria. Era uma pessoa simples e não reclamava de
nada.” (Pedro Ferreira)
O pior não é a morte, e sim defunto sem choro.
Estamos calados, murchos, sem percussão, sem voz. Ficamos
mudos, mas conformados com as homenagens tocantes dos seus pares,
especialmente comovidos com o adeus no cemitério e os
lamentos das caixas. João Faria tem sido regiamente pranteado.
É pouco, mas consola.
Maria
da Glória Caxito Mameluque
Cadeira N. 40
Patrono: Dr. Georgino Jorge de Souza
LAR
DAS VELHINHAS
CENTRO FEMININO DE LONGA
PERMANÊNCIA
Em
07 de março de 1911, pela bula Comissum Humilitati Nostrae,
de São Pio X, foi nomeado Bispo da nova Diocese de Montes
Claros, Dom João Antônio Pimenta e em 07 de outubro
do mesmo ano o novo Bispo chegava solenemente à nova
cidade episcopal. O primeiro Bispo da Diocese reforçou
o clero diocesano com a entrada de 13 sacerdotes e em 1914 mandou
construir o Palácio Diocesano, projetou e deu início
às obras da nova Catedral.
Dom João morreu com 83 anos e está sepultado na
cripta da Catedral Metropolitana Nossa Senhora Aparecida de
Montes Claros.
E foi durante o episcopado de Dom João Antônio
Pimenta que foi criada em 1923 a Associação das
Damas de Caridade que tinha como finalidade “Assistir
com socorros espirituais e materiais a todos os doentes, pobres
desvalidos, especialmente órfãos e viúvas,
visitas às famílias pobres, auxílio à
pobreza envergonhada e a prática de qualquer outra obra
de caridade.
COMO
COMEÇOU
Motivado por um nobre ideal, o Cônego Marcus Van-In, da
Ordem dos Premonstatenses comprou um terreno onde se encontra
o atual Centro Feminino de Longa Permanência (Lar das
velhinhas), cuja escritura consta de 23 de abril de 1923, data
de sua fundação, que foi entregue à Igreja
para ser administrado. Esta o entregou a um grupo de senhoras,
passando a constituir uma associação denominada
Associação das Damas de caridade de Montes Claros,
com o nome de fantasia “Casa das Pobres”, hoje “Lar
das velhinhas”. A primeira diretoria foi eleita conforme
o estatuto, em 30 de dezembro de 1923, sendo composta por: Dom
João Antônio Pimenta, Bispo de Montes Claros; Dona
Maria Idalina Prates, Dona Júlia dos Anjos e Dona Eponina
Pimenta.
Desde sua fundação recebe senhoras desamparadas,
ou que não têm condições de viver
por si, ou que suas famílias, por diversas circunstâncias
não podem mais arcar com um bom tratamento, quer humano,
quer financeiro, ou que devido ao peso da idade, não
permite mais que vivam em suas casas.
Todas as diretorias que assumiram esta obra, vestiram a camisa,
enfrentando obstáculos, vencendo barreiras, superando
dificuldades, cada uma no seu tempo e com seus méritos.
Com muito sacrifício construíram uns barracões
muito simples, onde abrigaram as primeiras assistidas que se
sentiram muito bem acolhidas. Hoje, com o passar do tempo, os
barracões foram substituídos por dependências
um pouco mais acolhedoras, embora simples. Sempre houve a participação
da comunidade e voluntários. As próprias asiladas
faziam todos os tipos de serviço da casa: cozinhavam,
lavavam, faziam a limpeza, cuidavam das doentes, fazendo o que
podiam, como: chás, curativos a seu modo, banhos, davam
comida àquelas que não podiam comer sozinhas.
No começo, não haviam asiladas que recebessem
aposentadorias ou amparo social e viviam dos esforços
das damas de caridade e da comunidade.
Com o passar dos tempos se organizaram melhor, elegeram uma
provedora que se encarregava de procurar entre amigos e autoridades,
os recursos que conseguia angariar: Dona Flora Pires Ramos.
Certa vez, dona Flora foi a Belo Horizonte pedir ajuda a um
deputado (seu irmão Teófilo Pires), que lhe deu
um cheque de 500 contos. Agradeceu e saiu debaixo de forte chuva.
No caminho se deu conta que perdeu o cheque e voltou pelo mesmo
caminho, aflita em busca do mesmo. Com alegria o encontrou levado
pela enxurrada enlameado e sujo. Que fazer? Voltou e procurou
o mesmo deputado, que trocou o cheque sujo por outro. Com alegria
voltou para casa com sua missão cumprida.
ATUALMENTE
A instituição é entidade jurídica,
com CNPJ próprio e com os registros exigidos por lei,
inscrita no Ministério de Ação Social.
Possui uma diretoria, modelo de dedicação em todos
os sentidos, visando proporcionar melhorar a qualidade de vida
das internas. Conta com uma coordenadora de enfermagem, 04 técnicas
de enfermagem, 09 funcionárias que atendem todos os setores
da casa. Há ainda uma geriatra, um fisioterapeuta e algumas
parcerias.
O colégio Indyu disponibiliza os estagiários do
curso técnico de enfermagem, em número suficiente
para fazer todos os cuidados, orientados por uma supervisora
que coordena os estágios. E a FUNORTE oferece os alunos
do curso superior de Enfermagem.
Outras entidades também colaboram com a entidade e voluntários,
trazendo sua ajuda. Outros trazem para elas o lazer, como: festinhas,
palhaços, danças, músicas, etc. Tudo isto
é recebido com muita satisfação. Foram
dirigentes dessa entidade as seguintes pessoas:
- Maria Idalina Prates =
- Theodolinda Pimenta de Carvalho =
-
Flora Pires Ramos = 1963; 1967; 1987; 1988
- Maria Aparecida Carvalho = 1968 a 1970
- Maria de Castro Macedo Chaves = 1971 a 1983
- Maria do Carmo Barroca Peres = 1984 a 1987
(renúncia do cargo em 10/1987)
- Flora Pires Ramos = 1987 a 1988
- Maria das Mercês Paixão Guedes = 1988 a 1989
- Maria Lúcia Veloso Maia Sidônio = 1994 a 2008
OBS: Há datas obscuras devido a falta de registro escritos,
porém é provado testemunhalmente que a Da. Flora
sempre esteve à frente do comando da casa nos períodos
em que não foi presidente, atuando como provedora até
se afastar em definitivo na gestão de Maria das Mercês
Paixão Guedes.
NOVA DIRETORIA (ATUAL)
Eleita em 25 de junho de 2016
Presidente: Celso Ciriaco dos Santos
Vice-presidente: Jaqueline da Conceição Camelo
1ª Tesoureira :Suely Eleutério do Couto
2º Tesoureiro: Sérgio Henrique Sousa
1ª Secretária: Jane Brandão Portugal
2ª Secretária : Zamara da Natividade Dias Maia
Assistente Jurídico : Gualther André Fonseca Mendonça
Assistente Administrativo Erik Ferreira de Abreu
Assistente de Promoções Sociais: Letícia
Veloso Sidônio
DADOS JURÍDICOS DO CENTRO FEMININO DE LONGA PERMANÊNCIA
-Utilidade Pública:
-
Municipal: Resolução nº 232, de 22/09/1976,
da Câmara
Municipal de Montes claros, substituída pela Lei Municipal
nº 2.259,
de 18/04/1995.
- Estadual: Lei nº 20.719, de 14/06/2013
Inscrito no CMAS ( Conselho Municipal de Assistência Social)
sob o nº 003/2011, de 07/04/2011.
Inscrita regularmente no CMI ( Conselho Municipal do Idoso)
OBS: 1- A 2º grande reforma física da instituição
se deu a partir de 2008 quando houve ampliação
da enfermaria e construção de nova lavandeira
com implantação de maquinários modernos
e reforma e adequação das demais instalações
de acordo com normas e exigências da Vigilância
Sanitária, Corpo de Bombeiros e Estatuto do Idoso; Confecção
do poço artesiano e nova rede hidráulica; implantação
de rede elétrica trifásica e renovação
de toda a rede interna.
Tudo foi possível graças a parceria incondicional
da comunidade em geral e da generosidade de alguns empresários
e veículos de comunicação da cidade.
Uma grande força que tem ajudado sobremaneira na interação
entre instituição e comunidade foi a criação
do serviço de telemarketing em setembro de 2012 e que
continua dando frutos até os dias de hoje.
CURIOSIDADE: Em toda a existência da
instituição criada em 08/12/1922, pela 1º
vez em sua história passou a ser presidida por um homem
a partir de 2008 quando Celso assumiu a gestão.
Acreditamos que muitos fatos da história podem deixar
de ter sido narrados, no decorrer desses 95 anos de existência,
por insuficiência de fontes.
Mas o que foi possível resgatar encontra-se hoje no livro
; “Lar das Velhinhas” – Uma história
de amor.
Reconhecemos que é muito pouco diante da grandiosidade
do Lar das Velhinhas, hoje “Centro de Longa Permanência”
instalado em 1922
numa casa simples, numa estrutura precária. Venceu desafios
contando sempre com a dedicação de várias
pessoas e hoje, abriga mais de 70 idosas, com instalações
confortáveis, o que torna o Lar um ambiente agradável
de se viver.
Preservar memórias é muito importante.
O que se registra aqui,
mesmo de forma singela, resgata informações que
com o decorrer do
tempo poderiam se perder.
Maria
de Lourdes Chaves
Cadeira N. 65
Patrono: José Gonçalves de Ulhôa
O
BARDO “LOLA CHAVES”
HISTORINHA SERESTEIRA
Conforme
Certidão de Óbito do senhor Manoel da Silva Reis,
fornecida pelo Serviço do Registro Civil da Comarca de
Montes Claros-MG, o citado acima nasceu no distrito de Rio Preto,
município de Diamantina-MG, era telegrafista, filho de
Manoel da Silva Reis e Antônia Augusta da Silva. Ele faleceu
aos 44 anos de idade, no dia 16 de julho de 1908, às
23h30, na casa do senhor Ramiro de Paula Costa, em Montes Claros-MG,
de causa
ignorada. Foi sepultado no cemitério de Montes Claros-MG.
Não consta o nome do médico que atestou o óbito.
Era casado com Dona Francisca Leopoldina da Silva. Deixou os
filhos legítimos: Othon da Silva Reis, com 23 anos de
idade, e Manoel da Silva Reis Júnior, com 19 anos de
idade. Pelos cálculos feitos, o “de cujus”
nasceu em 1864.
Quem foi este cidadão na ordem das cousas?
Ele era um seresteiro, tocava violão e cantava. Era companheiro
de seresta de João Chaves, sendo o último mais
novo 21 anos.
Um
dia, eles combinaram:
- Se eu morrer primeiro, você, João, fará
uma serenata em meu túmulo. Se você morrer primeiro,
farei uma serenata no seu túmulo.
Silva Reis morreu primeiro, como narrei acima, em 1908. João
Chaves faleceu aos 11 de maio de 1970.
Algum tempo depois da morte do amigo, João Chaves fez
a letra e música de “Adeus”, que o povo chama
de “Bardo”. Ela fala do seresteiro que cantava para
as estrelas, porque Silva Reis gostava de cantar deitado, com
o violão no peito, olhando as estrelas.
A promessa entre os companheiros foi cumprida numa noite, provavelmente
de lua cheia. João Chaves e seus companheiros fizeram
a mais inusitada serenata, no túmulo do cantor e violonista,
o amigo Silva Reis, cantando a modinha “Adeus”.
Grupo de Seresta Lola Chaves.
Marilene
Veloso Tófolo
Cadeira N. 95
Patrono: Terezinha Vasquez
MIRABELA
No
velho casarão na vizinha cidade chamada Mirabela, cidade
no Norte de Minas, próxima à Montes Claros, moravam
os meus avós maternos. A viagem à esta cidade,
que chamava a época que me refiro, Bela Vista, é
hoje uma gravura apagada no tempo! Procuro na memória,
a paisagem da estrada, o vento que sibilava por lá e
nós dentro do verde Jeep, deixávamos um rastro
de poeira. Como era longa a viagem, verdes paisagens, animais
no pasto e chegávamos ao destino. Procuro no quadro da
memória os rostos dos avós, debruçados
à janela, olhando o tempo, a cadeira de balanço,
o fogão de lenha, as frutas no quintal e o caldo de cana
do engenho. O cheiro da cana leva-me ao rio, a paisagem, ao
curral, as altas portas do casarão, à figura do
vovô e da vovó, de neném e do engenho movido
por bois. Quadros que vêm à memória, passado
que não volta mais, onde as preocupações
eram outras, as competições, as festas tinham
sabor de infância.
Hoje ao toque do sino, ao rever o lugar que não mais
existe, parece um sonho distante, onde o progresso levou estes
sonhos que dormem
esquecidos no nosso coração! Uma cidade, uma casa,
um retrato não representam, a memória, o sonho
e a saudade de quem tenta voltar ao passado.
BELA VISTA
Bela Vista tornou-se Mirabela,
cidade pacata, clima frio,
as pessoas perdidas no tempo,
areia, vento, olhares vazios...
O
tempo não passa, um ar desolado
de alguém que não tem pressa no andar,
olha para o lado, fuma o seu cigarro,
coloca o chapéu na cabeça!...
Porque
a pressa se a vaca muge ao longe,
o burro empaca na esquina,
a mulher amarra o pano na cabeça,
a criança joga bola na calçada!
As
pessoas reúnem-se nos bares,
falam do último negócio,
no preço do bar, da vaca, da carestia
e no derradeiro escândalo da vizinha.
Por
que a pressa? Os passos são devagar.
O dia corre lento, ninguém anda apressado,
e a cidade dorme, embalada pelo tempo,
que teima em não passar!...
Letargia,
saudade, preguiça e vontade de cantar,
festejar e dançar na Festa do Divino,
fazer política nas calçadas da rua,
e ver o tempo passar...
Olhar
ao longe, a casa já não existe,
a praça já não é a mesma,
o vovô e a vovó dormem no silêncio
de um tempo que não volta mais!...
Mirabela
tornou-se uma imagem na parede,
o relógio não toca, os ponteiros estão
parados,
os risos, os comícios, as brincadeiras na praça,
até o engenho parou de moer...
Olho
a Igreja que era a vida de cidade,
a praça bem cuidada, sinto o vento da manhã,
mas o encanto quebrou-se,
nada lembra a cidade de ontem!...
Casas,
paredes, ruas e praças,
restos de materiais de um passado,
com outros rostos, outros personagens,
que não preenchem minha busca de hoje!
Mirabela
-
No velho casarão na vizinha cidade chamada Mirabela,
cidade no Norte de Minas, próxima à Montes Claros,
moravam os meus avós maternos.
A viagem à esta cidade, que chamava a época que
me refiro, Bela Vista, é hoje uma gravura apagada no
tempo!...
Procuro na memória, a paisagem da estrada, o vento que
sibilava por lá e nós dentro do verde Jeep, deixávamos
um rastro de poeira...
Como era longa a viagem, verdes paisagens, animais no pasto
e chegávamos ao destino.
Procuro no quadro da memória os rostos dos avós,
debruçados à janela, olhando o tempo, a cadeira
de balanço, o fogão de lenha, as frutas no quintal
e o caldo de cana do engenho...
O cheiro da cana leva-me ao rio, a paisagem, ao curral, as altas
portas do casarão, à figura do vovô e da
vovó, de neném e do engenho movido por bois. Quadros
que vêem à memória, passado que não
volta mais, onde as preocupações eram outras,
as competições, as festas tinham sabor de infância.
Hoje ao toque do sino, ao rever o lugar que não mais
existe, parece um sonho distante, onde o progresso levou estes
sonhos que dormem esquecidos no nosso coração!...
Uma cidade, uma casa, um retrato não representam, a memória,
o sonho e a saudade de quem tenta voltar ao passado.
03 de março de 2018.
O GIRAMUNDO
O Jornal de Montes Claros noticia a morte de um homem que aqui
chegou, em sua bicicleta, com seus pertences e um diário
a bordo. Percorreu o Brasil por vários estados e foi
anotando sua vida!...
Quem
é ele? De onde veio e o que fez levar esta vida? Tudo
organizado e explicado na sua escrita, a história de
várias cidades e estradas, e foi internado em um hospital
da cidade, onde faleceu...
Não se sabe da sua família, da sua gente e o que
restou foi este diário... O que faz a pessoa ser um andarilho?
Percorrer o mundo e sempre seguir a diante?...
A vida do andarilho chegou ao fim, em uma cidade desconhecida
e tratado em um hospital da cidade e espera-se notícias
da família!...
É um desconhecido, um errante, alguém que correu
o mundo e foi-se com o vento, com o tempo e o amanhecer...
Só, sem amigos, sem parentes, sem alguém para
protegê-lo, morre em uma cidade desconhecida, sem lenço
nem documento, e parte para o desconhecido, como alguém
sem passaporte, sem registro, sem lágrimas, sem saudades...
Foi-se com o vento, com a chuva, com o sol, como alguém
que vai com a poeira do tempo.
Giramundo, o que o levou a percorrer o mundo, a procurar amigos,
a viver uma vida ao desconhecido, sem objetivos, afetos, esperanças
e morrer em uma rua desconhecida na cidade de Montes Claros.
Não deixou seu rastro na poeira do tempo, no desconhecido
de uma cidade do interior, sem passaporte, apenas tombou em
uma rua qualquer, onde não viveu, não conheceu
ninguém, e confundiu-se com a poeira do tempo!...
Narciso
Gonçalves Dias
Cadeira N. 9
Patrono: Antônio Lafetá Rebello
TERRA
DA CRIATIVIDADE
Ah
meu amigo, você não tem noção do
enorme tamanho da criatividade do povo deste maravilhoso Norte
de Minas. Observe nossa culinária, com pratos variados
e de sabores divinos. Pois é onde o rabo do boi, que
embora sendo muito duro e esquisito por natureza, nas mãos
de nossas hábeis cozinheiras se transforma num prato
rico, saboroso e de aspecto sensacional. Também foi aqui
que se criou e difundiu a ousadia de juntar o frango com quiabo,
maxixe com carne de sol e a transformação desses
e outros experimentos duvidosos em um sucesso absoluto no Brasil.
O número de pratos diferentes com o pequi já passa
da casa da centena. A riqueza desse fruto da nossa culinária,
que exala um perfume inebriante e seu peculiar sabor forte e
característico, é o recado que as famílias
passam de quem tem bom gosto e sabem ousar no preparo da iguaria.
Muitos de nossos intelectuais já o utilizaram como tema
de tese de doutorado. E muito mais ainda há para se contar
dessa planta mais do que amiga do sertanejo. Motivado por esses
pratos bonitos de se ver e gostosos de comer é que o
verdadeiro Norte-mineiro come primeiro
com os olhos, apreciando cada ângulo da obra de arte no
prato, só depois ele parte para a mastigação.
Também a arte das rezadeiras, benzedeiras e raizeiras
da nossa região que acumulam em si a toda a grandiosidade
da fé e boas energias, transmitidas para as outras pessoas,
no seu ofício de minimizar os sofrimentos e cura dos
seus semelhantes. Diante de enfermidades diagnosticadas e tratadas
por elas, tais como:
Espinhela-caída: Que é uma forte dor na “boca
do estômago”, resultando em um cansaço anormal,
perda de apetite e insônia.
Quebranto: Que tem origem no mal olhado de pessoas que carregam
muita energia negativa.
Erisipela: Que vem a contagiosa, ser uma doença infecciosa,
não mas que provoca vermelhidão, inflamação
e muita dor na pele. Dentre inúmeros outros males que
acomete o nosso simples sertanejo, mas que sabe onde e como
se curar.
As famosas palavras: “Com dois te puseram, com três
eu te tiro. Com as bênçãos das três
pessoas da Santíssima Trindade, que tira quebranto e
mau-olhado, pras ondas do mar sagrado, pra nunca mais retornar”.
Registra-se o prefixo de que ali vai começar um grandioso
trabalho de amor para com o próximo.
Em conversa com uma dessas benfeitoras da humanidade, fiquei
sabendo que ela já está atendendo as pessoas necessitadas,
por celular. E a consulta telefônica apresenta êxito
garantido nos trabalhos efetuados tal e qual a consulta presencial.
Mas o que mais me impressiona é a capacidade criativa
do nosso povo na área da linguística, com uma
facilidade incrível no desenvolvimento de neologismos.
Na semana passada, em conversa com uma vizinha, ela me disse
que sua filha Aparecida, a quem ela chama de “Priscida”,
estava com “Estreque modômi”.
Pequi: fruto do cerrado.
Não
me contive de curiosidade e perguntei a ela o significado de
tal expressão. Ela gentilmente me explicou, não
sem antes demonstrar um certo ar de compaixão diante
da minha ignorância:
_ Uai, “estreque modômi” é quando uma
pessoa fica muito tempo sem fazer sexo. E trocando em miúdos,
é o tal do estresse por falta de contato com o parceiro.
E viva a criatividade do Nortemineiro.
Wanderlino
Arruda
Cadeira N. 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
O
livro “Reflexões ” de
Marcelo Freitas
Não
é no silêncio que os homens se fazem,
mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.
Paulo Freire
De
uma coisa tenho certeza: para sermos úteis à pátria,
às instituições, à família,
à nossa profissão e até a nós mesmos
como pessoas, temos de fazer parte de uma sociedade sempre se
transformando, sempre em mudança. Ou participamos de
quase tudo em tempo atual ou perderemos o trem da história.
Somos cidadãos do tempo no mundo e do mundo no tempo,
e a marca do nosso viver e conviver tem que ser registrada,
seja em papel, seja em lembranças. Passagem inútil
pela vida é que não pode acontecer. E é
partindo dessas ideias, que inicio este Prefácio sobre
o magnífico livro do doutor Marcelo Eduardo Freitas,
mestre do Direito, historiador, cronista, doutorando na Argentina,
homem da lei e dos bons procedimentos no Brasil. Dele e sobre
ele, venho de muitas leituras, muitas anotações,
uma minuciosa análise de sua cultura e dos muitos viveres.
Tudo como apreciador de suas lutas e labutas de menino nascido
em ambiente interiorano, assim como em literal ocupação
de espaços no magistério e na Polícia Federal,
em todo o tempo um estudioso.
O livro “Reflexões”, composto de quase oitenta
textos, é um harmonioso compêndio literário
– maioria de crônicas – cada linha elaborada
com esmero de quem sabe o que quer e a que veio. Tudo, como
indica o título, bem refletido, pesado e medido, sempre
marcante em tempo/espaço mais do que importante na vida
brasileira. Tudo fruto de leituras, estudos, pesquisas, observações
e vivências, um universo de conhecimentos objetivos, mesmo
nas experiências com familiares e com os colegas de escola
e de trabalho. O doutor Marcelo Freitas é um perfeito
resumo dos valores fundamentais do ensinoaprendizagem: saber,
saber fazer e querer fazer. Melhor dizendo, tem
um elogiável nível de informações
e conhecimentos. Sabe lidar, no dia-a-dia, com o máximo
de eficiência e dispõe, no pouco e no muito, de
um reconhecido poder de vontade e de decisão. Um sonhador
de pés no chão, plantado em realidades palpáveis
do muito agora e de um tanto do amanhã.
Voltando diretamente para o Prefácio, justo é
dizer que a leitura e a apreciação das imagens
marcaram-me agradabilíssimos momentos, todos eles constituídos
de uma riqueza digna de consideração: registros
históricos, conceitos filosóficos, marcação
literária, entrelaçamento familiar, experiências
profissionais, motivação ética. Muitas
as alegrias, duradoura satisfação, continuado
o desejo sincero e didático para a aplicação
das leis e dos bons costumes. Vejo no doutor Marcelo uma compreensível
busca de atendimento às inteligências múltiplas,
assim como uma vinculação clara aos valores do
emocional e do espiritual, muito mais vivências e certezas
que de possíveis teorias. Para dar leveza ao início
de escrita e leitura, suas atribuições ao poético
de Renato Russo, às lembranças de familiares,
ao aconchego das experiências de infância, o muito
de filosófico da vida e da morte. As citações
caminham
da sabedoria de Salomão a Santo Agostinho, de Da Vinci
a Kant, até chegar ao tio mais querido, José Admilson,
ao quase santo Chico Xavier e ao moderno Aguinaldo Silva, grande
sucesso da Tevê e do cinema. Um leitor atento poderá
alcançar tudo de positivo dos conceitos e das suas tendências
pessoais e profissionais. Em sentido prático, vale lembrar
o poeta Camões, que bem expressou no Canto X dos Lusíadas:
“Não se aprende, Senhor, na fantasia, / Sonhando,
imaginando ou estudando, / Senão vendo tratando e pelejando”.
Que bom eu ter lido com muita calma o primoroso texto de Marcelo
Eduardo Freitas! Que bom eu ter sido um minerador em tantas
bateias, tentando ver e buscar as pepitas do ouro da inteligência
de um escritor ainda tão jovem! Foi algo diferente do
que tenho feito em autores mais próximos, no dia-a-dia
acadêmico, na redação dos jornais ou mesmo
no trato didático-pedagógico das escolas e das
muitas instituições a que sou ligado. Em verdade,
uma coisa é o conhecimento de leitura jornalística,
outra da conversa olho no olho, como a que tivemos em meu escritório,
quando ele me trouxe o livro e explicou detalhes da escrita,
conhecimento e reconhecimento sinceros. Foi um momento de muito
interesse, que valeu por uma curiosa pré-leitura, além
de uma visão do ser e do viver, quando me lembrei perfeitamente
de algo refletido por Sartre: “O que fizeste com o que
te fizeram?” Ou seja, o que as profissões do doutor
Marcelo – no Supremo, na Polícia Federal e no magistério
- fizeram dele? Nos dizeres do sábio Ortega y Gasset,
cada pessoa é ela mesma e as suas circunstâncias,
uma boa razão para sermos o que somos.
Meu pedido aos que vão ler “Reflexões”:
reparem bem em todas as fontes de leituras e de pesquisas, em
todas as citações, nos elementos históricos
e geográficos, nos aspectos jurídicos, nas informações
estatísticas, nas ilações políticas,
no emocional de família, e no próprio conjunto
de opiniões, fruto da viva experiência do autor.
Nunca me esqueço de um discurso do general Eisenhower,
na Inglaterra do pós-guerra: “Não foram
os exércitos, foi o planejamento o
motivo da vitória”. E hoje, diante do livro do
doutor Marcelo, posso dizer que o motivo maior do êxito
de suas produções literárias é a
sua organização, seu modo de planejar, uma ordenação
perfeita, com visível lógica e sentido de urgência,
além das pressões desafiantes pelas ideias de
cada momento. Um texto criativo do crer e do agir, sempre caminho,
nunca pousada, porque no viajar é que está a emoção,
principalmente quando o caminhante tem talento, noções
de destino e sabe para onde deve e pode se dirigir. Doutor Marcelo
tem na palavra e na mensagem, o veículo do seu objetivo:
a pátria acima de tudo. E para isso: melhor tratar, cuidar,
educar, criar, dirigir, liderar, lidar com pessoas, servir!
Elemento importante no decorrer dos textos é o toque
da fé valorizada pelo conhecimento, a busca da inteligência
bíblica, o progresso do pensamento filosófico,
a firmeza com o trato político, um humanismo natural
para valorizar indivíduos e sociedade. Em todo o livro,
a primazia é da seriedade, do saber, da ética
e da moral. Deus é perfeito e o homem sendo imagem de
Deus, também tem que buscar a perfeição.
Como é mais seguro escrever do que falar, é na
escrita que deve estar a defesa dos direitos humanos, o zelo
pela infância e pela juventude, o carinho pelos idosos
e, tanto quanto desejada, a valorização da mulher.
Tudo isso em todas as situações e em todos os
setores. Claro que nenhum direito sem uma obrigação
correspondente. Afinal, não só a imagem, um exemplo
tem que valer por mil palavras, algo assim como sintetizou Fernando
Pessoa: “tudo vale a pena quando a vida não pequena”.
No meu pensar, “Reflexões” deve ser lido
não só como forma de bom gosto e prazer, mas como
um compêndio de preciosos ensinamentos, inclusive de uma
segura correção gramatical e semântica.
Somos e precisamos ser um pouco de tudo que lemos, algo do melhor
que chega aos nossos olhos.
Para
isso, o livro do doutor Marcelo Freitas apresenta-nos como um
verdadeiro e almejado presente. Melhor para ele, melhor para
todos nós, seus leitores!
Montes Claros, Verão de 2017.
Virgínia
Abreu de Paula
Cadeira N. 99
Patrono: Waldemar Versiani dos Anjos
CRISE
DE SAUDADE NUMA
TARDE DE CHUVA
Tarde
de sábado. Saio de casa com Luciana rumo ao supermercado
para a feira semanal. O sol brilha e o calor é sufocante.
De repente começa a chover! Chuva forte e inesperada.
O jeito é nos escondermos sob a marquise da Bomboniére
Nacional. Luciana quer seguir assim mesmo e quase concordo,
mas a chuva agora desaba para valer. Ficamos ali sentindo a
mudança da temperatura, apreciando os tipos humanos que
passam correndo, e os carros que entram nas poças já
formadas espalhando água que respingam sobre nós.
Então alguém se dirige a mim. –“Ei!
Ô Dona! Ei!” A voz vem de um senhor bem trajado,
terno preto e gravata. Completamente embriagado. Está
parado na porta do bar Tip Top. –“Como você
sai neste temporal com sua filha?” Penso em dizer que
Luciana não é minha filha, mas desisto. Ele mal
pode ficar em pé. Conversar com ele seria perder meu
tempo. Muda logo de assunto. –“Está vendo
este hotel aí?” É o Santa Cruz no lado oposto.
–“Não é o Santa Cruz que eu conheci”,
prossegue ele. –“Hoje é um hotel ordinário.
Acabado”. Fala pausadamente com aquela voz típica
de bêbado, sílaba pôr sílaba.
Olho
para frente e percebo as mudanças. Cadê a sala
de recepção? No seu lugar está uma vitrine
de loja. Ao lado vejo uma porta estreita que leva a uma escada
íngreme e escura. O bêbado continua o seu protesto
e eu tenho de dizer sim com a cabeça. “Houve um
tempo que aí tinha até restaurante...”,
diz ele. E então, de certa forma, volto no tempo...
Eu pequena, quatro anos, morando ali pertinho na Simeão
Ribeiro. Valéria, minha irmã mais velha, com seus
dez anos sempre brincava no Santa Cruz com Fátima, a
filha adotiva de Dona Taúde e Seu Pinheiro, donos do
hotel. Algumas vezes me levava com ela. Tudo tão “chique”
aos meus olhos de criança! Os hóspedes chegando,
a sala da entrada, e o delicioso aroma vindo do restaurante
que servia pastéis feitos pôr vovó Lica.
Encantava-me ver as mesas postas, as toalhas brancas, um biombo,
um piano... Claro que nunca foi um cinco estrelas. Talvez nem
duas estrelas. Mas havia alguma coisa de aconchegante, de “cidade
grande”, que me levava a querer almoçar ali um
dia, o que nunca aconteceu. Lá de casa, em certas noites
de lua, podíamos ouvir os viajantes que cantavam ao som
do violão. Montes Claros, sem luz elétrica, em
não raras noites, convidava à serenata. Isto envolvia
o hotel numa aura romântica inesquecível.
Na minha adolescência, em 1963, em janeiro para ser bem
precisa, apaixonei-me por um jovem paulista também chegado
a serenatas ao violão. E mais do que nunca aquele hotel
pareceu-me mágico. Muitas vezes passei pela sua porta
na esperança de vê-lo. Olhava as sacadas, como
Romeu esperando por Julieta, só que ao contrário.
Apreciava tudo. A arquitetura, os móveis, o seu tamanho...
Parecia-me imenso ocupando todo o quarteirão.
Vou para o final do mesmo ano quando estive numa sessão
de fotos naquela sala com o colunista Lazinho Pimenta. Tento
lembrar o motivo daquele encontro social ali. As debutantes?
Mas eu nunca debutei!
Brotos do Ano? Alguma coisa assim. Não consigo ter certeza.
Porém lembro com clareza o que sentia. Encabulada, deslocada...
E ao mesmo tempo achando “ o máximo”.
O paulista – Ricardo - desapareceu no tempo deixando para
traz apenas meu coração partido e solitário.
E a sala da entrada, por onde o vi entrando certa tarde carregando
o violão sem deixar de presentear-me com um luminoso
sorriso, é apenas mais uma loja de calçados. E
não é que o restaurante também virou sapataria?
Confesso não conhecer o hotel de hoje por dentro. Talvez
até seja melhor, com mais conforto, pois o de então
nem tinha apartamentos. Classificálo como “ordinário”
sem duvida é exagero do “Carlitos” do sertão.
“Mamãe está vindo!” É Luciana
quem me traz de volta ao presente. Sua verdadeira mãe,
como toda mãe que se preza, está vindo em nosso
socorro trazendo sombrinhas.
Agora podemos finalmente ir para o supermercado caminhando na
rua molhada, sombrinhas abertas na tarde refrescada. E o bêbado?
Quando saímos ele ainda ali se encontra cambaleante e
inconformado com as tristes mudanças que o tempo costuma
trazer. Ouço sua voz repetindo para o nada. “Não
é mais o Santa Cruz que eu conheci”.
Pedro
Ribeiro Neto
Associado Honorário
A
Gráfica Editora Millennium apresenta o novo
livro de Dário Teixeira Cotrim: “A Arte Rupestre
na pré-história do Médio São Francisco”.
Nota-se que de há muito se faria sentir a necessidade
de editar este trabalho de Cotrim, um dos mais notáveis
escritores dos tempos atuais. A Millennium
vem, agora, satisfazer esse desejo do seleto público
– mineiro e baiano – ou mesmo os “baianeiros”
como querem muitos de nós, na publicação
de mais uma obra de interesse inquestionável.
Cotrim sempre foi um apaixonado pelas
artes rupestres. Um visionário em perfeita sintonia com
o seu tempo. Um colecionador inveterado de objetos antigos e
um pesquisador contumaz da história antiga do seu povo.
Ainda menino, com os seus treze anos incompletos, ele iniciava
o seu pequenino “museu” de pedras semipreciosas,
com artefatos líticos dos índios (as machadinhas
e pontas de flechas e lanças), e ainda um pequeno mostruário
com inúmeros insetos e répteis, todos conservados
em “vidrinhos-de-penicilina” (doados por
Floriano – da Farmácia Popular do Dr. Benjamim
Vieira Costa) e
Museu de Dário Cotrim.
outros
frascos. Era possuidor de uma paixão incontestável
de amor e de carinho com os livros, com os retratos e documentos
antigos e com as peças de arte que retornam aos séculos
XIX e XX. Hoje, muitos desses objetos estão expostos
no Memorial de Guanambi, todos eles doados por Cotrim com o
objetivo apenas de colaborar com a história de sua cidade
e da região.
De lá pra cá Cotrim
já publicou 50 livros. Uma contribuição
imensurável para o verdadeiro resgate histórico
de várias cidades do Norte de Minas e do Estado da Bahia.
Aliás, a Millennium tem se
esforçado de todas as formas e meios em participar do
trabalho realizado por Cotrim, se
colocando sempre à disposição dele e/ou
do egrégio Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros. Nota-se que Cotrim
foi o responsável pela criação do IHGMC
e ainda tem procurado ajudar os seus distintos confrades e amigos
na editoração de livros, inclusive prefaciando
alguns deles por nós editados e, que já importa
em mais de uma centena. Um trabalho elogiável de incentivo
aos novos escritores.
Parabéns confrade Cotrim pela publicação
de mais um influente livro: “A Arte Rupestre na pré-história
do Médio São Francisco”. Acreditamos
que outros livros virão, com muito mais vigor, e que
certamente constituirá a revelação de novas
facetas do seu talento na arte de escrever. Entretanto a presente
obra já lhe bastava para eternarse na Galeria dos Intelectuais
Montes-clarenses. Parabéns e sucesso!
Impresso
na oficina da
GRÁFICA EDITORA MILLENNIUM LTDA.
Rua Pires e Albuquerque, 173 - Centro
39.400-057 - Montes Claros - MG
E-mail: mileniograf@hotmail.com
Telefone: (38) 3221-6790
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