CAMPEÃO DE PRÊMIOS,
EM DEFESA DA ÁGUA
O jornalista Luiz Ribeiro, membro
ativo do Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros, foi um dos
vencedores do Prêmio Allianz de Sustentabilidade,
com a série de reportagens
intitulada “Rios de Minas – um
milagre ameaçado”.Omarcante trabalho
jornalístico, realizado em equipe –
Flávia Ayer, Luiz Ribeiro e Júnia Almeida – resultou da observação de sete
mil quilômetros de rios pelos três repórteres
do “Estado de Minas”. Luiz Ribeiro revela que há
muito tempoumtrabalho de tal monta persistia em sua mente: “Quando criança, vivia nadando no Rio Caititu, que faz
parte da bacia do Rio Verde Grande. Mas, hoje, o Caititu
praticamente não existe mais. Como ele, centenas de outros
rios vêm desaparecendo aos poucos. Essa realidade
sempre me inquietou”.
A série de reportagens, com efeito, foi uma oportunidade
para que Luiz e seus colegas pudessem mostrar essa
triste situação, e despertar as autoridades para alguma providência.
Prêmio dos mais merecidos.
PETRÔNIO BRAZ É O IHGMC
NO COMCULTURA
O Diretor Executivo do Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros,
escritor Petrônio Braz, foiempossadopelo
Prefeito de Montes Claros, Ruy Muniz,
como um dos membros do COMCULTURA– Conselho Municipal de Cultura.
A posse ocorreu no dia 15 de março, na
sala de reuniões do Gabinete do Prefeito.
O COMCULTURA, - órgão colegiado,
de caráter consultivo, deliberativo
e fiscalizador - é responsável pela gestão do SISMIC - SistemaMunicipal
de Incentivo à Cultura, que tem como finalidade
apoiar, incentivar, difundir, valorizar, desenvolver,
preservar e promover as expressões artísticas e o patrimônio
cultural do Município de Montes Claros, e pelo planejamento,
orientação e coordenação da política cultural da cidade.
DE OLHO NA CIDADE
O confrade Délio Pinheiro
Neto é um repórter versátil,
atuando com desenvoltura e
brilhantismo nas mais variadas
editorias da TV Grande Minas,
afiliada da Rede Globo, com
sede em Montes Claros. Ele é
visto fazendo entrevistas nas ruas da cidade, em
matérias especiais de Unaí a Teófilo Otoni, de Espinosa
a Curvelo, apresentando os gols da rodada, e
apresentando o telejornal da emissora.
REUNIÕES NO CASARÃO
MAIS ANTIGO DA CIDADE
O presidente do IHGMC, Itamaury Teles, e o vicepresidente
Wanderlino Arruda estiveram no Casarão dos
Versiani-Maurício – o mais antigo da cidade, construído que
fora em 1812 –, na tarde do dia 5 de março de 2013, onde
foram recepcionados pela nossa confreira Raquel Mendonça,
competente servidora da Secretaria Municipal de Cultura.
Os emissários do IHGMC ali estiveram para tratativas
visando a levar as reuniões da entidade para serem realizadas
naquele nobre local, situado no Corredor Cultural
Padre Dudu. O Secretário Municipal de Cultura, Carlos
Muniz, de forma atenciosa e gentil, autorizou, prontamente,
a cessão do espaço para as nossas reuniões, nas tardes
dos terceiros sábados de cadamês. Aqui, registramos a eles
os nossos sinceros agradecimentos.
SHOWÇAITE HOMENAGEIA
DONA FERNANDA
Dona Fernanda Ramos, Cônsul Honorária de Portugal
em Montes Claros, falecida recentemente, foi alvo
de homenagens no último Showçaite, festa beneficente
promovida pela nossa confreira Felicidade Tupinambá,
no Automóvel Clube de Montes Claros. Em quadro especial,
nossos confrades Wanderlino Arruda, Itamaury
Teles e Felicidade Patrocínio prestaram homenagem à
memória de Dona Fernanda, do Conselho Consultivo do
IHGMC. No texto, lembranças aos nomes de vários portugueses
que contribuíram para o progresso de Montes
Claros, como Antônio Loureiro Ramos, Jayme Rebello,
Arthur Ramos, dentre outros.
IHGMC GANHA SEDE
NO CENTRO CULTURAL
Já no apagar das luzes da administração passada, o
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros foi contemplado
com espaço importante para a sua sede, nas dependências
do Centro Cultural Hermes de Paula. O então
Secretário Municipal de Cultura, Hamilton Trindade, disse
que a vinda da sede do IHGMC para o Centro Cultural
enobrece ainda mais o espaço de cultura da cidade, principalmente
pelo alto nível dos integrantes do Instituto.
Em sua fala, além de agradecer ao secretário pela cessão
do espaço nobre, o presidente do IHGMC, Itamaury
Teles, destacou o grande trabalho que vem desenvolvendo
a entidade, na construção da história de toda a região Norte-Mineira, materializada pelas edições semestrais de sua
revista, que já totalizam mais de 1.800 páginas de texto.
Antes do coquetel, foi descerrada a placa da sede social
e inaugurada a galeria de ex-presidentes do Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros, com retratos de
Wanderlino Arruda e Dário Cotrim.
FLAGRANTES DAS
REUNIÕES DO INSTITUTO
JULHO DE 2012: Dário Cotrim, Marilene Tófolo, Haroldo
Lívio, Juvenal Caldeira, Palmyra Santos Oliveira, Wanderlino
Arruda, Ruth Tupinambá Graça, Aderbal Esteves, Clarice
Sarmento, Regina Peres, Expedito Veloso, Lázaro Sena,
José Ferreira, Itamaury Teles e Manoel Messias Oliveira.
AGOSTO 2012: Dário Cotrim, Haroldo Lívio, Wanderlino
Arruda, Marilene Tófolo, Ayer David, Expedido Veloso,
Luís Carlos Novaes, Lola Chaves, Juvenal Caldeira,
Lázaro Sena, José Ferreira, Petrônio Braz, Manoel Messias
Oliveira, Felicidade Patrocínio e Itamaury Teles; assentadas:
Zoraide David Guerra, Ruth Tupinambá Graça e Palmyra
Santos Oliveira.
SETEMBRO DE 2012: Em pé: Manoel Messias de Oliveira,
Juvenal Caldeira, Expedito Veloso, Roberto Carlos Santiago,
Lázaro Sena, José Ferreira, Luiz Ribeiro, Haroldo Lívio,
Petrônio Braz; assentadas: Felicidade Patrocínio, Maria
Antunes Câmara, Maria Luíza Silveira Teles, Palmyra Santos
Oliveira, Eliane Maria Ribeiro e Yvonne Silveira.
OUTUBRODE2012:Empé – Roberto Carlos santiago, Kosé
Ferreira, Juvenal Caldeira, Aderbal Esteves, Manoel Messias
e Girleno Alencar; sentados – Dário Cotrim, Geralda
Magela Sena, Palmyra Santos Oliveira, Felicidade Patrocínio
e Itamaury Teles.
NOVEMBRO DE 2012: Em pé – Girleno Alencar, Lázaro
Sena, Rejane Colares, Dário Cotrim, Ivana Ferrante Rebelo,
Marilene Tófolo, José Ferreira, Manoel Messias Oliveira
e Itamauralda Magela Sena, Ruth Tupinambá Graça,
Maria de Lourdes Chaves (Lola), Palmyra santos Oliveira
e Wanderlino Arruda.
DEZEMBRO DE 2012
A reunião do mês de dezembro de 2012 foi marcante
para o Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros.
No dia 20 de dezembro, às 20 horas, no auditório do Centro
Cultural Hermes de Paula, houve sessão solene, para a posse
de quatro novos membros do
IHGMC: a médica e jornalista
Mara Yanmar Narciso – que discursou
em nome dos demais
neo-associados -, passou a ocupar
a cadeira no. 98, que tem
como patrono Virgílio Abreu de
Paula; a escritora e Maria Lúcia
Becattini Miranda – cadeira no.
30, cuja patrona é Dona Tiburtina;
o advogado Luiz Giovani
Santa Rosa, que ocupará a cadeira
no. 22, que tem Carlos Gomes
da Mota como patrono; e o Professor
José Ferreira da Silva, na cadeira no. 49, que tem como patrona a Irmã Beata. . Após a
solenidade, bastante prestigiada, foi servido coquetel, durante
o qual foi lançada a edição IX da Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros, com grande aceitação
pelos presentes.
REUNIÃO DE JANEIRO DE 2013
O Instituto Histórico e
Geográfico de Montes Claros
reuniu-se, na manhã deste domingo,
20/01, em sua sede social,
no Centro Cultural Hermes
de Paula. Nas foto, o registro
oficial do encontro mensal,
onde se veem: Zoraide
Guerra, Escritor Paulo Milagres
(visitante), Expedito Barbosa,
José Ferreira, Maria de
Lourdes Chaves, Juvenal Caldeira,
Jerúsia Arruda, Petrônio Braz, Palmyra Santos Oliveira,
Marilene Tófolo, Wanderlino Arruda, Cel.Lázaro
sena, Mara Yanmar Narciso, Dário Cotrim, Haroldo Lívio e
Itamaury Teles. |
|
Muitos assuntos importantes em pauta, com destaque para a palestra
proferida pelo confrade Wanderlino Arruda, sobre o patrono de sua
cadeira, Capitão Enéas Mineiro de Souza, que teve uma participação
marcante no desenvolvimento da região e foi prefeito de Montes
Claros em 1951/54. História contada por quem constrói, observa e
resguarda a memória de seu tempo. Um privilégio.
Na tarde de 16 de fevereiro de 2013, no Centro Cultural Hermes de
Paula, realizou-se mais uma reunião do Instituto Histórico e
Geográfico de Montes Claros. Na foto, Manoel Messias, Lázaro Sena,
Armênio Graça Filho, Maria Lúcia Becattini, Regina Peres, Ivana
Ferrante Rebello, Fabiano Lopes de Paula, Giovanni Santa Rosa, Ivo
Chagas, Juvenal Caldeira, Ruth Tupinambá Graça, Aderbal esteves,
Mara Narciso, Marcos Fábio Martins, Marilene Tófollo, Geralda
Magela Sena, Dário Cotrim, Marta Verônica Vasconcelos, Girleno
Alencar, Hélio de Morais e Itamaury Teles. Vinte e quatro sócios
efetivos assinaram o livro de presença.
Muitos assuntos importantes fizeram parte da pauta, com destaque
para a palestra do Professor Juvenal Caldeira, sobre o patrono da
cadeira número 81, Nathércio França.
MARÇO DE 2013
O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros reuniu-se na tarde do último sábado, dia 16/03, no Casarão dos
Versiani-Maurício, sede da Secretaria Municipal de Cultura.
Da pauta constaram importantes ssuntos. Dentre eles, palestra proferida pela Professora Marta Verônica Vasconcelos
Leite, sobre vida e obra de Auguste de Saint Hillaire,
patrono da cadeira 17, da qual é ocupante.
Em pé – Mara Narciso, Manoel Messias Oliveira, Maria Lúcia
Becattini, Aderbal Esteves, Lázaro Sena, Juvenal Caldeira, Maria
Aparecida Costa, Maria Ângela Braga, Denílson Rodrigues, Maria de
Lourdes Chaves (Lola) e Itamaury Teles. Assentados – Marta Verônica
Vasconcelos, Dário Cotrim, Palmyra Santos Oliveira, José Ferreira,
Wanderlino Arruda, Téo Azevedo e Haroldo Lívio.
HOMENAGENS A
DONA FERNANDA RAMOS
ATÉ MAIS VER, DONA FERNANDA
Itamaury Teles de Oliveira
Cadeira nÀ 84
Patrono: Newton Prates
Estava eu, no início da década de 90, absorto na leitura
de documentos em minha mesa de trabalho, na agência
Cidade Jardim, do Banco do Brasil, em Belo Horizonte,
quando adentra a minha sala uma mulher forte, de voz aguda
e característico sotaque português.
Chegara lá por indicação do seu genro, Alceu Carneiro,
meu companheiro no Rotary Belo Horizonte Oeste.
Era Dona Fernanda Ramos, querendo abrir uma conta-corrente na agência em que eu então gerenciava. E
foi ali que se iniciou, à primeira vista, uma amizade
fraterna, com aquela senhora de nome comprido – tão
ao gosto das famílias nobres portuguesas -, como se já trouxesse o pré-requisito e prenunciasse o cargo honorífico
que ocuparia poucos anos depois, de Cônsul
de Portugal em Montes Claros: Maria Fernanda Reis
Monteiro e Brito Ramos.
Aberta a conta, ela invariavelmente lá comparecia, ao
menos uma vez por semana. Muito bem informada, sempre
queria mais e mais detalhes sobre os cenários econômicos, financeiros,
políticos e sociais do país, de forma a bemorientar
seus investimentos. E eu sempre aprendi muito com ela, naqueles
gostosos “dedos de prosa”. Afinal, a troca de informações
sempre soma, pois nada perdemos nesse singular “escambo”.
Ao darmos informações não deixamos de possuí-las...
Em 1995, chegou com uma novidade à agência.
Portava seu novo cartão de visitas, já como Cônsul Honorária
de Portugal, em Montes Claros, tendo-me convidado
para as solenidades de posse, às quais não pude
comparecer, por encontrar-me assoberbado com o dia-a-dia da agência bancária.
Dez anos depois, volto a residir em Montes Claros e a
reencontro em acontecimentos sócio-culturais da cidade,
demonstrando a mesma alegria e inteligência que a mim
tanto cativaram.
Ano passado, percebendo que nos encontrávamos
em dificuldades financeiras para a edição da Revista da
Academia Montes-clarense de Letras, fez questão de doar
significativa quantia para viabilizar os trabalhos de impressão
da revista literária. Ela pediu-nos, à Dona Yvonne
Silveira e a mim, que gostaria de ficar no anonimato, em
relação àquela ajuda financeira. No lançamento da Revista,
no Elos Clube, quebrei o compromisso e revelei de público
aquele gesto altruístico da Dona Fernanda, que foi
calorosamente aplaudida. Era uma verdadeira mecenas...
Sempre prestigiou os lançamentos dos meus livros, e
dizia gostar muito de ler minhas crônicas, aos domingos,
no Jornal de Notícias, motivo de muita honra para mim.
Quando fui eleito presidente do Instituto Histórico e
Geográfico de Montes Claros, com o seu apoio, no final do
ano passado, convidei-a para ocupar uma das diretorias da
entidade. Ela, gentilmente, recusou o convite, alegando
impossibilidade, em função do cargo honorífico que ocupava.
Mas aceitou, prontamente, integrar o Conselho Consultivo
do Instituto. E logo mostrou serviço...
Na visita a Montes Claros do príncipe herdeiro do
trono brasileiro, Dom Bertrand de Orleans e Bragança, ela
aproveitou-se da oportunidade do jantar que oferecera em
sua Chácara Vista Alegre para reivindicar ao prefeito um
espaço no Centro Cultural para o Instituto Histórico e Geográfico.
E, ali mesmo, o prefeito Tadeu Leite se comprometeu
a atender o seu pedido.
O que me entristece nesse episódio foi o fato de a sala
ter sido disponibilizada ao Instituto faz pouco mais de uma
semana. Justamente quando Dona Fernanda já se encontrava
com a saúde bastante fragilizada, em hospital belohorizontino.
No último domingo, reunimo-nos pela primeira vez
na nova sala-sede, oportunidade em que fora deliberado a
remessa de correspondência à Dona Fernanda, falando das
nossas conquistas, agradecendo-lhe pela iniciativa, e desejando-lhe pronto restabelecimento e breve retorno ao nosso
convívio.
Todavia, na manhã da segunda-feira, chega-nos a triste
notícia do seu encantamento, nos primeiros minutos do
dia 25 de junho...
Dona Fernanda vai-nos fazer muita falta. Mas, com
certeza, agitará muito o Céu, cobrando providências de São
Pedro, o tempo todo. É da sua natureza.
Até mais ver, querida Dona Fernanda. Somos-lhe
muito gratos por tudo...
(*) Escritor e jornalista. Presidente do Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros.
ADEUS A DONA FERNANDA
Maria Lúcia Becattini Miranda
Cadeira nÀ 30
Patrona: Dona Tiburtina
Deve ser tempo de colheita nos jardins do Senhor!
Em poucos dias, Montes
Claros perdeu pessoas significativas
e atuantes, dentre
elas a querida amiga Maria
Fernanda e Brito Ramos.
O que mais me impressiona é que nunca nos acostumamos
com a ideia da morte.
Temos consciência de que
esta vida é passageira. Nenhum
de nós pode ficar aqui
para sempre. O maior tempo
que podemos permanecer são
aproximadamente cem anos. Mesmo assim, sempre recebemos
a triste notícia dos seres amados que morreram, com
tristeza, perplexidade e um sentimento de impotência de
que nada podemos fazer. Só mesmo rezar, pedindo a Deus
que os guarde em Sua plenitude.
E assim foi ao receber a dolorosa notícia do falecimento
da querida amiga, Fernanda Ramos...
Foi um dia de luto! Até o tempo, nublado e frio, deste
principio de inverno, colaborou com a nossa tristeza.
Ela possuía uma personalidade forte e impressionante!
Inteligentíssima, corajosa, dinâmica, culta, atuante, muito viajada, era uma cidadã do mundo! Fui apresentada a ela
por sua grande amiga, Geraldina Reis e, logo, fiquei fascinada
por sua interessante história de vida. Viúva, jovem
ainda, criou seus nove filhos com garra e coragem, e até o
fim liderou sua numerosa família com sabedoria e amor. E
tinha muito orgulho de todos.
Viveu intensamente como em um roteiro de novelas.
Lembrava-me uma daquelas mulheres fortes da Bíblia, enfrentando
todos os perigos em defesa do seu clã. Sempre a
pedia para escrever um livro para que nada se perdesse e
deixar tudo registrado para os netos e bisnetos.
Nós, seus amigos, gostávamos muito de ouvi-la contar
suas fascinantes aventuras. Foi voluntária da Cruz Vermelha
em Portugal, durante a Segunda Guerra Mundial, em serviço
de ajuda acolhendo refugiados. As crianças, órfãs de guerra,
chegavam desamparadas e famintas, com cartazes dependurados
em seus pescoços, com o nome dos pais desaparecidos.
Umverdadeiro horror! Ali, viu de perto a tragédia da guerra e
suas trágicas consequências. E nos repetia que o Brasil é mesmo
abençoado por Deus, por vivemos em paz.
Tinha o dom da comunicação e o usava para ajudar
as pessoas com sua grande influência e boa vontade.
Os portões da Fazenda Vista Alegre estavam sempre
abertos para receber quema procurasse para pedir sua ajuda
e seus conselhos. E como ela gostava disto... Sua mesa
farta estava sempre posta, e ela em sua varanda, recebia
muito bem a todos com bom humor e com seus francos e
sábios conselhos.
Excelente anfitriã, gostava muito de recepcionar os
amigos em lindas festas. Uma das últimas, e a mais bela e
glamurosa de suas festas, foi em homenagem ao príncipe
herdeiro, D. Bertrand de Orleans e Bragança. Nos jardins
iluminados, os amigos circulavam e Fernanda nos recebia
com a classe e categoria de uma baronesa do antigo império.
Foi como se fosse sua despedida...
Resta-nos, agora, continuar a grande aventura da vida sem sua presença solidária e relembrar seus sábios conselhos.
Ela me disse um dia:- “A morte faz parte da vida. A
melhor homenagem que podemos prestar a quem morreué continuar a viver da melhor maneira possível”.
Adeus amiga, tentaremos seguir seu último conselho,
mas a saudade será nossa companheira constante.
CÔNSUL FERNANDA RAMOS
Wanderlino Arruda
Cadeira nÀ 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Segundo Aristóteles, a grandeza não consiste em receber
honras, mas em merecê-las. E conforme Edith Wharton,
há duas maneiras de irradiar a luz: ser a própria fonte
de brilho ou o espelho que a reflete. Grandeza, honra, luz,
fonte, espelho, reflexo, um universo de palavras indicativas
de valor e mérito.
Em todas estas ideias e seus significados posso emoldurar
a mulher corajosa e cheia de ideais, que é D. Maria
Fernanda Reis de Brito Ramos, Cônsul Honorária de Portugal
no Norte de Minas, minha amiga e mestra de longo
tempo em vários setores da vida. A mesma D. Fernanda
que é capaz de elogiar sem rodeios ou demonstrar uma inconformidade
sem indecisões.
É para esta mulher guerreira, que fazemos uma festa
espiritual em comemoração aos seus oitenta anos, mais do
que bem vividos. Multipliquemos os seus janeiros por meses
e dias ou por horas e minutos, e podemos estar certos
de que qualquer medida de sua existência vem gravada de
proveitoso
construir, do muito amar, de um esforço incrível para
melhorar a vida e o viver. Dela mesma e de muitos. Dona
Fernanda é um dínamo sem medida de voltagem, uma criatura
sem limites na busca da perfeição, exigência própria,
exigência com quem estiver à sua frente ou ao seu lado.
Sempre chuva, nunca neblina, nada em D. Fernanda é calmaria,
nada. Para ela, a vida é busca incessante do que fazer, do como agir, do assinalar exemplos, uma corrida olímpica
de pistas e de pódios. É vencer ou vencer!
A Montes Claros já chegou D. Fernanda, jovemesposa
de Artur Loureiro Ramos, para ser grandeza do comércio
e da indústria, vivência e trabalho na Casa Luso-Brasileira,
centro e coração da cidade. Forte acento no caprichado
falar da Universidade de Coimbra, onde a Faculdade de
Engenharia lhe permitiu belíssima formação intelectual e
liderança. Aqui o seu maior contato com a realidade regional
e brasileira, a sua consolidação no trato de tudo e com
todos. Atitudes fortes, cada atuação mais do que definida:
a família, os amigos, as companheiras e os companheiros
de intelectualidade, o trato social mais do que valorizado.
Mínima a distância entre o ser e o atuar. Até no dia-a-dia
foi moça de sorte, porque a Casa Ramos ficava exatamente
na única esquina das duas ruas calçadas, a Rua Quinze e a
Rua Simeão Ribeiro, quando toda inteireza urbana era vermelhidão
de poeira.
Dona Fernanda esteve sempre de bem com a vida,
Algum descanso na Fazenda Vista Alegre, algum tempo
em reuniões do Clube Montes Claros, do Automóvel Clube,
da Associação Comercial e Industrial. Importante na
fundação do Elos de Montes Claros, na Sociedade das Amigas
da Cultura, na Associação de Dirigentes Cristãos de
Empresas, no Instituto Histórico e Geográfico. Importantíssimas
as atividades de D. Fernanda como líder elista:
conselheira, diretora, presidente internacional. Sempre
presente em encontros regionais e inter-países, principalmente
em convenções. Como presidente internacional tomou
várias iniciativas de elevada repercussão, valorizando
grandemente o Brasil e Portugal, além de benefícios
aos países irmãos de fala lusitana. Um valioso exemplo de
solidariedade e amor!
Três fatos marcam definitivamente o seu prestígio: a
vinda do Cônsul Sá Coutinho e esposa na fundação do Elos
de Montes Claros, a homenagem que a dra. Manuela Aguiar, deputada federal em Lisboa, veio trazer-lhe pessoalmente
na Sociedade das Amigas da Cultura de Minas Gerais e a
sua escolha pelo governo português para o cargo de Cônsul
Honorária no Norte de Minas. Quantos e quantos dirigentes
do Elos Internacional vieram a Montes Claros a seu
convite, por força do seu valor! Lembro-me como se fosse
hoje da grande festa de inauguração do Consulado, na sua
antiga residência da Avenida Cel. Prates, agora Praça Portugal.
Muito difícil repetir o sucesso de D. Fernanda Ramos
como o da sua presidência na ADCE, dias realmente dourados
para o prestígio da instituição. Com que entusiasmo
D. Fernanda planejou, construiu e vem mantendo o Hotel
Fazenda Vista Alegre, local aprazível não só para hospedagens,
como também para realização de eventos.
Léon Denis, o sábio pensador francês, sempre achou
que não basta crer e saber. É sempre necessário viver e fazer
praticar na vida princípios superiores. Nossa existência
tem que ser alegre, harmoniosa, plena de bênçãos de paz e
de amor, sempre e sempre despertando esperanças. Não
há como negar ser o amor a realidade mais pujante, porque
o amar é o grande desafio. O amor deve ser causa, meio e
fim. É por isso e por muito mais que Maria Fernanda Reis
de Brito Ramos, nossa querida Cônsul, Companheira e
Amiga, vive e sobrevive em razão dos seus muitos sonhos.
Agora nos seus bem norteados oitenta anos e ainda por
muito tempo mais. Bem haja!
PS.: A grande viagem da amiga D. Fernanda, Cônsul de Portugal, deixa-nosórfãos, desfalcados de uma sempre marcante presença em nossas vidas. Muitas
e muitas serão as saudades, as lembranças de sua cultura, sua combatividade,
seu amor ao Brasil e a Portugal,seu grande amor ao Elos Clube, seja o
Internacional, de que ela foi presidente, seja ao Elos Clube de Montes Claros e
aos diversos de nossa instituição. Um grande abraço, por ora, D. Maria
Fernanda Monteiro de Brito e Ramos.
HOMENAGENS A
EDGAR PEREIRA
AINDA O CENTENÁRIO
DE EDGAR PEREIRA
Haroldo Lívio de Oliveira
Cadeira nÀ 82
Patrono: Nelson Viana
O centenário do ex-deputado Edgar Pereira segue bem
comemorado, tornando mais conhecida a sua biografia de
político e empresário, e corrigindo dados incorretos sobre
sua pessoa. Lamento não tê-lo conhecido pessoalmente,
acredite, embora se tratasse de cidadão de alta popularidade.
Poderíamos ter sido até amigos, se as descoincidências
do destino não nos mantivesse separados, apesar de estarmos
muito próximos. Sabe-se que a vida é feita
de encontros e desencontros. No nosso caso faltou o encontro,
porque era mínima a distância que nos separava. Para
começar, éramos conterrâneos, brasilminenses de berço,
sendo eu natural da sede e ele do distrito e paróquia de
Santo Antonio da Boa Vista. Quando ele nasceu, nosso
município se chamava Villa Brazílea. Na minha vez, já era
Brasília. Atualmente, é a progressista e carnavalesca Brasília
de Minas, de vetustas tradições.
Lembro-me de que sua primeira esposa, dona Zulma
Antunes, era uma das mais queridas amigas de Mamãe.
Encontravam-se com grande alegria, freqüentavam-se em
visitas demoradas, cultivaram uma amizade que durou a
vida inteira, desde a década de 1930. Mesmo assim, não
tive oportunidade de ser identificado por Edgar Pereira; o
destino nos escondia um do outro. Meu saudoso Pai, por
seu lado, era muito estimado por ele, como amigo da família
Antunes e seu parceiro nas partidas de pôquer que varavam
a madrugada, nas noites frias de nossa cidade. Por ocasião da primeira eleição municipal de Varzelândia, meu
velho, já aposentado da escrivania, foi convidado por Edgar
para assessorá-lo como conhecedor de direito eleitoral.
Pois nem assim foi feita nossa apresentação. E continuamos
desconhecidos mesmo tendo sido Edgar patrão e amigo
de meu irmão Fernando, que trabalhou durante anos na
firma Irmãos Pereira. Fiquei conhecendo seu irmão Renato;
e anos depois tivemos, eu e Maria do Carmo, o prazer
de receber,em nossa casa, para um almoço, os irmãos Yolanda
e Cipião Martins Pereira, ele do Jornal do Brasil e da
revista O Cruzeiro, tido como um dos melhores textos da
imprensa brasileira. Continuamos desconhecidos, ou melhor,
ele não me conhecia, porque era uma pessoa pública,
congressista e capitão de indústria, e eu apenas um rapaz
que assinava matérias na imprensa local. Talvez tenha visto
meu nome, e pode até ter lido a matéria e perguntado a
alguém: “Quem é o autor”? Não passou disso nosso relacionamento
por afinidade, de caminhos paralelos.
As biografias publicadas desmentemversões que corriam
sobre a personalidade do aniversariante. Não vejo
nenhum demérito na pobreza. Os pobres ganharão o reino
do céu, é certo, mas Edgar Pereira nunca foi de origem humilde,
como se apregoa por aí. Em que terra, comerciante e
industrial pode ser tido como pobre. Seu pai, o velho Ioiô,
casado com dona Quita Pereira, era usineiro de algodão e
matriculava os filhos nos melhores colégios. Outra lenda,
que se desfez com as biografias de Augusto Vieira Neto e
Wagner Gomes, foi a de que se tratava de um bronco, de
poucas letras. Montaram até anedotas sobre essa suposta
ignorância. Disseram que ao ser informado pelo técnico do
Ipê de que o time, para atuar melhor, precisaria de entrosamento,
teria dado a ordem para que comprassem o tal entrosamento.
Isso deve ter sido maldade de algum cassimirense
ou atenense. Essa pilhéria injusta e despropositada
não faz sentido, uma vez que Edgar Pereira alisou bancos
no Gymnazio Mineiro (atual Colégio Estadual), de Belo Horizonte, e no Colégio Dom Pedro II, no Rio de Janeiro,
por onde passava a elite da juventude brasileira. Pode ter
ouvido Manuel Bandeira discorrendo sobre poesia. Ou ter
sido colega de sala de Vinícius de Moraes, nascido em 1913.
EDGAR PEREIRA, O JUSTO
CAPITÃO DE INDÚSTRIA
Itamaury Teles de Oliveira
Cadeira nÀ 84
Patrono: Newton Prates
Desde que me entendo por gente, ouço falar em Edgar
Pereira. Isso porque ele foi sempre muito ligado a Porteirinha,
onde mantinha entreposto de compra de algodão e se
envolvia não só nas disputas eleitorais, mas também participava
dos acontecimentos festivos e sociais da cidade.
Ali, optou por apoiar os “Gabirobas”, cujo líder era
o seu amigo Alcides Mendes da Silva, grande produtor e
comprador de algodão da sua empresa Comércio e Indústria
Irmãos Pereira S/A – nome que, em letras garrafais,
identificava o entreposto na esquina das ruas Pedro
Caíres e Benjamim Constant.
Do outro lado, havia Anfrísio Coelho, chefe dos “Liobas”,
também comprador e beneficiador de algodão, com
sua firma Coelho & Cia. E, também, Anísio Santos ( o fiel
da balança entre os dois grupos políticos), também usineiro,
principal acionista da Ciasa, a primeira sociedade anônima
na então denominada Capital Mineira do Algodão.
Mas Edgar Pereira transitava com naturalidade por
entre membros das facções políticas antagônicas, sendo
amigo de todos. Era uma figura muito carismática e andava
sempre cercado de pessoas, que gostavam de ouvi-lo
contar as novidades da política e do mercado algodoeiro.
No final da década de 1950, quando o Clube Social de
Porteirinha ainda era mero projeto arquitetônico, Edgar
Pereira participou da famosa Festa do Algodão na cidade,
que aconteceu nas dependências do velho mercado municipal,
providencialmente limpo após a feira sabatina. Nessa
festa, cada usineiro apadrinhou uma candidata. E os “Irmãos
Pereira”, firma ali representada por um de seus próceres,
o Edgar Pereira, apadrinhou justamente a minha tia
Miracy Teles, recentemente falecida.
Como tenho acervo respeitável de imagens da minha
querida cidade natal, guardo comigo fotografias dessa
noite memorável – de que não participei, evidentemente
-, em que foi eleita Rainha do Algodão a então
senhorita Suely Cardoso (mais tarde esposa do Dr. Djalma
Coelho), apadrinhada pelos “Paculdinos”, ali representados
pelo Ferreirinha.
Mas, mesmo tendo sido a festa realizada no mercado
municipal, Edgar Pereira lá compareceu trajando terno branco
e gravata borboleta, revelando o respeito e o carinho que
devotava à gente amiga porteirinhense.
Em 1970, já morando em Montes Claros, de certa forma
fui parceiro de negócios do industrial Edgar Pereira.
Eu trabalhava na Sisan, cuidando da usina de beneficiamento
de algodão, que meu cunhado Omir Antunes arrendara
de Oldemar Santos, dentro do complexo da Irsamasa. Eu era encarregado de despachar, para os “Irmãos
Pereira”, vários caminhões de caroço de algodão, por dia,
para alimentar a fábrica de óleo comestível ‘Boa-zinha”
(aquele do comercial – hoje, anacrônico – que enfatizava:“Todos gordinhos, com óleo Boa-zinha”. Mas, à época, ser
magro era sinal de doença)...
Lembro-me do Edgar Pereira candidatando-se, mais
uma vez, no início dos anos 70, à Câmara Federal, e da inovação
trazida à cidade, em matéria de propaganda eleitoral:
um grande balão inflável, contendo seu nome e seu
número (222), ficara ancorado em casa de sua propriedade,
na Praça Cel. Ribeiro, e era visto até de bairro distante...
No dia em que falecera, em 1973, antes de empreender
sua última e fatídica viagem a Brasília de Minas, tive
contato pessoal com o Deputado Edgar Pereira. Ele fizera
visita de cortesia à redação do Diário de Montes Claros.
Ali, conversou longamente com o Diretor Décio Gonçalves,
com o Editor Jorge Silveira e comigo, então repórter do jornal,
onde também mantinha a coluna “Vida Estudantil”.
Nessa conversa informal, falara de certo político conhecido,
caracterizado pela imprevisibilidade de suas atitudes.
Suas palavras, lembro-me até hoje: “Quando ele vem
de braços abertos em nossa direção, nunca sabemos se é
para nos abraçar ou para nos agredir...”. Mas trouxe-nos
muitas novidades de Brasília, inclusive a informação de que
conseguira muitas bolsas de estudo para pessoas carentes
da nossa região.
A notícia da morte de Edgar Pereira colheu a todos
nós de surpresa. Na edição seguinte, a coluna “Vida Estudantil”
teve como tema principal a morte daquele que era
considerado o pai do estudante pobre, que ficara órfão.
Mas a figura do capitão de indústria Edgar Pereira
paira, ainda hoje, sobre a economia norte-mineira, como um
homem empreendedor que extrapolou as fronteiras regionais,
expandindo e diversificando negócios que atingiram
não só Minas Gerais (Montes Claros e Uberaba), mas o Paraná (Ponta Grossa e Campo Mourão), e São Paulo (Guaíra).
Pelas sementes que plantou, pelos pobres alunos que
ajudou, pelos milhares de emprego que criou, pelo exemplo
que deixou, Edgar Pereira continua a ser lembrado, com
carinho e gratidão, no coração e mente da gente sertaneja.
CENTENÁRIO DE EDGAR PEREIRA
Petrônio Braz
Cadeira nÀ 18
Patrono: Brasiliano Braz
Montes Claros respeitou; Minas admirou; o Brasil
conheceu o político e o empresário. No próximo dia 31 de
outubro, o Norte de Minas estará comemorando o centenário
de nascimento do brasilminense Edgar Martins Pereira,
que se tornou cidadão norte-mineiro.
Ele viveu ativamente em um dos momentos mais
positivos financeiramente da vida do Norte de Minas: a Era
do Algodão.
Ouvia falar de Edgar Pereira quando ainda residia
em São Francisco, e ali chegou o jovem caminhoneiro Sebastião
Rocha, comprador de algodão para as empresas de
Edgar. Em 1963 mudei-me para Montes Claros. Aqui, através
do professor Zezinho Fonseca, vinculei-me a Luiz de
Paula Ferreira, dono da Algodoeira Luiz de Paula, da qual
tornei-me diretor administrativo a partir de 1966. Tínhamos
Edgar Pereira como ex-adverso nos campos comercial
e político.
Assim, posso dizer que conheci Edgar Pereira pela ótica de quem está distante, mas com o espirito desarmado,
e melhor pode avaliar os seus valores pessoais.
Ahistória não é escrita, fixada, por quem convive lado
a lado com os que fazem história, mas pelos que pesquisam
os fatos e a vida dos personagens que fizeram história. Edgar
Pereira fez história.
Edgar Pereira, nascido em Santo António de Boa Vista,
município de Brasília/MG, hoje de Minas, veio ao mundo trazendo o sangue empreendedor de Maximiliano Martins
Pereira, seu pai, e a bondade humana de Maria das
Dores Pereira, sua mãe.
Sua vida e atos marcaram a sua personalidade. Mesmo
afastado do seu convívio pessoal, mas conhecendo e
admirando seu trabalho, sua atuação comunitária, identifiquei
o homem Edgar Pereira, o ser humano temperamental,
de uma sensibilidade extrema e marcante singeleza
no trato com as pessoas, sempre coerente e presto
em suas decisões.
Sua imortalidade está presente não apenas no obelisco
plantado na entrada da Avenida João XXIII, portal do
Bairro “Edgar Pereira”, em Montes Claros: “UM MARCO
DEAMORE IDEALISMOGRAVADOPARA SEMPRENO
NORTE MINEIRO”. Seu trabalho político está registrado
nos anais do Congresso Nacional; seus empreendimentos
ficaram gravados na memória e se fazem presentes na materialidade
histórica de suas empresas.
Ele é patrono da Cadeira nº 32 do Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros, ocupada pelo confrade Edgar
Antunes Pereira. A imortalidade de Edgar Pereira se
faz presente pela memória de uma existência, que deixou
marcas particularizantes. Não é preciso ser vassalo, como
afirmou Castilho, para imortalizar as proezas de um homem.
Todos os homens de bem podem se tornar imortais
na lembrança dos que ficam. É imortal aquele não pode
perecer, livre da metafísica espiritualista.
Sua glória terrena foi adquirida por suas ações, pelos
serviços relevantes prestados ao Norte de Minas.
Seus filhos e sucessores ainda choramo seu prematuro
passamento, “lágrimas de imortal contentamento” (Camões),
porque a lembrança e o seu passado são inextinguíveis,
imorredouros. Plagiando Garrett ouso dizer que ele
caiu como um bravo em plena batalha política e quedou-se
gloriosamente.
HOMENAGENS A
REGINAURO SILVA
ADEUS, VELHO COMPANHEIRO
Itamaury Teles de Oliveira
Cadeira nÀ 84
Patrono: Newton Prates
Conheci Reginauro
Silva no dia 16 de
junho de 1971. Por que
uma data tão precisa?
Porque foi o dia em que
fui admitido como repórter
n’O Jornal de
Montes Claros. Reginauro
já era repórter
havia algum tempo, e já
auxiliava Waldyr Sena,
o Secretário de Redação,
como copidesque
dos textos dos repórteres
neófitos, também
conhecidos por “focas”.
Mas não somente
desses, pois há veteranos jornalistas que são excelentes repórteres,
mas péssimos redatores, necessitando seus textos,
sempre, do auxílio de um revisor de escol.
Para a redação de três edições semanais – às terças,
quintas e sábados -, sem o auxílio de “releases” de assessorias
de imprensa e da internet, ou mesmo dos já ultrapassados
aparelhos de telex ou teletipos, fazíamos das tripas coração.
A única “modernagem” que utilizávamos era o velho e pesado
telefone de mesa, com seu disco ruidoso e lento...
A organização interna do jornal se resumia a uma
singela departamentalização, com Lazinho Pimenta, na coluna
social; Alberto Sena, na reportagem policial; Péricles
Suzart e Arthur Leite, nas reportagens esportivas; e Reginauro
Silva e eu, nas reportagens gerais. Eu cobria as entidades
de classe (LBA, CDL, Acar, Sesc, Delegacia de Ensino,
Receita Federal, colégios, Merenda Escolar etc). Reginauro
ficava com câmara de vereadores, prefeitura e assinava
a coluna denominada “Leitura Dinâmica”, sob o pseudônimo
de “Rerosil” ( de REginauro ROdrigues SILva...).
Waldyr Sena Batista era o grande comentarista político, com
a coluna semanal “Fatos e Personagens”, e o responsável
pela edição do jornal. O Dr. Osvaldo Antunes, nessa época,
comparecia muito pouco à redação, mas às vezes escrevia,
com raro brilho.
Além de termos sido colegas de redação no vetusto “O Jornal de Montes Claros”, que funcionava na Rua Dr.
Santos, 104 – onde é hoje a agência da Caixa Econômica
Federal -, Reginauro e eu também fazíamos o jornal institucional
do Centro de Atividades do SESC, em Montes Claros.
Mensalmente, lançávamos uma edição do “CAMOC”,
feito artesanalmente, e impresso em mimeógrafo a óleo,
nas dependências do recém-inaugurado Colégio Polivalente,
no então pouco habitado Bairro Jardim São Luiz, no
início dos anos 70.
Depois, empreendi carreira diferente: fui trabalhar no
Banco do Brasil. Mas, jamais deixei de colaborar com os jornais
de Montes Claros... Nas redações dos diversos jornais
da cidade, que nascem e morrem com freqüência, sempre
encontrava o velho companheiro.
Depois que me aposentei, Reginauro convidou-me
para escrever no jornal “O Norte de Minas”, que fundara
sob o patrocínio do empresário Ruy Muniz, atual prefeito
da cidade. Ali, por mais de cinco anos, escrevi a coluna “Por
detrás do meu Ray Ban”, três vezes por semana, nos mesmos
dias que circulava “O Jornal de Montes Claros”, onde começamos no jornalismo: terça, quinta e sábado... Ali fiquei
até o dia que Reginauro deixou de editar “O Norte de
Minas”, e planejava fundar um novo jornal impresso: A
Província, onde eu fazia parte da equipe de articulistas.
Mas esse projeto do Reginauro ficou apenas no papel.
Convidado pelo então prefeito Luiz Tadeu Leite, foi
assessorá-lo na Prefeitura de Montes Claros. Ocupado com
outros afazeres, resolveu adaptar seu projeto de “A Província”
em um jornal eletrônico de mesmo nome, com grande
sucesso entre os milhares de leitores que visitavam a página,
na internet.
Reginauro sempre foi muito criativo e irrequieto. Estava,
constantemente, engendrando fórmulas capazes de
dar vazão à sua aptidão inata de criação: além de jornais –
como um mural diário, que expunha nas esquinas mais
movimentadas da cidade -, deixou inéditos livros vários –
como o polêmico “As 74 mulheres que eu amei” –, além de
peças teatrais abordando aspectos históricos – “A formiga
que queria ser cidade e virou princesa” – e hilariantes, como
o “Seu marido sabe que você tem outro homem?”...
Ainda em vida, Reginauro fez muita falta a Montes
Claros, quando, por razões políticas, ficou sem espaço na
cidade e teve de mudar-se para a Bahia, onde também semeou
alguns jornais.
Agora, muito mais, a falta desse talentoso homem,
que cunhou uma das frases mais emblemáticas de Montes
Claros – “Cidade da arte e da cultura” –, cala profundo...
O almenarense, de família humilde, que aportou em
Montes Claros na década de 60, em busca de melhores dias,
realizou-se: plantou ideias, realizou sonhos, teve filhos,
escreveu livros. Hoje, brilha no firmamento dos homens
ilustres, que ajudaram no progresso desta terra de Gonçalves
Figueira, e já é nome de Praça.
Por tudo que fez, Reginauro Silva fez escola e será
um nome sempre lembrado pela história de Montes Claros.
Com justo merecimento.
REGINAURO
Haroldo Lívio de Oliveira
Cadeira nÀ 82
Patrono: Nelson Viana
Eraumgaroto que, como todo luiscarlosnovaes, amava
os Beatles e os Rolling Stones. E não poderia ser de outra
forma, visto que nasceu no Ano Santo de 1950, faltando
apenas cinco anos para a gravação da música ”Ao balanço
das horas”, no filme de mesmo nome, que revolucionou
a juventude do mundo inteiro lançando o ritmo do
rock. Foi também o ano aziago em que a seleção brasileira
perdeu a Copa do Mundo para o Uruguai, em pleno Maracanã,
de virada.
Para a imprensa de Montes Claros, que naquele ano
era formada apenas de um jornal e uma emissora de rádio,
marcou o nascimento em Almenara, cidade mineira do Jequitinhonha,
próxima da Bahia, de um jornalista que pode
ter sido seu maior repórter de todos os tempos. Não corro o
risco de estar exagerando ao estabelecer um conceito para
o amigo querido que partiu há poucos dias, deixando um
grande vácuo em sua ausência, difícil de ser preenchida por
outro profissional da imprensa. Ouvido a respeito disso,
Waldyr Senna Batista, seu primeiro chefe de redação, no O
Jornal de Montes Claros, que costuma ser rigoroso em suas
avaliações, declarou que Reginauro Silva foi “excelente repórter”.
Nada mais precisa ser dito, a não ser que foi crescendo
a olhos vistos, muito lido e admirado nas matérias
que assinava, e passando por diversas redações da imprensa
local. Tornou-se, então, bastante conhecido como jornalista
brilhante e teatrólogo, dotado de rara criatividade no exercício de seu mister.
Tive o privilégio, por mero acaso, de vê-lo iniciandose,
no trabalho, ainda adolescente, no balcão do Bar Vilas-Boas, na Praça Coronel Ribeiro, servindo cafezinho a pessoas
comuns e também a celebridades. Lembro-me dele
atendendo o esportista e jornalista “Tu” Peixoto”, o contador
Leônidas Leão, o professor Pedro Santana. Por ali também
passaram o ecologista José Gonçalves Ulhoa, o britânico
diamantinense João Walter de Godoy Maia, o gramático
José Márcio de Aguiar, o filosófico “seu” Pires e outros
que se perdem nos desvãos da memória, tanto tempo faz.
Vejo-o caprichando o cafezinho para Luiz Gonzaga, o Rei
do Baião, e outros artistas que se hospedavam no Grande
Hotel São José, a exemplo de Cauby Peixoto e Nelson Gonçalves.
Não me esqueci de que os boêmios habituais do bar
chamavam Reginauro de Brizola, carinhosamente,porém
não me recordo da origem do apelido. Talvez pela inteligência
e agilidade que viram nele, prevendoumfuturo promissor
para o garoto...
Ele poderia ter-se perdido, na orgia, como a maioria
dos jovens de sua geração, marcada pela trilogia sexo, droga
e rock’n’roll, mas largou a turma a tempo de salvar a
bela carreira de jornalista que construiu. Só se lamenta que
não tenha seguido outros moços que partiram para centros
maiores e fizeram carreira de nível nacional. Não se imaginava
vivendo e trabalhando em outra cidade que não fosse
sua adorada Montes Claros, a qual coroou com a denominação
poética de Cidade da Arte e da Cultura.
O ÚLTIMO ADEUS A REGINAURO SILVA
Felicidade Vasconcelos Tupinambá
Cadeira nÀ 36
Patrona: Felicidade Perpétua Tupinambá
“Reginauro vai ser sempre uma referência de Jornalismo
em Montes Claros e na região. Ele será para sempre meu
editor, com quem aprendi muito. Sem dúvida, uma grande
perda para todos nós. Mesmo tendo uma religião como alicerce,
que nos garante a vida eterna, a dor é grande. Mas isso
mostra a inexorabilidade da morte, que é inevitável. Uma
das minhas muitas lembranças foi o ‘Conversa Fiada’ que fiz
com ele e com diversos ex-colegas dele da Escola Normal,
sobre o Grêmio Estudantil. Eu fiquei gratificada por ter promovido
este encontro. Eles, embora homens feitos já, mostraram
que ainda tinham e têm alma de criança. Outra lembrança
importante: eu ingressei no impresso pelas mãos dele. Àépoca, minha coluna não tinha título e foi ele quem criou o
nome ‘Simplesmente’ para a coluna. E no último domingo
(20/05), durante a festa do Karoba, ele me afirmou que tinha
planos para retornar ao impresso e que gostaria que eu voltasse
a escrever a minha coluna”.
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RIQUÍSSIMO LEGADO
Wanderlino Arruda
Cadeira nÀ 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
“Reginauro é umícone do conhecimento,
da cultura. A ausência
dele vai fazer muita
falta à cidade e à região.
De atividade
constante, ele deixaum
riquíssimo legado para
a história de Montes
Claros. E nós, do Instituto
Histórico e Geográfico
de Montes Claros,
tivemos a honra
dele ter sido um dos
fundadores”.
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A TRISTE PARTIDA
Dário Teixeira Cotrim
Cadeira nÀ 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires)
A cidade de Montes Claros está de luto. Morreu o
dramaturgo e crítico literário Reginauro Silva. Morreu o
confrade que ocupava com méritos a Cadeira número onze
do egrégio Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros.
Ele tinha como patrono o ilustre jornalista Ary Oliveira.
Na Revista do Instituto, volume VII, Reginauro Silva
participou com o texto Encontro Cadavérico, quando foi
muito elogiado pela imprensa local. Há um silêncio profundo
na imprensa montes-clarense. Um silêncio de respeito
e de gratidão.
Agora, choram os sinos; choram os hinos; choram os
meninos. O palhaço tem o sorriso triste e a boca de palco
sequer soletra uma única palavra. Na noite, um vulto perambula
abatido, desmedido, bandido das horas mortas em
busca da Viadagem. Reginauro Silva, num último suspiro
de dor e saudade revela-nos a incerteza dos nossos projetos.
A Formiga que queria ser cidade e virou princesa jamais
pensaria num momento deste: de morrer. Certamente
que as melhores lembranças deste grande homem ficarão
para sempre gravadas na história de nossa cidade. Reginauro
Silva foi um construtor da cidade de Montes Claros.
Dinâmico jornalista, ele prestou os serviços mais importantes
na imprensa local em beneficio de sua terra e de sua
gente. Hoje ele nos deixa. Lágrimas, soluços e choros serão
incontidos no momento de sua despedida. Adeus, amigo!
Requiescat in pace!
O SILÊNCIO DO GUERREIRO
Jerúsia Xavier Arruda
Cadeira nÀ 28
Patrono: Darcy Ribeiro
A morte é
mesmo uma coisa
estranha. Assistimos
pela televisão a cenas
trágicas, reais e
fictícias, o tempo
todo. Choramos e
acalentamos o choro
de pessoas que perderam
entes queridos,
mas nunca estamos preparados quando o dia fatídico
chega para alguém próximo a nós.
A morte de Reginauro Silva me leva a essa reflexão.
Não importa o plano que fazemos, o quanto evitamos situações
de risco, se fazemos check-up ou não, nada adianta.
Quando a hora chega, interrompe tudo, sem mais nem menos.
Simplesmente põe fim a uma história. E é ainda mais
difícil perder alguém cheio de energia, de vigor, de vida.
Na verdade, a morte é uma violência que açoita a
alma. Por isso precisamos viver o desapego das coisas fúteis
e inúteis, perdoando sempre, amando sempre.
Reginauro Silva foi uma pessoa determinante na minha
profissão. Ao lado dele dei os primeiros passos no
jornalismo, com ele aprendi a escrever minhas primeiras
crônicas, a analisar criticamente o que só poderia ser visto
nas entrelinhas.
Dele me despeço com pesar, mas com a certeza de
que conheci um homem que escreveu uma grande história,
e que me permitiu, em algum momento, fazer parte dela, o
que muito me orgulha.
Aos familiares de Reginauro, meu desejo é que Deus
lhes dê acalanto, força e proteção nesse momento difícil.
Com os colegas de imprensa compartilho o luto de
quem perde um bravo guerreiro, numa batalha às vezes
inglória, que é tecer diariamente o fio da história.
A Reginauro Silva, minha gratidão.
ARTIGOS DIVERSOS
DOS SÓCIOS DO IHGMC
UNIMONTES
Clarice Sarmento (Augusta Clarice Guimarães Teixeira)
Cadeira nº 31
Patrono: Dulce Sarmento
Conheci a Unimontes quando ainda era a FUNM
(Fundação Universitária do Norte de Minas). Seu presidente,
Professor José Geraldo Drumond, médico idealista e realizador,
sonhou vê-la transformada em universidade.
A fundação era composta pelas faculdades de Filosofia,
Medicina, Direito e Economia e, para abranger todas as áreas necessárias para que se transformasse em universidade,
era necessária uma Faculdade de Artes.
Marina Lorenzo Fernândez, que dirigia o Conservatório
Lorenzo Fernandez (escola de artes de nível médio),
foi chamada e, logo, como sempre cheia de entusiasmo,
organizou o estatuto, os programas, convocou seu
melhores e mais habilitados professores e fundou a FACEART
(Faculdade de Educação Artística). Disponibilizou as
salas e instrumentos do Conservatório para o início das atividades
e, mediante empenho e diligências, a autorização
de funcionamento aconteceu, por decreto federal, em 07/10/86, sob o número 93345/86.
Por dois anos Dona Marina dirigiu a faculdade, no
fim dos quais, solicitada pela família para assumir a direção
do Conservatório Brasileiro do Rio de Janeiro, fundado
por seu pai, Lorenzo Fernândez, deixou-nos com a responsabilidade
de continuar sua obra.
Como ninguém queria assumir o risco de substituir
tão grande personagem, fui eleita à revelia. A professora
Lygia dos Anjos Braga assumiu a direção do Conservatório e, sob a alegação de necessitar das salas, exigiu nossa saída
do prédio da rua Cel. Joaquim Costa.
Assim me vi diretora de uma Faculdade autorizada,
com alunos no terceiro ano de Música, Artes Plásticas e
Teatro, sem nenhum instrumento musical e sem local para
seu funcionamento.
Na primeira reunião do Conselho da Fundação a que
compareci, figurava na pauta a inconveniência de manter
uma Faculdade deficitária, já que demandava uma despesa
muito grande para seu aparelhamento, alémdo número de
alunos ser pequeno e as disciplinas e o número de aulas
numerosos. Durante todos os primeiros anos, a ameaça da
desativação sempre esteve presente. Tentando diminuir os
gastos, enxuguei o currículo para o mínimo que não comprometesse
a qualidade, diminuí o número de aulas e consegui,
sempre com o apoio do Dr. José Geraldo, um voto de
confiança do relutante Conselho.
Para comprar os primeiros instrumentos, fui com a
professora Maria Antonieta Silvério a São Paulo.Sempre
preocupadas com as despesas,para maior economia, nos
hospedamos em casa de meu irmão. Percorremos o centro
da cidade experimentando instrumentos, comparando preços,
para, enfim, voltarmos vitoriosas para a inauguração
de nossa primeira sede, ainda provisória, nas salas do antigo
prédio da FAFIL. Concertos, exposição de pintura e uma
peça teatral, abrilhantaram as festividades comemorativas.
Nossa segunda sede foi recebida com uma festa
maior ainda, já que, desta vez, era um prédio adaptado às
nossas necessidades (tinha atéumpequeno auditório). Hoje,
lá funciona o Museu do Folclore e a antiga Faceart é o curso
de Artes da Unimontes.
Os quatro anos,nos quais permaneci á frente da faculdade,
foram de intensa atividade cultural: Concertos instrumentais,
peças teatrais, audições de canto, cursos de atualização
para professores, exposições de pintura e a realização
da primeira ópera em Montes Claros: La Bohéme, de
Puccini, que aconteceu no auditório da Escola Técnica, com
cantores professores e alunos, sob a direção da professora
Maristela Cardoso.
Em1992, com a formatura da primeira turma, a principal
preocupação se torna a necessidade de obter o reconhecimento
da Faculdade. Cleonice Souto, Pró-Reitora de
Ensino da, já então, Unimontes, torna-se a peça chave como
nossa orientadora, na preparação da documentação necessária
para os trâmites legais. Em 27/04/93, pela portaria
ministerial 634/93, a Faceart é reconhecida oficialmente.
Assisti à luta dos primeiros diretores deste período,
a competência com que enfrentavam as dificuldades, sempre
tendo como luzeiro a concretização de um sonho de
engrandecimento de nossa terra e nosso povo. Liderados
por Dr. José Geraldo Drunond, os diretores José Antônio
de Castro (Direito), José Carlos Barbosa (Medicinsformar a
FUNM em UNIMONTES. Muitas transformações aconteceram.
Cleonice Souto, secretária, torna-se Pró-Reitora de
Ensino, Maria de Lourdes Paixão (Extensão), Rui Pedro
Klasman, Pró-Reitor de Administração e Finanças, Ivo das
Chagas, Pró-Reitor de Pesquisa. Muitos professores novos
foram admitidos. Alguns vieram de fora e se tornaram
montes-clarenses por merecimento.Prestaram concurso e,
aos poucos, a Universidade foi se consolidando.
Na Faceart não trabalhei sozinha. Da vice diretora
Marina Sarmento e as competentes secretárias Maria Eugênia
Athayde e Cleusa Ferreira aos chefes de departamentos
e professores da primeira turma, todos trabalharam com
afinco, entusiasmo e idealismo,para consolidar o que hoje é
o Curso de Artes da Unimontes: Na música vocal e instrumental
Antonieta Silvério, Thalita e Patrícia Peres, Marta
de Paula, Raquel Crosoé e Sebastião Andrade. No teatro,
José Batista vem substituir Liana Meneses. Nas Artes
plásticas,o professor Conrado e Maione Medeiros dão lugar a Elda Aléssio e Juscemira Rocha. Os alunos se tornam
mais numerosos e novos professores são admitidos. Em junho
de 1993, deixei a direção para continuar como professora
de Canto Coral, com a certeza do dever cumprido.
Hoje, vejo com admiração a Unimontes transformada
numa das maiores universidades do Brasil, e penso
com carinho no trabalho dos pioneiros, daqueles que
idealizaram, trabalharam, e assistem hoje à concretização
dos seus sonhos.
A eles, os louros da vitória!
TIPOS POPULARES
DE ONTEM E DE HOJE
Dário Teixeira Cotrim
Cadeira nÀ 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires
Todas as cidades têm os seus tipos populares. Eram
pessoas que não tinham origem, pois não se sabiam de onde
vieram e nem para onde iam. Muitos deles, alguns da zona
rural, permaneciam perambulando pelas ruas da cidade em
busca de esmola e por aqui faziam morada. Quem não se
lembra do velho prazenteiro
Tuia? Do enfatuado
Zé Goela? Do Santo Besta
e da beleza de Bela
Doida? Seus nomes verdadeiros
nós não os sabemos.
Mas, talvez algum
dos moradores
mais antigos da cidade
possa nos dizer isso um
dia. É uma empreitada
difícil, porém não é impossível.
Fica, portanto, a
palavra com os eminentes
historiadores Wanderlino
Arruda e Haroldo
Lívio.
‘‘Manoel Quatrocentos’’
(Foto Sérgio Mourão)
Já o play-boy “cortador
de lenha”, Manoel
Quatrocentos, nós sabemos
que ele se chamava Manuel Nunes da Silva. Alalaô era outro tipo popular de
Montes Claros de antigamente. Certa vez, o confrade João
Valle Maurício o encontrou na Estação da Central e perguntou-lhe: - “Você vai viajar?” – “Vou sim. Vou para Pirapora”
– “Por quê?” – “É porque aqui nesta cidade os meninos
não respeitam a doidura da gente”.
Na verdade, os tipos populares de outrora faziam a
alegria da molecada. Era comum a meninada, de épocas
passadas, bulir com os chamados “doidos” da cidade apenas
por diversão, sem nunca ofendê-los com violência. Os
xingamentos faziam parte da brincadeira. Enquanto o “doido”
xingava os meninos, eles corriam pelas ruas sem calçamento
fazendo, propositalmente, poeira com os pés, num
divertimento constante. Havia o insulto gratuito, o que não
era aceito pelos pais e nem pela sociedade. Mas, nunca havia
a maldade dos tempos modernos. O respeito à vida era
preservado, pois o castigo em “casa”, certamente, era coisa
certa e temerosa. Em vista disso atos de violência, como
aquele que aconteceu em Brasília, quando cinco marginais
da alta sociedade atearam fogo no pobre índio Galdino Jesus
dos Santos, nunca acontecia.
Infelizmente a Praça da Matriz abriga algumas dezenas
de mendigos. São todos eles viciados em drogas e perigosos
para a sociedade em que vivemos. Não há respeito
entre eles, pois cenas pornográficas são oferecidas à luz do
dia, sem nenhum pudor e sem nenhum medo de represália.
O mais interessante é que os mendigos sabem de seus
direitos, mas nunca sabem eles de seus verdadeiros deveres.
Pois bem, infeliz de quem ousar bolir com a temerária
gangue que fica diariamente acampada sobre o gramado
da Praça da Matriz, promovendo ali espetáculos obscenos
e emporcalhando-a com restos de comida e pedaços de velhos
jornais, em detrimento da limpeza pública realizada
pela municipalidade. Aliás, melhor local para as suas desfaçatezes,
certamente que não haveria de ter, pois ali
eles recebem da bondosa população montes-clarense muitos alimentos e dinheiro para provir os seus malditos vícios
e a droga da impunidade de seus atos de despudor.
É triste, mas é verdade, os tipos populares de outrora
não existem mais. Os pedintes de hoje são industriados no
crime pelos traficantes de drogas para promoverem assaltos
e assassinatos como único objetivo: a aquisição das drogas.
Entendemos que há uma necessidade de um projeto
social, de interesse relevante do povo, para a recuperação
das pessoas neste estado de conduta. Nota-se que, os “loucos”
do passado são inócuos para a sociedade, haja vista
que as suas causas têm outras origens.
MARCIANO FOGUETEIRO
Dário Teixeira Cotrim
Cadeira nÀ 93
Patrono: Simeão Ribeiro Pires
Os que acompanham a
trajetória cultural de Montes
Claros sabem que a “cidade da
arte e da cultura” abriga em seu
seio uma lista enorme de nomes
que, em prosa e verso, enriqueceram
a história sociocultural
de nossa terra. Nomes
com os de Cândido Canela e
Hermes de Paula serão sempre
lembrados por todos aqueles
que gostam de uma boa leitura.
Faço este proêmio para dizer
da importância e da saudade
que o povo de Montes Claros
sente por Marciano Fogueteiro.
E quem era o Marciano
Fogueteiro? Pois bem. Batizado com o nome de Marciano
Geraldo Simões era natural de Montes Claros. Ele nasceu
no ano de 1903. Tornou-se um fazedor de foguetes e com
isso ganhou fama e uma fortuna invejável.
Chico Pitomba, em versos, conta a vida pregressa de
Marciano Fogueteiro: ”Nestes versos de cabloco/ na rima do meu
sertão/ nesta vila afinada/ da prima inté no burdão/ eu vou lhes
contar a vida/ dumhome bão, prazentêro/ qui tudo o mundo conhece/
Marciano Fogueteiro”. Assim iniciou Chico Pitomba e sua poesia e aos poucos ele vai falando das astúcias de um homem
trabalhador, sério e competente nos negócios. Compra
uma casinha aqui, outra acolá e em pouco tempo já contabiliza
uma belíssima fazenda e muitas cabeças de gado na região
nobre de Juramento. Nota-se que, naquela época, a fé
em Nossa senhora da Conceição e São José fazia da Igreja da
Matriz um reduto de fiéis amantes dos foguetes de rabo de
fogueteiro Marciano. Os dias de domingos eram para soltar
fogos. E assim Marciano Fogueteiro acumulava fortunas.
Há, porém, outras faces de Marciano Fogueteiro: o garimpo
e a poesia. Muitos pensavam que Marciano havia conseguido
uma pedra de diamante muito grande e com ela feito
fortuna. Não! Não foi isso que aconteceu. Ele não foi muito
feliz no garimpo. E a propósito disso ele escreveu esses
versos: ”Garimpo é jogo, é incerteza/ ninguém conta com a vitória/
quando se espera diamante/ chega esmeril, vem escória. E o
garimpeiro apressado/ transtornando de emoção/ do seu monte, a
quarta parte/ quer vender na salvação. Pensa na esposa, nos filhos/
apalpa o bolso sem cobre/ de novo lava o cascalho/ e nada, nada
descobre. À virgem Nossa senhora/ recorre já delirante/ por milagre,
nesta areia/ joga pra mim um diamante. Com poucas gemas
que ache/ transformarei minha sorte/ pagarei Quincas e Geraldo/
Virgilato e o sacerdote. É sempre assim o destino/ do sonhador garimpeiro/
de sol a sol labutando/ em Conceição do Barreiro”.
Entendo que o povo de Montes Claros ainda desconhece
da importância de Marciano Fogueteiro para a história
cultural da cidade. As Festas de Agosto certamente que
retratam, com muita propriedade, o que seria o personagem “Fogueteiro” para as maravilhas das fitas e bandeiras
no balanço do vento e o céu carregado de fumaça em razão
dos foguetes em explosão. A cada “tiro” uma nesga de sorriso
que alimenta as nossas tradições e os nossos costumes.
Por outro lado, as festas Juninas – Santo Antônio, São João
e São Pedro – há de continuar com o brilho e a alegria de
Marciano Fogueteiro. Benza! Deus!
SERTÃO, UM LUGAR DESDOBRADO
Fabiano Lopes de Paula
Cadeira 66
Patrono: Alferes José Lopes de Carvalho
O que é o sertão? Uma pergunta de difícil resposta.
Uma pergunta que nos remete a outras tantas questões: O
que é lugar?Oque é espaço? Quem ou o quê habita o sertão?Onde
fica o sertão?Euclides da Cunha, Graciliano Ramos,Afonso
Arinos e Guimarães Rosa, para citar alguns nomes da literatura
brasileira, enveredaram-se pelo dito sertão e construíram
narrativas sobre esse lugar que sempre nos escapa.
Aqui, não pretendemos criar um conceito do que se entende
por sertão, aliás, não conseguiríamos chegar a um consenso
para o significado desse “lugar”. Sertão? Não há resposta
para ele. Pretendemos apenas um exercício sobre alguns
olharese o que se percebe do que seja o sertão, espalhar
palavras, as quais talvez não sejam nada além de tautologias.
Palavras repetidas, palavras que ratificam a presença
da diferença. Seguindo os conselhos de Jean de Léry,
iniciemos nosso caminho da repetição: “é a viagem bem
longa e difícil, por isso quem não tiver bom olho e bom pé
ou se sentir temeroso de tropeços, que não se arrisque”
(LÉRY, 1980: 121).
A viagem pelos sertões inicia-se nos mares do oceano
Atlântico. Durante séculos, o mar foi considerado, por portugueses
e espanhóis, como o lugar do desconhecido, o lugar
da moradia das mulheres-sereias, dos peixes voadores,
dos fantasmas, dos monstros. Mar: imensidão dos impossíveis,
imensidão-sertão. Para navegar por essas águas dantes
não navegáveis foi preciso romper com as magias que rondavam a imensidão atlântica. A passagem não foi brusca,
não se deu no ano de 1440, como diz a história da navegação
portuguesa (DELEUZE EGUATTARI, 2002). Foi, sim,
de acordo com Pierre Chaunu, um longo processo de estriamento1
do mar. Até o século XV, a navegação portuguesa
era feita através de barcas e de barinéis2, embarcações que
não suportavam as bravezas do sul do Oceano Atlântico.
Foram esses simples meios de transporte marítimo que permitiram
a conquista de muitos territórios pelos portugueses,
como, por exemplo, Ilha da Madeira, Açores e Canárias.
Já no século XVI, com a utilização das caravelas e de
instrumentos de localização, como o astrolábio, o quadrante,
a balestilha e as tábuas astronômicas, os portugueses
conseguiram se embrenhar pelos oceanos Atlântico e Índico.
De mar liso para mar estriado, esse foi o caminho pelo
qual as águas mágicas passaram. Da navegação nômade,
movida por cores, sons, ventos, direcional, sem pontos demarcados,
pré-astronômica, passou-se para a navegação
longitudinal e latitudinal, dimensional, com pontos demarcados
e mapeada. O Estado português, ao contribuir para o
desenvolvimento da ciência da navegação, foi capaz de
destrinchar, povoar – com suas embarcações e viagens – e
organizar a imensidão do Atlântico.
É como se o mar tivesse sido não apenas o arquétipo
de todos os espaços lisos, mas o primeiro desses espaços a
sofrer uma estriagem que o tomava progressivamente, e o
esquadrinhava aqui ou ali, de um lado, depois do outro.
__________________________
1 De acordo com Deleuze e Guattari (2002), o lugar pode ser caracterizado como liso ou estriado.
Este é o lugar do Estado, do ponto, da organização, do extenso, da métrica, da regularização,
da sedentarização, do logos, da territorialização. Já aquele é o lugar do irregular, do
indeterminado, do trajeto, da linha, da intensidade, da guerra, do nomos, dos afetos, da distância,
da desterritorialização. Essas são oposições simples que marcam tais lugares. Todavia,
os autores propõem uma leitura mais complexa da relação entre liso e estriado. Segundo
eles, os dois lugares podem ser vistos como oposições, como não coincidências ou como
misturas. Estas caracterizariam a existência de um alisamento do que foi estriado ou o estriamento
do liso, coma convivência contínua das duas categorias; nemestriado, nemliso, mas
híbrido. “Os dois espaços só existem de fato graças às misturas entre si: o espaço liso pára de
ser traduzido, transvertido num espaço estriado; o espaço estriado é constantemente revertido,
devolvido a um espaço liso” (:180).
2 A barca e o barinel são embarcações a remo que possuemum mastro comvela fixa (Dicionário
Houaiss).
__________________________
(...) [O] mar, arquétipo do estado liso, foi também o arquétipo
de todas as estriagens do espaço liso: estriagem do deserto,
estriagemdo ar. (...) É no mar que pela primeira vez o
espaço liso foi domado, e se encontrou um modelo de ordenação,
de imposição do estriado, válido para outros lugares
(IDEM, p. 186).
Organizando as águas, dimensionando-as, os portugueses
e espanhóis conseguiram chegar à América, um território
também liso e, por isso, mágico, exótico, povoado
por povos vorazes e coberto por uma natureza a ser dominada.
Mas antes de entrarmos nesse sertão, especificamente
no sertão chamado Brasil, vejamos como a mitologia dinamizou
o processo de colonização do “Novo Mundo”.
O pensamento e ação dos portugueses pelos mares e
pelos territórios conquistados/descobertos foi movido por
uma mitologia européia pautada no cristianismo católico e
protestante (catequização dos gentios), na exuberância da
natureza selvagem (monstruosidades do mares e das terras)
e na busca de riquezas (ouro).Os indivíduos recriam a
história – eventualizam um acontecimento – com base no
passado, ou seja, delineiam o contemporâneo através das
(re)construções mitológicas, colocando em risco, de acordo
com suas posições específicas, os signos culturais1. As pessoas
colocam em ação os conceitos culturais e engajam o
mundo; os símbolos permitem uma ação na história, permitem
tornar algo tremendamente singular (nunca visto
antes) em algo familiar – o presente no passado.
Colocar a mitologia em ação foi uma forma encontrada
pelos viajantes para a compreensão e estruturação de
categorias contingentes, assim como um modo de efetivar
o contato com a alteridade. As narrativas de viagem pelos
mares e pelas terras do Brasil são permeadas de relatos de
aparições de seres exóticos, monstruosos e até não-existentes.
Alguns títulos de capítulos de Viagem à terra do Brasil (1980 [1578]), de Jean de Léry, retratam bem esse aspecto:“Dos bonitos, albacores, dourados, golfinhos, peixes-voadores
e outros de várias espécies que vimos e apanhamos
na zona tórrida”; “Dos animais, veação, lagartos, serpentes
e outros animais monstruosos daAmérica”. Os peixes-voadores
têm uma existência concreta no olhar de Léry: este,
segundo o relato, pode tocá-los, comprovando a idéia de
que esses peixes e também outros seres, antes de serem vistos,
já existiam na cabeça dele.
___________________________________
1 Marshall Sahlins chama de mitopráxis o processo de ressemantização, na ação, da estrutura
mítica.
___________________________________
Na iconografia do relato de Léry encontra-se, desde a primeira edição,
de 1578, uma gravura (LÉRY, 1975, p. 235) na qual se distinguem
diversas representações do fantástico, tais como dragões, demônios
atacando os seres humanos e, bem caracterizando as novas terras, um
enorme bicho-preguiça. Até mesmo os peixes voadores assumem
proporções irreais em relação aos demais elementos da cena. Fonte:
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1413-
666X2007000100007&script=sci_arttext
Para os europeus, o novo mundo era povoado por seres fantásticos.
Fonte: http://www.libertaria.pro.br/brasil/capitulo01_index.htm
Baltasar Ferreira mata o Ipupiara, monstro em que os europeus
acreditavam existir no Brasil, em História da Província de Sãcta Cruz a
que vulgarmente chamamos Brasil, do cronista Pero de Magalhães
Gândavo. Fonte: http://pt.fantasia.wikia.com/wiki/Ipupiara
Viajantes que foram à Amazônia relatam histórias sobre tribo de
índios acéfalos, que tinham olho e boca no peito. Ilustrações Biblioteca
Nacional/Divulgação. Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/
864519-lobisomen-e-chupa-cabra-constam-em-relatos-cientificos-sobreo-
brasil-do-seculo-17.shtml.
Gravura do século XVI, feita pelo geógrafo alemão Sebastian Münster,
acerca dos monstros que habitavam o “Mar Tenebroso”. Fonte: http://
cienciashumanasmarianinha.blogspot.com.br/2011/09/expansaomaritima-
e-o-oceano-atlantico.html
Mas não é apenas de estranheza que se dinamiza a
mitologia acerca da Terra do Brasil – termo muito utilizado
por Jean de Léry. É também comum o mito do paraíso americano:
o lugar das delícias, da pureza, da diversidade, da
riqueza. Mais uma vez recorremos aos títulos de Léry para enfatizar esse aspecto: “Das árvores, ervas, raízes e frutos
deliciosos que a terra do Brasil produz”; “Da variedade de
aves, todas diferentes das nossas”.
Outro viajante que enfatiza as riquezas e a pureza do “Novo Mundo” é Pero Vaz de Caminha. Este descreve as
cores da natureza exuberante, a diversidade da fauna, assim
como a simplicidade e inocência das índias que andavam
nuas por todos os lugares sem nenhuma “vergonha
de mostrar suas vergonhas”. Mais do que essas gentes e
naturezas, o que de fato interessa ao olhar de Caminha é a
riqueza. Em uma carta ao rei de Portugal, o viajante conta
um episódio que demarca bem a intensa busca de ouro e
pedras preciosas, mostrando tanto aspectos do antigo mito
do Eldorado, quanto do caráter pragmático/exploratório
da colonização portuguesa.
Viu um deles [índio] umas contas de rosário, brancas;
acenou que lhas dessem, folgou muito com elas, lançou-as ao pescoço. Depois tirou-as e enrolou-as no braço e
acenava para a terra e de novo para as contas e para o colar
do Capitão, como dizendo que dariam ouro por aquilo. [E
continua] Isto tomávamos nós assim por assim o desejarmos
(CAMINHA, 1999: 4).
Sérgio Buarque de Holanda (2000) já afirma que os
portugueses não foram movidos por um espírito edênico,
isto é, não buscaram um paraíso da mesma forma que os
espanhóis. Motivados por uma mitologia ainda medieval
criavam e recriavam nos territórios, visões maravilhosas,
bem como por um pragmatismo pautado na necessidade
de catequização dos gentios no cristianismo e na busca de
riquezas florestais e naturais, dedomínio total sobre a natureza
e nos que nela habitavam. O ideário do maravilhoso, segundo nos relata Sérgio Buarque (2000), esteve presente,
com maior força, nas conquistas dos espanhóis, já o pragmático,
na colonização dos portugueses.
Os sinais de riqueza perseguidos desde o período
medieval, mais do que símbolos mágicos, foram objeto de
estratégias de ocupação e dominação por parte dos viajantes
e administradores coloniais. De fato, desde o início da
colonização da América Latina, o Brasil especificamente calcou-se no desejo edênico ainda de se encontrar as esmeraldas
que jorravam de cachoeiras, as madeiras de grande valor
e, principalmente, o ouro impulsionou, mesmo que em
níveis baixos, a colonização, a qual teve como meta feitorizar,
não povoar. Daí a dificuldade do deslocamento do litoral
para o interior do Brasil. E se o avanço para o desconhecido
se efetivou foi em busca de riquezas fáceis, tal como as
encontradas nas praias.
A caminho dos sertões mineiros
A busca pela riqueza decorrente dos metais preciosos é antiga e desde entãobusca-se incessantemente a riqueza
destes recursos naturais. Durante quatro séculos,
muitos aventureiros1 enveredaram-se pelas matas atrás de
prata, ouro e esmeralda. Estes seriam encontrados, em abundância,
em três lugares, a saber, Vapabuçu, Sabarabuçu e
Serra das Esmeraldas (HOLANDA, 2000), localizados nas
regiões dos vales do Rio Doce, Jequitinhonha e Mucuri. (...)
Uns índios dos que vivem “junto de hugram rio” tinham
chegado a Porto Seguro com a novidade de uma serra situada
em seu país, que “resplandece muito” e que, por esse
seu resplendor, era chamada “sol da terra”. Além de resplandecente
era a serra de cor amarelada e despejava ao rio
pedras dessa mesma cor, que se conheciam pelo nome de “pedaços de ouro”. Tamanha era sua quantidade que osíndios, quando iam à guerra, apanhavam os ditos pedaços
para fazer gamelas, em que davam aos porcos de comer
(IDEM, p. 45).
____________________________
1 O aventureiro é aquele que visa descobrir e explorar riquezas sem muito desgaste; aquele
que não busca um fim último, quer apenas um lucro instantâneo. No Brasil, o espírito de
aventura dos portugueses levou à utilização de métodos rudimentares, ruins e danosos na
agricultura e na mineração. Bons métodos exigiriam especialização e sistematização, exigiriam
trabalhadores, não aventureiros (HOLANDA, 1995).
____________________________
Para chegar a esses locais utópicos, os portugueses
criaram diferentes estratégias durante a colonização, como,
por exemplo, as Entradas. Estas visavam explorar territórios,
descobrir riquezas minerais, capturar e dominar indígenas
etc. Diferentemente das bandeiras, as entradas não eram
feitas por iniciativas particulares, eram, sim, um empreendimento
da Coroa Portuguesa. A primeira Entrada (1554),
sob o comando de Francisco Bruza de Espinosa e efetivada
no governo de Tomé de Souza, teve como principal objetivo
a descoberta da “montanha resplandecente”, porém não
conseguiu alcançar esse resultado. Apesar de não encontrar
as riquezas tão desejadas, tal entrada deu aos portugueses
uma maior quantidade de informações sobre os indígenas
e sobre as características geológicas e naturais do
terreno (ESPINDOLA, 2005: 35).
A Coroa Portuguesa investiu maciçamente na conquista
dos sertões durante os séculos XVI e XVII. Foram
mais de cem anos de fracassos nas investidas2: muitas mortes,
doenças, fome. Todavia, nos últimos anos do século
XVII, ao passar o projeto de descobrir riquezas em Minas
para Fernão Dias Paes, os sinais de fortuna concretizaramse:
Paes, mesmo não encontrando a Serra das Esmeraldas,
descobriu diamantes no vale do Jequitinhonha e ouro na
região do vale do Rio Doce (IDEM, p. 40). Iniciou-se, assim,
o chamado ciclo de exploração aurífera nas Minas Gerais.
Durante praticamente todo o século XVIII, o território
aurífero foi protegido por restrições de acesso: proibi-ram-se navegações nos rios que desciam para o litoral, bem
como a entrada em territórios que davam acesso a eles (região
leste/nordeste de Minas – vales do Rio Doce, Mucuri
e Jequitinhonha); impuseram o uso da estrada que ia de
Vila Rica para o Rio de Janeiro (Caminho Novo de Garcia
Rodrigues Paes), ficando proibidos, a partir de 1733, o tráfego
por outros caminhos. Além dessas restrições, os portugueses
também pensaram em estratégias de ocupação e
domínio dos indígenas agressivos: criaram presídios3, reduções
indígenas, aldeamentos, demarcaram terras, forneceram
ferramentas para a produção agrícola e enviaram
vigários paroquiais para o trabalho da fé – em outras palavras,
os portugueses estriaram o território que antes era liso.
_______________________________
1 Espindola (2005) apresenta um resumo das principais entradas que se efetivaram durante
os séculos 16 e 17: 1554, entrada comanda por Francisco Bruza Espinosa; 1567, comandada
por Martins Carvalho; 1573, comandada por Fernandes Tourinho; 1574, comandada por Fernandes
Dias Adorno; 1592, comandada por Gabriel Soares de Souza; (...) 1612, comandada
por Marcos de Azeredo; 1634, comandada pelo padre Inácio de Siqueira; 1646, comandada
por Domingos e Antonio de Azeredo; dentre tantas outras (pp. 33-40). Para uma história das
entradas em Minas Gerais: MAGALHÃES, Basílio de. Expansão geográfica do Brasil Colonial. 4.
Ed. São Paulo: Ed. Nacional; Brasília: INL, 1978.
_______________________________
A mineração possibilitou a ocupação da parte oeste
da bacia do Rio Doce. Ocuparam-se também regiões do Jequitinhonha
e do Pomba. Contudo,umlongo território permaneceu
estrategicamente “inabitado”: os “sertões do leste”,
as “áreas proibidas” ou “sertões do Rio Doce e Mucuri”.
As estratégias político-administrativas da Coroa exacerbaram
o caráter de sertão do leste de Minas: se antes
existia somente um mito sobre o sertão e seus perigos (simbólico
e não localizado geograficamente), a administração
portuguesa, ao tomar parte desses mitos e ao criar restrições
de acesso a esse lugar, foi capaz de forjar um espaço de
localização para o sertão (MÄDER, 1995).
A referência ao sertão como lugar distante ou longe
do litoral, ou no interior, não está relacionada a realidades
geográficas, mas a uma centralidade política; a maior ou
menor presença, controle ou proximidade do aparato administrativo,
jurídico, militar e eclesiástico (ESPINDOLA,
2005, p. 76)
Impedindo o extravio de ouro, os portugueses fixaram,
concomitantemente, um lugar do e para o estranho, um lugar para o nomadismo, um lugar propício para moradia
dos indígenas que não aceitavam as prerrogativas do
colonialismo. De fato, fugindo do contato, diversos índios,
dentre eles os Botocudos, foram habitar nas selvas dos vales
do Jequitinhonha, Mucuri e Doce.
_________________________________
1 “Presídio era a unidade militar composta por uma guarnição de soldados pedestres. Era um
lugar de degredo e, por esse meio, garantiam-se os elementos que poderiam ajudar na luta
contra os grupos indígenas, ao mesmo tempo em que a floresta e o medo dos índios impediam
as fugas” (ESPINDOLA, 2005: 51).
_________________________________
Mas o período mineratório entrou em colapso em
meados do século XVIII. Para ultrapassar a crise era preciso
dinamizar a economia, desvelar novas minas de ouro,
cultivar novos produtos – como o café –, explorar territórios
antes deixados de lado, diminuir os gastos de transporte
de mercadorias para a região mineradora e, além disso, expandir
os trabalhos ligados à área manufatureira (IDEM, p.
47-53). Tais incentivos/estratégias eram reflexo do governo
ativo e expansivo de Pombal.
Como efetivar essas mudanças? A solução encontrada
foi devassar o sertão criado estrategicamente pela Coroa
Portuguesa. Um único caminho de passagem e de exploração
já não era mais suficiente, ou melhor, era um impedimento
para o aumento dos lucros advindos da exploração
aurífera. O ato de avançar para o desconhecido, um exótico
estratégico e simbolicamente inventado, tornou-se mais uma
vez necessário. Assim, no final do século 18, o rio Doce foi
visto como a alternativa mais viável para a abertura de um
canal fluvial que colocasse a economia mineira em contato
com o mercado mundial (IDEM, p. 50).
Garantir a fronteira; povoar as áreas consideradas
estratégicas de modo que elas se defendessem por si mesmas;
fazer uso proveitoso das minas e riquezas que pudessem
ser descobertas nos sertões; fertilizar os campos com a
agricultura; estabelecer diferentes fábricas; abrir novos caminhos
(IDEM, p. 47).
Enfim, como estratégia de atendimento às recomendações
de Pombal seria a a construção de uma estrada passando
pelo sertão, isto porque, com ela, as terras bárbaras
poderiam ser povoadas – o que incentivaria conjuntamente
a agricultura e a exploração de ouro – e as transações mercantis seriam agilizadas. Nem todas, essas orientações puderam
ser levadas a cabo no século XVIII, servindo somente
de estímulo para a conquista de novos espaços. Elas foram
importantes para que se aumentassem o número de quartéis
e aldeamentos nos sertões, além de possibilitarem uma diversificação
da incipiente economia mercantil mineira.
BIBLIOGRAFIA
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Fundação BEMGE, 1999.
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SAHLINS, Marshall David. Ilhas de historia. Rio de Janeiro: J. Zahar,
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Ágora, Vitória, n.4, 2006, p. 1-33. Acessado pelo seguinte site: http://
www.ufes.br/ppghis/agora.
O RESGATE DA ESTATUÁRIA SACRA
DOMICILIAR DE MONTES CLAROS
Felicidade Patrocínio de Oliveira
Cadeira nÀ 20
Patrono: Camilo Prates
A arte, a devoção e os valores que um dia alimentaram
o espírito dos meus antepassados transferiram-se para
mim de maneira natural como num processo de extensão
do DNA e ainda persistem em meu ser, apesar das velozes
e contínuas mudanças das sociedades nestes dois últimos
séculos. Atribuo esta permanência paralela à absorção do
novo, a uma força que nos foi passada de maneira sublime
no recesso amoroso do berço por uma geração cuja forma
social fazia do núcleo familiar a fonte da formação ética e
da passagem dos mitos e ritos de uma ancestralidade que
ao originar uma cultura e um modo de ser e fazer, nos marcou
com o selo de uma identidade.
Mais do que orgulho, sinto felicidade por tudo isto,
mas percebo que este privilégio trouxe-me também obrigações.
Reflito então que se eu não puder oferecer em retribuição
algo de novo e que seja bomà vida dos que virão
depois de mim, devo obrigar-me pelo menos a preservar
e transferir o que de bomme foi oferecido. E isto vale para
os valores da consciência, para os bens culturais imateriais
e materiais.
Foi assim pensando que ao descobrir uma estatuária
sacra domiciliar em muitas residências de Montes Claros,
com expressivo valor artístico, histórico e devocional em
processo de desaparecimento e sem nenhum registro, decidi
mover uma ação que de alguma forma salvasse o que
ainda existe e levasse aos atuais e futuros conterrâneos o conhecimento desse bem que aqui existiu desde tempos
imemoriais e que foi por motivos diversos, conservado.
Foi após algumas visitas a uma parte significativa
desse tesouro advindo de outrora, que me vi motivada a
registrar, através de fotos num catálogo ilustrado e descritivo
e através das imagens de CD ROM e transmitir,
através de texto bem elaborado, a reflexão do fenômeno
dessa permanência como uma resistência da memória coletiva
desse povo. A presença persistente e silenciosa dessas
imagens antigas que sobreviveram em meio à profusão
de objetos modernos e que começou a ser descartada e
substituída por objetos sem valor identificatório, reclama
atenção e cuidado, já que para além de bens de posse privada
e por se tratar de um patrimônio de Arte e Memória,
pertence à toda a sociedade. O desaparecimento desses
elementos, através do desenfreado consumismo midiático
ou da solapagem de atravessadores capitalistas com
vistas ao lucro fácil, está a nos indicar a necessidade e urgência
quanto ao conhecimento, registro e preservação
desse material, mesmo que para isto tenhamos de recorrer às novas linguagens oferecidas pela tecnologia, como é o caso do catálogo fotográfico e registro em CD ROM
dessa imaginária, que pretendemos produzir.
Percebe-se que o homem, como tal, inexiste sem
MEMÓRIA, daí a importância de se pesquisar e revalorizar
aquelas representações que pertenceram ao imaginário
comum dos grupos que nos antecederam e que nos
foram transmitidos de maneira linear e afetiva na sucessão
de gerações.
Essa estatuária que pretendo registrar, já constatei, é
mais rica do que aquela das igrejas locais que foram esvaziadas
destes ícones na repercussão do Concilio Vaticano II. É grande a minha intuição de que essa presença, à primeira
vista com função decorativa, sinaliza uma resistência de um
povo forte, que convive dialeticamente com a Indústria
Cultural paralelo as suas tradições artísticas autênticas, sofrendo a influência da primeira, no entanto resistindo através
de uma efetiva conservação e participação nas manifestações
da cultura genuína.
No Brasil, a religião católica tem sido o grande espaço
para as pesquisas do patrimônio histórico. Sabe-se que
desde os primeiros séculos de colonização, além da catequese
exercida pelos jesuítas que se utilizaram da arte para
passar os dogmas, o culto das imagens foi transladado de
Portugal para o Brasil, estabelecendo-se um catolicismo “à
brasileira”, devido aos diferentes significados que os santos
aqui recebiam. Conserva-se, pois, ainda no Brasil, um
grande número de imagens de santos - executadas a partir
do século XVI, sendo muitas delas importadas de Portugal,
mas a maioria executada aqui mesmo e principalmente em
Minas Gerais, estado que exibe exuberância e magnificência
numa produção sacra regional, com características próprias.
Montes Claros estava na rota que abastecia a mineração
em Diamantina. Por aqui passou o historiador da arte
Saint Hillaire. Por aqui passavam os tropeiros e mineradores
subindo de São Paulo ou descendo da Bahia em busca
da rota da mineração. Esses viajantes carregavam nos seus
alforjes os santos das suas devoções.. Estes bens, testemunhos
de outros tempos são objetos que transcendem o seu
valor coisal; são relíquias que sugerem significados e importância
religiosa e cultural. Necessário se faz o resgate e
a sua reinserção nos espaços da cultura.
Ancorada na pessoa juridica do Instituto Histórico e
Geográfico de Montes Claros, e apoiada pelo seu atual presidente,
o escritor Itamaury Teles, proponho esta investigação
através de projeto elaborado e encaminhado ao Programa
Petrobras Cultural Edição/2012. É necessário verba
para o levantamento, a organização e o registro deste
acervo. O projeto priorizará a catalogação, análise e história
das esculturas sacras antigas, que aqui aportaram em
outros tempos e que foram passadas aos contemporâneos
pelos seus familiares ou por outros que aqui chegaram.
Problematizamos essa presença imutável, silenciosa e permanente
em meio a profusão de objetos modernos, ocasionalmente
substituídos, em inúmeras residências onde
colheremos imagens e informações. Defendemos que, o
que à primeira vista sugere uma função estética, na realidade
sinaliza a força e resistência da memória coletiva de
um povo voltado para as manifestações da arte e da cultura.
E antes que a modernidade caracterizada pela descartabilidade
solape com suas garras vorazes o que restou
desses bens culturais, nos propomos a uma imediata ação
em favor de sua preservação.
Outros fatores que justificam este projeto é que Montes
Claros, cognominada “cidade da arte e da cultura”, destaca-se no cenário nacional pela riqueza e diversidade de
suas manifestações artísticas; pela tendência do seu povo à devoção católica praticante (haja vista os movimentos
católicos, leigos, a quantidade de seminários e casas de
apostolado); é o segundo entroncamento rodoviário do
País; é um pólo universitário de expressão no contexto
nacional, sedia o maior Conservatório de Música do Brasil;
tem um folclore vivo e contagiante. Isso tudo numa área de 4.135 km2, com uma população estimada em torno
de 400.000 habitantes, ocupando lugar de destaque no
ranking das maiores cidades mineiras, distando 410 km da
capital, contando com mais de 10 emissoras de rádio, dispondo
de 3 emissoras de TV com geração de sinais locais,
3 jornais diários com circulação em todo o norte de Minas,
grande complexo industrial, inclusive comempresas multinacionais,
aeroporto capacitado para receber qualquer
tipo de aeronave, rede hoteleira consolidada, boa infraestrutura
urbana, berço de talentos que se projetam pelo
País, sustentando o título de “Cidade da arte e da cultura’
e, no entanto, ainda não possui museus históricos ou de
arte nem de espécie alguma. Este projeto visa pois, em um
primeiro momento, um registro daqueles ícones da devoção
que os tempos modernos substituíram pela televisão e outros eletrônicos. Inclui pesquisa de campo e bibliográfica,
catalogação e documentação descritiva, fotografias
de um acervo selecionado com texto reflexivo e culmina
com uma exposição de material selecionado que motivará,
por acréscimo, a criação do MUSEU DE ARTE SACRA
DE MONTES CLAROS.
O trabalho incluirá pesquisa de campo e bibliográfica.
Levará a um contato com a igreja que facilitará o acesso
aos “santos” dos paroquianos, contará com o trabalho de
equipes de universitários de áreas afins e com o PROGRAMA
PETROBRAS CULTURAL EDIÇÃO 2012, instituição
esta a qual recorremos para o patrocinio necessário. E é na
decisão deste programa de incentivo à Cultura da Petrobras
que depositamos a nossa confiança. É nesse incentivo
que reside a possibilidade deste resgate, pois no que se refere
ao material humano agenciador, colocamos à disposição
o nosso trabalho.
AMELINHA: FESTA NA MISSA
DE RESSURREIÇÃO
Felicidade Patrocínio de Oliveira
Cadeira nÀ 20
Patrono: Camilo Prates
Eu a conhecia à distância, nossa aproximação se deu
pela mútua participação na Academia Feminina de Letras
e no Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros.
Chamou-me a atenção a sua personalidade exuberante,
as suas vestes e ornamentos vistosos, a alegria incontida
e a sua autenticidade. Desde o inicio fizeram-se aparentes
as nossas afinidades, destacando entre todas, o gosto pela
cultura e a alegria de viver.
Naquele, pouco mais de metro e meio de pessoa, latejava
um coração de menina, de adolescente ardorosa e ao
mesmo tempo de uma mulher vigorosa que adquirira, ou
sempre possuíra a sabedoria do bem viver. Pouco sei da
vida de Amélia Prates Souto, mas sei que foi por um bom
tempo, diretora e educadora em uma das mais importantes
escolas fundamentais da cidade, o Grupo Escolar Gonçalves
Chaves. Sei também, que era viúva, genitora e progenitora
de uma extensa e fértil descendência, com filhos e netos
espalhados pelo Brasil e até Europa. No entanto, o primordial
sobre si mesma, ela oferecia desde o primeiro contato,
no acolhimento e na alegria. No seu abraço largo, cabiam
todos, sem discriminação de raça, cor, credo e preferências,
era o seu sorriso um convite à amizade.
Vaidosa, gostava da cor e se vestia de maneira jovem.
Braceletes nos braços, colares e brincos que variavam conforme
a ocasião. Gostava de escrever. Tive o prazer de conhecer
muitos dos seus artigos publicados em jornais da
cidade retratando uma Montes Claros antiga e bucólica.
Ausente da cidade no dia do seu repentino falecimento, ao retornar, eu fiquei chocada com a notícia. Não tendo
podido acompanhar o seu sepultamento, no sábado compareci
a sua missa de ressurreição na capela do asilo de São
Vicente de Paula.
Fiquei impressionada com tudo que vi. Pessoas em
quantidade lotavam o recinto, amontoavam-se pelos cantos
das paredes, nas portas e janelas, tentando encontrar
espaço espremiam o padre num diminuto canto do altar.
Todos queriam fazer-lhe uma última homenagem. Música
no ar, luzes, cantoria, leituras emocionadas de belos textos
sobre sua pessoa e vida, destacando-se o artigo de Yedde
Zuba, que a retratou fielmente.
Tocada pela beleza do momento retirei os olhos do
pároco oficiante e percorri com muita atenção todo o ambiente.
Lá estavam parentes, amigos, autoridades, religiosos,
a cultura da cidade. As pessoas estavam todas bem arrumadas,
até mesmo, elegantes. Aos meus olhos, era uma festa,
mais do que isto, uma linda festa e não poderia ser diferente
em se tratando de Amelinha. Quem viveu intensamente
como ela, quem foi ao mesmo tempo a Marta e a
Maria, figuras bíblicas evocadas no evangelho da sua missa,
só poderia mesmo festejar esta passagem como uma
mudança de vida. É que Amélia, além de ter escolhido viver
com alegria, acreditava na ressurreição, pois tinha já se
tornado ministra da eucaristia.
Por tudo isto, profundamente emocionada, fiquei a
imaginá-la no último instante, a olhar para o alto e a dizer
como o grande poeta Bandeira.......
“O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.”
Sua presença valeu Amélia. Muito obrigada.
*Artista plástica, membro da Associação dos Artistas Plásticos de
M.Claros, da Academia Feminina de Letras, e do Inst. Hist. Geográfico
de Montes Claros.
IMORTAL MARIA DE LOURDES OLIVEIRA
PINHEIRO, PATRONA DA CADEIRA Nº 8,
DA ACADEMIA FEMININA DE LETRAS
DE MONTES CLAROS
Geralda Magela de Sena Almeida e Sousa
Cadeira nÀ 34
Patrono: Eva Bárbara Teixeira de Carvalho
A ACADEMIA FEMININA DE LETRAS DE MONTES
CLAROS, formada com o intuito de reunir, destacar e
homenagear mulheres montes-clarenses, resultou de um
desejo acalentado no coração de uma dentre as grandes
mulheres destas terra, cujo nome é por todos reverenciado
e conhecido: Yvonne Silveira.
Postou-se à frente e pouco a pouco eram muitas as
mulheres reunidas que abraçavam o seu sonho e juntas o
tornavam realidade.
E como é próprio das Academias de Letras, foram
selecionados entre tantos e tantos nomes dignos de tal honraria,
quarenta nomes de mulheres que se destacaram nos
diversos setores da vida de Montes Claros e também somaram
esforços na construção da grande metrópole que se tornou.
Essas mulheres têm os seus nomes com toda honra
estabelecidos em Cadeiras de Imortais.
Inicia-se dai um movimento por onde passarão e também
deixarão gravados seus nomes aquelas que nas Letras
ou nas Artes, de diferentes formas contribuirão para honrar
suas Patronas ou Antecessoras,dinamizando e dando continuidade
ao engrandecimento cultural de Montes Claros.
Tive a honra de ser convidada para unir-me a estas
mulheres e sonhar juntas o sonho de criar a Academia Feminina
de Letras. Hoje é uma maravilhosa realidade que
vem se fazendo conhecer dia a dia abrilhantando e dinamizando
o cenário cultural de nossa cidade.
Coube-me a distinção da Cadeira nº 8, cuja Patrona é
Maria de Lourdes Oliveira Pinheiro – Dona Taúde. Nesta
oportunidade ressalto a grande mulher que foi relembrando
e deixando registrados aqui traços e momentos de sua
pessoa e vida entre nós.
Tinha uma irmã gêmea de nome Maria Ilza Oliveira
que se tornou religiosa da
Congregação do Sagrado
Coração de Maria com o
nome de Irmã Ilza, a quem
carinhosamente chamavam
de Mainha, falecida
em. 26/05/2001.
MARIA DE LOURDES OLIVEIRA
PINHEIRO era seu nome, mas
todos a chamavam de Dona Taúde.
Filha da mestra Augusta Aurora de
Andrade e do comerciante João
Nobre de Oliveira, nasceu em16 de
outubro de 1907.
Casou-se com o português
Custódio Rodrigues
Pinheiro. Filhos não tiveram.
Adotaram uma menina
a quem deram o nome
de Maria de Fátima, que
veio a casar-se com Tarcisio
de Sena Almeida e tiveram
5 filhos. Também com
eles esteve o Roberto de
quem cuidaram e educaram.
Assim era constituído
o seu núcleo familiar.
Começou seus estudos
em Montes Claros continuando-os, como aluna interna,
no Colégio Sacre Coeur de Marie, em Belo Horizonte.
Contava que a primeira viagem que fizeram com
destino a BH, para estudar, foi bastante agitada. Até Bocaiúva a viagem foi feita a cavalo. A distância era tamanha
e chovia tanto que tiveram de dormir onde os tropeiros
pernoitavam.
A vida estudantil tinha sua graça, apesar de longe de
casa e fechada em um internato. Apreciava brincadeiras
como a de passar pela sua irmã gêmea, enganando a muitos
e dando boas risadas. Gostava de ser irreverente. No
internato, na hora do banho, estava sempre a quebrar as
regras deixando de usar a habitual camisola para se banhar,
conforme costume da época.
Quando jovem gostava de música, dança, namorados
e do piano; Como professora iniciou sua atividade profissional
no Grupo Escolar Gonçalves Chaves. Foi também Professora
de Geografia, no ginásio Diocesano Monsenhor
Gustavo. Na Escola Normal “Prof. Plínio Ribeiro” foi professora
de Desenho e secretária, no período que D. Dulce
Sarmento foi Diretora.
Anos adiante assumiu a direção da Escola Normal
marcando com brilhantismo sua presença naquele educandário.
A vida profissional não a impediu de ser a fiel escudeira
do marido. Mulher de visão alinhou-se com ele em
muitos projetos. Dentre eles a “Alfaiataria Montes Claros”
onde ela fazia os desenhos e ele executava. Depois
partiram para o que na época chamavam de “bar”. Entrou
numa roda-viva de trabalhar na escola e a noite (madrugada)
fazer os bolos, cremes e doces para no dia seguinte
colocar no bar. Gerou um stress de tal ordem que
teve de se tratar em Belo Horizonte.
Já recuperada, mais uma vez se empenharam num
grande projeto: o do “Hotel Santa Cruz”. Por lá passaram
incontáveis pessoas que marcarampresença e hoje são parte
da história de Montes Claros. Vários foram os hóspedes
que se tornaram grandes amigos e a muitos deles ajudaram
a formar na vida.
Em1963, Dona Taúde aposentou-se na função de educadora e o Sr. Pinheiro aposentou-se pelo Instituto Nacional
de Previdência Social - INPS (atual INSS). A partir de
então passaram a curtir a companhia um do outro até a
morte dele, em Março de 1991. Movida pela paixão e saudades
Dona Taúde o seguiu trinta dias depois. Era o dia 11
de abril de 1991, quando ela veio a falecer aos 93 anos.
Conta, sua neta Christiana, que ela era um pessoa
muito extrovertida. E que se lembra das vezes que, chegando
de um velório, descrevia horrorizada a falta de respeito,
as conversas impróprias e, como costumava dizer,
as trocas de receitas que lá aconteciam. E de como era divertido
vê-la descrever com detalhes como queria o seu
velório! Rosas vermelhas, nem pensar. O mais importante
e que não poderia ser esquecido, era o som ambiente. E
o seu desejo foi atendido.
Dona Taúde possuía convicções próprias, avançadas,
apesar de uma certa idade. Convicções até hoje bem atuais
como: “marido numero um é o emprego”, “toda mulher deve
ter uma profissão”!
Participou do Grupo Lisieux. Pontualmente ia às reuniões
e tinha prazer no trabalho que executava com as companheiras.
Gostava de usar vocabulário francês em cumprimentos
e outras situações. Como boa esposa integrou e
acompanhou o marido nas reuniões e atividades do Elos
Clube de Montes Claros. Amante incondicional de cocacola,
ela tinha esse refrigerante como parâmetro da qualidade
das festas. Seus netos costumavam dizer que para ela
coca-cola era um Santo Remédio.
Quando chegou num mais avançado da idade, sempre
que fazia alguma atrapalhada logo ia contar para eles e
isso era motivo de graça para todos. Teve a alegria de conhecer
as bisnetas Rhuanna, Jordanna, Lorenna e Flávia.
Como avó era daquelas que sempre tinha um troco ou um
doce para os netos.
Christiana lembrou, também, de uma situação que
sempre foi motivo de boas gargalhadas, era o fato dela ADORAR!!!, literalmente, o genro Tarcísio. Era mais um filho
do que um genro. E os netos, já crescidos, “caiam na pele
dela” por isso.
Como um merecido reconhecimento e homenagem
da comunidade montes-clarense pela sua vida e trabalho,
uma escola estadual na cidade recebeu o seu nome: “Professora
Maria de Lourdes Oliveira Pinheiro”.
Ter Dona Taúde como Patrona é, para mim, motivo
de grande orgulho. Pelo ser humano que conheci, pela
montes-clarense que foi, por sua relevante participação
no campo da Educação faço aqui minha homenagem a
esta grande mulher. E tenho a oportunidade única e feliz
de poder homenagear ao mesmo tempo, por extensão,
ao meu irmão Tarcísio, minha cunhada Fátima e os meus
sobrinhos: Leonardo, Ilza, Christiana, Ricardo (afilhado
querido, já falecido) e Bernardo, juntamente com suas
famílias constituídas!
Dona Taúde, e seu esposo Senhor Custódio Pinheiro
1º DE FEVEREIRO DE 1953
Haroldo Lívio de Oliveira
Cadeira nÀ 82
Patrono: Nelson Viana
Nada de especial para a História do Brasil, trata-se de
uma data íntima transcorrida há exatamente sessenta anos.
Parece que foi num domingo e parece que foi ontem. Nada
como o tempo para passar, segundo Vinícius. Recordo-me
do embarque, na jardineira de “seu” Chiquinho Ramos,
pilotada por seu filho Walter Zorro, que usava um chapéu
de cangaceiro e era assessorado pelo trocador Pedrito Andrade.
Saímos ao meio-dia das Contendas (atual Brasília de
Minas) e chegamos a Montes Claros já com as luzes acesas,
muito contentes por termos feito ótima viagem. Particularmente,
tinha minhas razões especiais de estar feliz, pois tinha
sido presenteado, ao embarcar, com dez notas de cem
cruzeiros, oferecidas, gentilmente, pelo coronel Francisquinho
Antunes, amigo de meu Pai e meu também. Cheguei
abonado para dar início à busca por um lugar ao sol, numa
terra rica de oportunidades e perspectivas positivas.
Tinha quatorze anos de idade, boa saúde, vontade
de aprender e subir na vida, começando pela matrícula no
curso ginasial, o que já era um passo muito largo, no caminho
de flores e espinhos que sabia resumir a luta pela
vida. Era mais um migrante a engrossar a população desta
cidade hospitaleira, que já andava pela casa dos trinta
mil habitantes. Hospedei-me na Pensão Madureira, na Rua
Dr. Santos, 19, onde já morava o mano Fernando. Na primeira
noite, depois do jantar, saímos saciando minha curiosidade
de neomontesclarense, já que estivera aqui, rapidamente, aos onze anos.
O edifício mais alto era a catedral, deslumbrante aos
meus olhos adolescentes. Havia ainda os prédios do Hotel
Santa Cruz, do Edifício Pedro Montes Claros, em frente ao
Clube Montes Claros, todos de três pavimentos. As ruas de
Baixo ostentavam orgulhosos sobrados, onde moravam as
famílias mais antigas. Causaram-me agradável impressão
as bem decoradas vitrinas das lojas, coisa de cidade grande.
Loja Americana, Casa Ramos, Casa Alves, A Imperial,
que realçavam o encantamento das ruas movimentadas pelo
vaivém. Era o “footing” da Rua 15 fervilhando de beleza e
mocidade. Eram o Big Bar, o Minas Bar, o Bar Soberano, de
clientela fina e elegante. Era o Restaurante Valério, de cozinha
internacional. Montes Claros já tinha linha aérea. Mesmo
assim era pequena (e feliz). Havia apenas um juiz de
direito, um promotor de justiça, um delegado de polícia e o
destacamento policial. Compare estes dados com os números
apresentados sessenta anos depois. Montes Claros é
mesmo o coração robusto do sertão, não resta a menor dúvida.
Recordo-me, com nitidez, de que os nomes mais citados,
nas conversas de rua, eram os do prefeito capitão Enéas
Mineiro de Souza,paraibano, do bispo diocesanoDomLuiz
Victor Sartori, gaúcho de Santa Maria, e do gerente do Banco
do Brasil, o baiano Francisco Barbosa Cursino. Montes
Claros sempre foi uma cidade cosmopolita, com gente do
mundo inteiro, sendo esta uma das razões de seu crescimento
gigantesco. Aqui encontrei, em 1953, a imprensa de
então, composta do novíssimo O Jornal de Montes Claros,
do jovem Dr. Oswaldo Antunes; da antiga Gazeta do Norte,
do cavalheiresco Jair Oliveira; e da Rádio Sociedade Norte
de Minas ZYD-7, vivendo sua idade de ouro de Mané Juca
e Chico Pitomba, mais Gregório Barrios, Orlando Silva,
Dalva de Oliveira e outras estrelas. Todavia, não encontrei
os escritores Luís Carlos Novaes e Raquel Mendonça, que
nasceriam meses depois da chegada deste migrante.
MONTES CLAROS CRIANÇA EM 1953
Haroldo Lívio de Oliveira
Cadeira nÀ 82
Patrono: Nelson Viana
Esta crônica é só para registrar lembranças que não
couberam na outra em que contei minha chegada nesta cidade,
há sessenta anos passados. Não falei do mercado
municipal, onde pulsava o coração da pequena metrópole
sertaneja. Era ali, por perto dele, que aconteciam os fatos
mais importantes do cotidiano. Negócios, comícios, mortes,
prisões. Quem fosse ao mercado voltava para casa sempre
trazendo novidades. Seu relógio marcava as horas e era
ouvido longe, porque não havia o barulho do trânsito nem
prédios altos impedindo a propagação do som. Já que falei
de trânsito, antes que me esqueça, quero lembrar que a cidade
contava com apenas um guarda de trânsito, o inspetor
Pimentel, do DET, que ficava na esquina de Dr. Santos
com a Praça Dr. Carlos Versiani orientando o fluxo de veículos.
Nesse caso, o guarda podia chamar o condutor do
carro pelo nome, uma vez que havia poucos carros. Possuir
um carro era luxo permitido a milionários, como o capitão
Enéas, Osmane Barbosa, João Athayde, Oldemar Santos,
mais alguns outros pecuaristas e industriais. O jovem cirurgião
Konstantin Christoff e outro rapaz, Bolivar Silveira,
tinham carro conversível. Nem o gerente do Banco do
Brasil tinha carro, e seus funcionários iam para o trabalho
de bicicleta. Diferentemente de hoje, era um tempo romântico
e saudável...
Já que falei em romantismo, quero evocar o Montes
Claros Tênis Clube, ou seja a Praça de Esportes, que era asala de visitas da cidade. Toda a beleza e suavidade de nossa
urbes se resumia neste logradouro de ar puro, paisagem
verde e céu azul de anil. Quem não fosse sócio da praça,
estaria fora da história e da geografia da cidade. Era um
pedaço do paraíso transportado para cá e plantado na várzea,
um jardim de delícias da juventude.
Mas a cidade era bem menor. Ainda não existiam
bairros como o Todos os Santos, Jardim são Luis, Melo,
Major Prates, Delfino Magalhães, Planalto. O São José estava
sendo medido para loteamento. A Vila Guilhermina estava
recebendo as primeiras moradias. Lembre-se que a
Avenida Coronel Prates terminava em frente à Santa Casa
e era limite do perímetro urbano. A cidade, realmente, explodiu
e multiplicou-se, como fogos de artifício, clareando
e abrindo novos caminhos.
Funcionavam, aqui, três bons cinemas: o São Luís, o
Coronel Ribeiro e o Ypiranga. Os filmes de maior sucesso,
em 1953, formando extensas filas, foram O Cangaceiro, nacional,
e Sansão e Dalila, de Cecil B. de Mile, com Victor
Mature e Susan Hayward. O antigo Cine Montes Claros
estava fechado para reformas e no local funcionava a churrascaria
do gigante Leon Soltz, que era gaúcho e não estrangeiro.
Os tipos populares, muito encontrados nas ruas,
eram o pintor louco Alá-laô, que tocava violão, cantava e
trabalhava nos raros momentos de lucidez; Juscelino, um
doido calado que veio de Bocaiúva; Geraldo Tatu, no início
de sua carreira, totalmente inofensivo; uma garota da vida
fácil chamada (impiedosamente) de Chimbica, que poderia
ser uma doente mental; outros menos expostos, e finalmente
Mané Quatrocento, que era trabalhador e artista,
apresentando-seemprogramas de auditório da ZYD-7 como
cantor e galã. Montes Claros montesclareava e tinha de
tudo um pouco.
VELHA FOTOGRAFIA
Itamaury Teles de Oliveira
Cadeira nÀ 84
Patrono: Newton Prates
Uma velha fotografia vem causando em mim, nosúltimos meses, certo fascínio. Retrata uma Montes Claros
varrida do mapa para sempre, pois todas as edificações que
nela aparecem foram derrubadas, em nome do progresso...
Em plano destacado, à esquerda, o antigo mercado
municipal, inaugurado em 3 de setembro de 1899, no apagar
das luzes do século 19. Nove enormes portas permitem
o fluxo de pessoas, no vaivém das compras semanais. Em
duas delas, toldos de lona impedem a entrada do sol da
tarde. Encimando as cinco portas centrais, cinco janelas
redondas, para iluminar e ventilar o interior da casa de comércio.
A torre altaneira, de madeira, exibe o grande relógio,
que regula o tempo da pequena cidade.
No centro da foto, vê-se a atual Rua Dr. Santos – que,
então, denominava-se Rua Bocaiúva – com seu casario baixo,
em que se sobressai um arremedo de sobrado, à esquerda.
No lado direito da rua, uma vetusta construção senhorial,
com janelas que lembram as ventanas das catedrais.
Na metade da foto, para baixo, vê-se uma profusão
de animais selados e senhores usando chapéus e ternos de
brim. No meio da rua, calçamento poliédrico rudimentar.
Esta foto pertence ao acervo da historiadora bocaiuvense
Bim Brandão, e foi gentilmente cedida a mim para
figurar na capa da nona edição da Revista do Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros. Estava um pouco estragada,
mas foi devidamente recuperada pelas mãos há-beis da designer Jamille Lessa.
Doravante, essa publicação doIHGMCestampará nas
suas capas fotos de edificações importantes da cidade, que
deveriam ter sido tombadas pelo Patrimônio Histórico mas
que, infelizmente, foram derrubadas pelo homem.
O que nos chamou mais a atenção na referida fotografia
foi o ângulo escolhido. As fotos do antigo mercado
de Montes Claros têma característica de serem tiradas sempre
de frente. Esta, ao contrário, a tomada feita pelo excelente
fotógrafo desconhecido traz a velha construção vista
lateralmente, de modo a contemplar a então Rua Bocaiúva
- que também já se chamou Bonfim...
Outro detalhe que nos aguça a curiosidade, como historiador:
qual a data da fotografia?
Bem, como não há essa informação disponível, procurei
verificar detalhes passíveis de revelar a idade da foto.
O primeiro, e mais significativo detalhe, foi a existência, no
lado direito da Rua Bocaiúva, de dois postes de iluminação
pública. Por esse detalhe, pode-se afirmar que a foto é posterior
ao dia 20 de janeiro de 1917, pois a luz elétrica foi
inaugurada nesse dia, proveniente da cachoeira do Cedro,
em usina idealizada e posta em execução pelo industrial
Francisco Ribeiro dos Santos - conhecido por Cel. Ribeiro.
Arrisco ainda outro palpite para estimar uma data
máxima para a bela imagem da Montes Claros de antigamente.
A inexistência de veículo na fotografia é outro aspecto
digno de nota. Por isso mesmo, a referida fotografia
deve ser, no máximo, de 1920. Explico: segundo o historiador
Hermes de Paula, o primeiro caminhão chegou a
Montes Claros no dia dez de novembro de 1920. Um mês
depois da chegada do primeiro “bicho caminhão” - como
fora apelidado por aqui -, dois novos veículos foram adquiridos
- um caminhão e um automóvel -, pelo
Cel.Francisco Ribeiro dos Santos. Logo depois, Dona Carlota
dos Anjos - viúva rica que sofria de “cravos” na planta
dos pés - adquiriu uma “baratinha” Ford, último mode lo, para ver o “progresso da cidade”...
Mas por que esse fato pode ter tamanha importância
histórica? Evidentemente, o número de carros era sinal de
progresso de uma cidade, nos albores do século 20. E Montes
Claros, à época da foto, certamente não possuía carro
algum, senão seria mostrado nessa imagem. Essa praça era
a principal e mais movimentada da cidade. Se aqui existissem
carros, provavelmente estariam ali estacionados, mesmo
que só para aparecer nessa importante e bela imagem.
Como ótimo fotógrafo que demonstrou ser – pelo ângulo
escolhido e pela qualidade da imagem –, esse insigne desconhecido
jamais deixaria de convocar os proprietários de
automóveis para exibirem suas jóias, e ao lado delas aparecer,
devidamente trajados de fraque e cartola...
HOMENAGEM AO PATRONO
Juvenal Caldeira Durães
Cadeira nÀ 81
Patrono: Nathércio França
Na edição I desta Revista, escrevi um breve histórico
sobre os primórdios da aviação em nossa cidade, citando
algumas passagens do cometimento e nomes de seus principais
precursores. Agora, sirvo-me de alguns trechos daquele
trabalho para ilustrar este artigo que faço com a intenção
de homenagear Nathércio França, um daqueles colaboradores
da história de Montes Claros, que honrosamente
tomei como Patrono/IHGMC.
Nathércio França,
com brilhante atuação
na frente do movimento
de implantação
da aviação em
Montes Claros, participando
das construções
de suas obras e de outros
empreendimentos
necessários ao desenvolvimento
de um sistema
aéreo que, apesar
de parco e elementar,
nos legou uma obra
florescente que acompanhou,
com o passar
do tempo, o crescimento da cidade, dotando-nos, hoje, de eficiente e luxuoso
meio de transporte.
Nathércio França e sua mulher Nina
(Álbum de família)
“O Aeroclube de Montes Claros” foi fundado oficialmente
em 11 de junho de 1939, porém, suas atividades foram
paralisadas no período de 1952/67 por motivo administrativo.
Aquela Associação tinha trinta e dois sócios nas
seguintes categorias: efetivos, honorários, beneméritos e
remidos. E recebeu da Campanha Nacional da Aviação patrocinada
por Assis Chateaubriand, o avião Piper Club 65 –
Prefixo PP-TMD, doado pela Prefeitura do Rio de Janeiro –
Administração Henrique Dodsworth e recebeu, também, a
aeronave de prefixo PP-TTO, doada pela Colônia Israelita
do Rio de Janeiro.
João Leopoldo conta, com certo orgulho, que seu pai
Nathércio França e o amigo e colega de turma, Flamarion
Wanderley, foram os fundadores do Aeroclube de Montes
Claros, com sede provisória numa sala do 1º andar da antiga
Casa Alves, localizada no centro da cidade. Conta ainda
que o piloto Nathércio foi obrigado a fazer uma aterrissagem
forçada no meio do mato, com seu teco-teco, enquanto
conduzia o advogado Dr. Carlos Mota a uma cidade vizinha.
Todavia, foram socorridos por fazendeiros da região,
sem maiores conseqüências. João lembra ainda das piruetas
e vôos rasantes de seu pai e das apreensões de sua mãe
com suas orações para proteger o marido extravagante.
A primeira diretoria do Aeroclube foi composta pelos
fundadores:
Presidente: Levy Lafetá
Secretário: Álvaro Marcílio
Tesoureiro: Nathércio França
Diretor Técnico: Flamarion Wanderley
Presidente de honra: Antônio Teixeira de Carvalho.
As primeiras turmas tiveram como alunos:
Antônio Lafetá Rebello (Toninho Rebello), Ormezindo
Lima (Maroto), Mário Rodrigues (Marinho Alvorada),
Judith Alves (Juju), Márcio Magnus Cardoso (Marinho) e outros que formaram um grupo de destaque dando início à
aviação de Montes Claros.
Montes Claros é uma cidade simples, com seu centro
antigo de ruas estreitas, mal cuidadas, com trânsito confuso
e sem grandes atrativos turísticos. Por outro lado, ela
cresce vertiginosamente, ampliando os seus recursos e seus
bairros nobres. Além disto, é uma cidade cosmopolita, que
abraça os seus filhos natos e de coração, dos quais saem os
mais ilustres homens que ficam na sua história com louvor,
como esses precursores da aviação de nossa terra, que eu
tive a sorte de conhecer e até de conviver com alguns deles,
que aqui destaco.
Nathércio França era um desses precursores. Simpático,
atencioso, íntegro e de delicadeza incomum, dotes que
me levaram a escolher o seu nome para patronear-me no
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros (IHGMC)
e o que motiva a deter-me, um pouco mais, sobre a sua
pessoa neste contexto.
Ele procede de uma família tradicional da cidade de
Araguari-MG e nasceu em 05/09/1905. Foi transferido para
a cidade de Montes Claros a serviço do Banco Comércio e
Indústria S.A. em 1929, onde conheceu Antônia de Andrade
Alves (Nina), filha do famoso casal Dr. João Alves e Dona
Tiburtina, com quem se casou aos 26 anos de idade, em 1931,
e tiveram um casal de filhos. Estagiou-se no Rio de Janeiro,
com seu colega e amigo Flamariom Wanderley, onde foram
brevetados e se tornaram pilotos civis do Brasil, com
condições para fundar o Aeroclube de Montes Claros.
Nathércio França recebeu o título de Cidadão Montesclarense
pela Câmara por ter desempenhado funções na
comunidade, tais como:
-Um dos fundadores da aviação e do Aeroclube de Montes Claros;
- Fundador do Rotary Clube Norte;
- Secretário da Companhia Energética – MG;
- Secretário da CAEMC (Companhia de Água) e da Telemig;
- Foi componente da diretoria da Associação Comercial e Industrial de Montes Claros;
- Representante da RENNER, aproximadamente, 30 anos;
- Representante da CHEVROLET, 10 anos aproximadamente;
- Trabalhou na Nacional Aéreo por 10 anos.
Aos 46 anos de idade, o Sr. Nathércio perdeu a filha,
Geralda Maria Alves França, proveniente de uma cirurgia
de apendicite. Com esse transe, ele abandonou a aviação
em intenção à filha, que sentia apreensões, juntamente com
sua mãe, durante seus vôos rasantes e piruetas no céu dos
montes claros.
Em 1958, ele estabeleceu a loja Renner, que teve continuidade
com o filho João Leopoldo. E aos 76 anos de idade,
quando exercia a liderança espírita na Fraternidade
Canacy, veio a falecer proveniente de câncer no estômago.
Deixou esposa, filho, nora, netos, netas e muita saudade.
Apesar de seu esforço e de suas realizações em prol
da aviação local e do desenvolvimento social, comercial e
empresarial de Montes Claros, não foi lembrado para dar
seu nome, pelo menos, a um dos monumentos originários
de suas lutas e de seus empreendimentos.
* * *
Acrescento ainda o discurso dirigido ao homenageado,
proferido pela sua nora Maria Divina Tanury França,
no qual a escritora relata um apanhado bibliográfico e um
acervo de virtudes enaltecendo, com justiça, seu saudoso
sogro, como vejamos abaixo:
“Deram-me a incumbência de falar sobre o Sr. Nathércio.
Muito simples seria transcrever dados das certidões
de nascimento, casamento e mais alguns apanhados de trabalhos
aqui realizados em Montes Claros sem nenhum interesse
político e pessoal.
Antes, porém, tenho o dever moral de apresentá-lo
aos senhores não somente como cidadão montes-clarense título conferido a ele pela Câmara Municipal. Quero e sei
falar do senhor Nathércio como ser humano, como esposo,
como pai, avô, amigo, irmão de fé.
Não preciso entrevistar amigos seus, os quais, tenho
certeza, teriam orgulho em citá-lo como talvez o mais sincero
e cordial.
Os testemunhos que aqui dou foram vivenciados ao
longo de 12 anos de convivência debaixo do mesmo teto.
Falo com o coração de filha agradecida e respeitada, pelo
pai maravilhoso que a Providência Divina colocou no meu
caminho, através do matrimônio com seu filho João Leopoldo.
Nunca fui nora para o Sr. Nathércio; se todas as noras
tiverem a sorte que tive, não sentiriam falta de um outro
pai.
Como esposo, era modelo de paciência, doçura. Pai
amoroso, amigo, conselheiro. Quem em Montes Claros não
viu por muitas vezes pai e filho descerem para o trabalho e
voltarem juntos, como dois irmãos muito unidos?
Como disse, foram 12 anos de muitas alegrias e muita
paz. O nosso lar era como um barco na maioria das vezes
navegando em águas calmas. Como é muito natural em família, às vezes as águas se agitavam, mas as mãos seguras
do meu sogro seguravam o leme e a brandura do seu coração
se derramava graciosamente, trazendo de novo a calmaria.
O seu Nathércio era tão participante e zeloso com a
família que eu ao esperar o primeiro filho, foi ele, o avô
coruja, que cuidou dos mínimos detalhes como o quarto do
bebê, cor das paredes, carrinho, etc. E a única maneira de
agradecer tanto desvelo com a futura mãe e o seu primogênito,
foi dar a este o nome do avô: Nathércio. Íntegro, puro
de coração, caráter sem mácula.
Outros netos vieram a ele, foi só dedicação. Sempre
tinha alguns minutos para brincar com seus netinhos.
Montes Claros foi quem ganhou abrigando em seu
seio tão elevado espírito vindo de Araguari, onde nasceu, e aqui conhecendo sua esposa, Dona Nina filha de políticos,
ele tornou-se membro daquela família, usando de habilidade
necessária para não envolver-se politicamente, criando
grande círculo de amizade e nenhum inimigo.
Foi tesoureiro da CAEMC (hoje COPASA) durante
algum tempo, apenas pelo espírito de cooperação que lhe
foi solicitada.
Com Flamarion Wanderley, fundou o Aeroclube de
Montes Claros.
Foi gerente da Nacional Transportes Aéreos, hoje
Varig. Presidente da Aliança Municipal Espírita trabalhou
com extremado zelo.
Foi membro da Diretoria da Associação
Comercial e Industrial e também comerciante.
Seus amigos jamais o esquecerão. E nós, seus parentes,
sentimos a dor pungente de saudade, mas é nosso orgulho
sadio de tê-lo tido nesta vida como nosso chefe e hoje,
num mundo de Luz, a certeza de que continue sendo o guardião
de nosso lar.”
* * *
Com as transcrições acima, pude ilustrar este trabalho
e dar uma amostra, ainda que superficial, das contribuições
que Nathércio França legou à cidade e à região, sem
interesse de se beneficiar com seus feitos. Ele era uma pessoa
impoluta e desprendida. Dividia o seu tempo com obrigações
familiares, com afazeres cotidianos, com obras sociais
em benefício do próximo desamparado e ainda com o
progresso da cidade.
Deixou saudade entre seus amigos e família constituída
pelo seu filho João Leopoldo que vive no elegante bairro “Setor Jaó” da bela cidade de Goiânia em companhia de
sua nobre e graciosa família, seguindo os passos e princípios
dignos de seu saudoso pai.
Assim, eu procurei testemunhar e homenagear uma
pessoa digna de valor e de nosso reconhecimento, com
quem tive o privilégio de conviver por longos anos e de
tomar-lhe como meu Patrono no Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros / IHGMC.
As pessoas tornam-se eternizadas pelas boas obras
que constroem em benefício próprio e de seu próximo.
O 10º BATALHÃO EM BRASÍLIA (DF)
Cel. Lázaro Francisco Sena
Cadeira nÀ 55
Patrono: João Luiz de Almeida
A participação do 10º Batalhão no movimento cívicomilitar
de 1964 foi sintetizada pelo historiador e sociólogo
João Camilo de Oliveira Torres, em sua obra Razão e Destino
da Revolução, publicada ainda no final daquele ano:
“Uma operação menos focalizada pelo noticiário e
talvez mais difícil foi a do 10º Batalhão da Polícia Mineira,
sob o comando do Tenente-Coronel Georgino Jorge de Souza.
Deslocando-se de Montes Claros em direção a Paracatu – seu objetivo era fechar a porta da Capital – esta tropa, por
estradas apenas carroçáveis, atravessou o território mineiro
de Leste a Oeste, numa arrancada fulminante, digna de
um Rommel. As tropas da guarnição da capital volverama
suas posições originárias, para balizar afinal a entrada do
batalhão mineiro em Brasília. Foi um feito de armas que,
embora incruento, revelou capacidade de movimentação,
poder de direção, competência dos comandantes e bravura
de nossos soldados.”
O boletim interno nº 59, de 31 de março de 1964, uma
terça-feira, ao publicar a “ordem do dia” do comando da
Unidade para a quarta-feira seguinte, reflete a mais pura
normalidade para a tropa, inclusive prevendo chamada às
07h00 e dispensa às 12h00, após a revista geral, como já era
o costume naquela época. O então tenente Antônio Moreira
Neto foi escalado para 1° de abril como “fiscal de dia” e
não “oficial de dia”, como deveria ser em caso de qualquer
possibilidade de alteração da ordem, situação em que o ofi-cial, obrigatoriamente, deveria pernoitar no quartel. Mas
não foi o que aconteceu...
É preciso relembrar que, política e ideologicamente, àquela época, as nações se encontravam polarizadas, sob a
síndrom da “guerra fria”: de um lado os Estados Unidos
da América, como símbolo do capitalismo, e do outro a extinta
União Soviética, como timoneira do comunismo. O
pobre planeta terra vivia sobressaltado com as ameaças recíprocas
de emprego dos arsenais atômicos, o que seria capaz
de varrer, de uma só vez, toda forma de vida então
existente. A União Soviética havia “conquistado” Cuba e
ali implantado o seu regime comunista, criando, na antessala
dos Estados Unidos, uma base estratégica para chegar
aos demais países do continente americano e neles implantar
a sua ideologia política. É claro que o Brasil, pela sua
dimensão territorial e pelo potencial econômico, transformou-se no alvo principal. Junte-se a isso a pusilanimidade
e a leniência do governo brasileiro, instabilizado após a renúncia
do presidente Jânio Quadros, em agosto de 1961.
Para a nação brasileira de então, era iminente e, ao
mesmo tempo, inadmissível a implantação do comunismo
ateu em nosso país, rompendo toda uma tradição cultural de
fundamentos cristãos e democráticos. As forças conservadoras
se insurgiram e o povo foi às ruas, paramentado de símbolos
religiosos, para afastar o perigo da sovietização e implantação
da ditadura do proletariado, de tão funestas conseqüências,
como ainda o atestam os regimes políticos de
Cuba e da Coreia do Norte. Nasceu daí o movimento cívicomilitar
que derrubou o governo tendencioso do presidente
João Goulart, que por duas décadas foi chamado “Revolução
de 31 de Março de 1964”, e que, logo após e até o presente,
passou a ser tratado como “Ditadura Militar” pelos meios
de comunicação dominados pela ideologia “esquerdista”.
Dentro de tal ebulição política que ameaçava a República,
não era de se esperar outra coisa das forças armadas,
pela sua competência legal e movidas pelo espíirito cívico, senão que assumissem o comando do movimento e espantassemde
vez aquela intervenção estrangeira em nosso país.
Como força reserva do Exército Brasileiro, e atendendo
ao chamado do seu comandante-em-chefe, o então governador
José de Magalhães Pinto, a Polícia Militar de Minas
Gerais aderiu incontinenti ao movimento, cabendo ao
10º Batalhão a difícil missão de participar da ocupação de
Brasília, capital da República, para implantação do novo
regime político.
Noite de sobressaltos para o 10º Batalhão, aquela de
31 de março de 1964. Em vez de ser dispensada a tropa às
18h30, como era o costume, a Unidade recebeu ordem para
embarcar, imediatamente, para Brasília-DF, para integrar
as forças revolucionárias que participariam da deposição,
pelas armas, do presidente João Goulart, se assim fosse preciso.
Embarcar como, se o Batalhão não dispunha de um único veículo ao menos adaptado para o transporte de pessoal
?! Em situação como aquela, isso não é pergunta que se
faça. Requisite-se os veículos necessários, onde quer que
eles se encontrem. Foi assim que o DNOCS – Departamento
Nacional de Obras Contra as Secas entrou na campanha
revolucionária, fornecendo a sua frota de novos caminhões,
sob requisição, para o transporte da tropa até o seu destino.
Não é preciso, e nem possível, dizer como tudo aconteceu
naquela noite, mas um fato pitoresco, embora indigno para
os princípios militares, precisa ser dito, para reflexão: conta-se que um soldado de nome não citado, quando já se
encontrava formado em seu pelotão, armado e equipado,
pronto para o embarque, aproveitou-se da confusão do
momento e pediu a um seu companheiro que segurasse o
seu fuzil, enquanto ele iria ao banheiro. E assim ele se foi,
para nunca mais voltar, desertou..
Buscando um testemunho pessoal da operação realizada
pelo 10º Batalhão em Brasília, entrevistamos o Cel
Antônio Moreira Neto, do quadro de oficiais da reserva da
Polícia Militar, residente em Montes Claros, que participou efetivamente daquela campanha como Tenente, a quem fizemos
as perguntas que se seguem:
1 – Como se explica a aparente normalidade da ordem
pública registrada nos boletins diários do Batalhão,
até mesmo no dia 31 de março de 1964?
Respondeu que as informações sobre o emprego da
tropa eram sigilosas. A normalidade era apenas aparente, “de fachada”, pois a Unidade já se encontrava “de prontidão”,
preparada inclusive para deslocamentos. Naquela
data, já à noite, com o seu pelotão, participou da requisição
dos caminhões junto ao DNOCS. Disse que o diretor daquele órgão, à época, alegou que não poderia ceder os caminhões,
razão porque foram requisitados à força, em número
de doze unidades, com alguns motoristas incluídos.
2 – Como foi o deslocamento da tropa até Paracatu?
A saída de Montes Claros foi por volta de 03h00 da
madrugada do dia 01 de abril, chegando a Paracatu ao meiodia,
em jornada ininterrupta, passando pela cidade de Pirapora,
por estradas de terra, até alcançar a rodovia que liga
Belo Horizonte a Brasília. Naquela cidade, o Batalhão parou
para alimentar tropa e preparar para o ataque, já que o
objetivo inicial era a retomada da ponte sobre o rio São
Marcos, na divisa de Minas Gerais com Goiás, que já se
encontrava ocupada por tropas do Batalhão da Guarda Presidencial.
O confronto só não ocorreu porque o Exército já
havia aderido ao Movimento e desocupado a área. O pelotão
sob seu comando recebeu a missão de vanguarda e reconhecimento
do terreno, tendo ali encontrado, ainda recentes,
as marcas de calçados e pneus deixadas pelos ocupantes
que se retiraram. Ainda em Paracatu foi integrada
ao 10º Batalhão uma Companhia do 7º BI, da cidade de Bom
Despacho. Foi ali também que o Batalhão se incorporou ao
12º Regimento de Infantaria do Exército, integrando o que
se denominou GT-12, para o desenvolvimento das ações
das Forças Armadas em nível nacional.
GUAICUÍ
UMA BANDEIRA PERDIDA PELOS
DESBRAVADORES DO SERTÃO
Luis Carlos Vieira Novaes
Cadeira nÀ 57
Patrono: João Novaes Avelins
Quem vai a Pirapora
e têm a curiosidade
de adentrar-se, poucos
quilômetros antes,
na localidade de Barra
do Guaicuí, que fica ao
lado da ponte do Rio
das Velhas e pertence
ao município de Várzea
da Palma, vai se deparar
com um dos mais
ricos e interessantes
patrimônios culturais
do Norte de Minas:
uma igrejinha, caindo
aos pedaços, em cujo
altar nasceu e cresceu
uma frondosa Gameleira.
Seu patrono é Bom Jesus de Matozinhos.
Pouco se sabe sobre a secular igrejinha, a não ser
muitas lendas que cercam a história de sua existência, pois
ela se encontra totalmente abandonada e esquecida pelo
tempo. A sua construção, no entanto, data da época das
Entradas e Bandeiras, cujos desbravadores entravam em Minas Gerais pelos leitos dos rios São Francisco e das Velhas,
e cujo encontro ergueu-se o pequeno lugarejo de Barra
do Guaicuí, à época, uma povoação fluorescente e promissora
chamada de Freguesia de Nossa Senhora do Bom
Sucesso e Almas da Barra do Rio das Velhas.
Para esclarecer o intrigante mistério em torno da insólita
igreja, ouvimos historiadores, vasculhamos livros de história
e geografia, ouvimos pessoas da terra, relatos passados
e novos.Oresultado não chega a uma conclusão precisa, mas
dá bem uma idéia da importância do centenário templo para
a história dos primeiros Bandeirantes e das primeiras povoações
que se tem notícia nestas Minas Gerais.
Igrejinha guarda muitos mistérios
Odistrito de Guaicuí, conhecido como Barra do Guaicuí,
no encontro dos rios das Velhas com o São Francisco,
foi um dos locais estudados para a mudança da capital de
Minas Gerais. Esta afirmação está na página 46, da Geografia
do Estado de Minas Gerais, de Álvaro da Silveira. Importante
ponto de passagem à grande área de Jequitaí, era
bastante procurada por garimpeiros de Diamantina e do
vale do Jequitinhonha.
O distrito de Jequitaí pertenceu a Comarca de Sabará
e foi o maior empório comercial do século XVII, com a chegada
dos jesuítas e bandeirantes Fernão Dias Paes e Manoel
de Borba Gato, em 1679. A este distrito pertenciam os
arraiais de Manga e da Porteira. Na região, viveu o Barão
do Jequitaí, um homem de grande influência.
Os garimpeiros desciam de Diamantina, seguindo o
rio das Velhas até o encontro com o São Francisco. Outros
vinham de Sabará, como Richard Francis Burton, o descobridor
da fonte do Nilo e tradutor de inúmeras obras das
culturas que visitou, como As mil e uma noites, o Kama Sutra
e Os Lusíadas. Ele descreve Guaicuí em “Viagem de Canoa de
Sabará ao Oceano Atlântico”, livro que mostra sua viagem realizada em 1867.
O ponto de confluência de pessoal que passava naquela região ficou sendo o local onde hoje é a Barra do Guaicuí.
No início da década de 1990 foi encontrada, em Santa
Luzia, uma grande embarcação que navegava antigamente
por praticamente toda a extensão do rio, e que hoje ficaria
encalhada em sua areia.
IGREJA DIFERENTE
Perguntei certa vez ao escritor e médico João Valle
Maurício sobre a igreja de pedra que se encontra no local.
Ele me fez observar que ela é diferente das igrejas construídas
na região. Chama a atenção, entretanto, mostrando que é bastante semelhante à Igreja Matriz de Santo Antônio de
Grão-Mogol.
Guaicuí permaneceu como liderança e vila poderosa
por muitos anos. Como Grão-Mogol.
Existe a história, nunca confirmada, de que o bandeirante
Fernão Dias Paes, conhecido como Paes Leme, este último sobrenome de sua mulher, teria sido enterrado naquele
local. A igreja fora construída por jesuítas sobre o túmulo
do Caçador das Esmeraldas.
Diversos historiadores chegaram a narrar este fato.
Em seu livro “Momentos”, Luiz de Paula dedica diversas
passagens. “Os mistérios (...) jazem dispersos e distanciados entre
si por mais de 300 anos, a partir do sepultamento do bandeirante
em 1681 até hoje. Tendo por testemunha a voz silente do tempo”.
Logo à frente cita que “o bandeirante Fernão Dias Paes
morreu em Guaicuí, no ano de 1681 e foi sepultado ao lado da
parede da velha Igreja de Pedras. Na parte final do poema O Caçador
de Esmeraldas, a ele dedicado, Olavo Bilac, falecido em 1918,
profetizou:
“Tu viveras nas estradas que abriste!
Teu nome rolará no largo choro triste
Das águas do Guaicuí. Morre, Conquistador!
Viverás quando, feito em seiva o sangue, aos ares
Subires, e, nutrindo uma árvore, cantares
Numa ramada verde, entre um ninho e uma flor.”
Também escreveram sobre Fernão Dias Paes os historiadores
Hermes de Paula, Nelson Viana, Diogo de Vasconcelos,
entre muitos.
O escritor Fernando Rubinger, piraporense, que trabalhou
em Montes Claros nos idos de 1970, tem um livro
sobre o povoado com suas lendas e histórias, chamado “Rua
das Pedrinhas”.
FATO HISTÓRICO
Lenda ou não, o povoado foi de grande expressão no
passado, como líder de um local e de um comércio poderoso.
O historiador Simeão Ribeiro, patrono do Instituto Histórico
e Geográfico de Montes Claros, em seu livro “Raízes
de Minas”, fala sobre Guaicuí.
“Veio a se construir de dois arraiais, o da Manga e da
Porteira, distante um do outro cerca de três quilômetros.
Até 1720, a região estava sob o domínio da Bahia, pertencendo à Vila da Cachoeira, segundo os protestos do Conde
de Vimieiro ao Conde de Assumar, em carta de 30 de junho
de 1719.
É certo que o Rio São Francisco – o Rio da Unidade
Nacional – bem como os seus afluentes, já eram conhecidos
como vias de comunicação, antes do rush do ouro encetado
pelos paulistas.
O São Francisco possuía as suas fazendas, os seus
currais de gado, mesmo ao longo dos seus afluentes.
Também é certo que, no relógio do tempo, Antônio
Guedes de Brito antecedera ao grande bandeirante Fernão
Dias Paes quando, à frente de sua Bandeira, em 21 de julho
de 1874, partira para o sertão do Norte de Minas.
Antônio Guedes de Brito, nomeado Regente do São
Francisco, já navegara pelo seu alto curso e de seus afluentes, estabelecendo a ordem, face aos constantes assaltos dos
facínoras. A sua grande obra teve prosseguimento nos trabalhos
de Matias Cardoso.
Segundo Miller, de Saint-Adolph, o arraial foi fundado
em, 1679 por Manuel da Borba Gato, componente da
bandeira de Fernão Dias Paes. A localização do povoado às
margens do Rio das Velhas com o São Francisco permite
fácil acesso navegável ao Sabarabuçu e pelo outro lado à
Bahia e Pernambuco.
Em 1775 foi o povoado elevado à categoria de Paróquia,
sendo depois, em 1778, sede florescente de Nossa Senhora
do Bom Sucesso e Almas da Barra do Rio das Velhas,
subordinado ao arcebispo da Bahia.
Em 1845, já era freguesia , por lei de 16 de outubro de
1861, passou a ser Vila com três mil almas. O seu nome foi
mudado para Guaicuí.
ARRAIAL MIMOSO
Há mais de um século, J.J. da Rocha, em “Memórias de
Minas Gerais”, descrevia o Guaicuí:
“É um arraial mimoso em tudo quanto se pensa para passara
vida com regalo... É terra de negócio, onde acorrem muitas
embarcações de sal e couros de todas as qualidades, vindos dos
sertões de Pernambuco e Bahia pelo São Francisco acima.
E se não fora infestado de grandes epidemias das sezões,
no tempo das vazantes, que ordinariamente padecem
os seus habitantes, seria o paraíso do mundo.
Chegara a ter o julgado da Barra dois Juízes ordinários,
um Tabelião, dois Escrivães e um Vigário da Vara provido
pela Bahia.
Contava Guaicuí com duas belas e importantes Igrejas,
obras dos jesuítas.
A Matriz da Barra, sob a invocação de Nossa Senhora
do Bom Sucesso e Almas e a filial de Nossa Senhora do Rosário,
no Arraial da Porteira, distante poucos quilômetros.
REFORMA MODERNA
Teodoro Sampaio, ajudante da Comissão Milnor Roberts,
incumbida de estudar a navegação no Rio São Francisco,
assim descreve Guaicuí no livro “O Rio São Francisco
e a Chapada Diamantina”.
“Dia 15 de dezembro de 1879. O tempo continua favorável,
ainda que o termômetro à sombra indicasse 30º do meio dia,
nos animamos a sair a terra para fazer uma visita ao arraial da
Porteira, distante cerca de meia légua do nosso encoradouro.
O arraial conta apenas umas 70 casas e não tem mais
de uma centena de habitantes. A igreja, como edifício importante,
chamou-nos logo a atenção, e fomos pois, visita-la.
É uma construção provavelmente do fim do século
XVIII. O frontispício dela, que nos disseram ter sido belo,
tinha desabado há alguns anos, e foi então reconstruido e
remendado.
Pintaram-no grotescamente. Desenharam-lhe em
meia altura uma fila de peixes azuis e no frontão representaram
uma coroa ladeada de índios, vestidos à européia e
apontando para ela os componentes arcos retezados.
A obra interior seria, porém, digna de admiração e de
todo apreço pelo lado artístico, se não fora o muito estrago e
a péssima conservação da belíssima arquitetura dos altares.
Que belas imagens! Que formosos lavores na obra da
talha!
Tudo isso, porém, não resistirá por muitos anos ainda,
tão adiantados e tão irremediáveis são já os estragos do
tempo.
O vigário, homem de cor, velho e doente, que tão
amigavelmente nos tratou, pareceu-nos um resignado cuja
voz clamava no deserto.Asua paróquia era grande demais:
estendendo-se por uma e outra margem do São Francisco,
com 30 léguas de comprimento e mais de 20 de largura,
calculando-se cerca de 12 mil almas a sua população paupérrima
e disseminada.
Ele, coitado, não tinha a mínima esperança de ver as
cousas melhorarem: encontrava-as assim, assim haviam de
continuar...
Teodoro Sampaio tinha razão. Em breve a Igreja da
Porteira iria desaparecer. O escritor Simeão Ribeiro Pires
visitou a região de Guaicuí em 1964. A igreja caira, só existiam
ruínas, o que foi comprovado em viagem que fiz junto
aos escritores Dário Cotrim e Ildeu Braúna, em 1994. Ali
estavam somente alguns muros, mostrando que existiu uma
igreja. Uma grande igreja para o povoado de Porteiras.
PERDENDO O BONDE DA HISTÓRIA
Curioso assinalar que foi Guaicuí um dos locais estudados
para a mudança da capital de Minas Gerais. Seria
uma boa escolha, lembrou Simeão Ribeiro em seu livro “Raízes
de Minas”. Fartura de água, o que não acontece em Belo
Horizonte, captando exatamente as nascentes do Rio das
Velhas. E mais: uma capital de Estado posta as beira do Rio
São Francisco. Mas o Congresso Mineiro, reunido em Barbacena,
opinou em 17 de dezembro de 1893, pela escolha
de Curral d’El Rey.
Segundo estudos apresentados em “Raízes de Minas”,
Minas Gerais nasceu através das mãos do Conde de Assumar.
Sua Majestade, por ordem de 16 de março de 1720,
delegara plenos poderes ao Conde para estabelecer os limites
de Minas Gerais por onde lhe parecesse mais conveniente.
Foi um instante histórico das Minas. Assumar teve a
faca e o queijo na mão. Cortou como quis. Só faltou um
porto de mar para os mineiros. Não deram um porto de
mar à Capitania das Minas Gerais porque temeram a perda
da mais rica Capitania das Américas.
Além de estender pelo Rio das Velhas (depois, Nossa
Senhora do Bom Sucesso e Almas da Barra do Rio das Velhas,
hoje Guaicuí), onde desemboca no São Francisco, passou
a envolver todas as povoações a oeste do mesmo rio até o Rio Carinhanha, “que fará limite com o Governo de Pernambuco”.
Perdia assim a Capitania de Pernambuco numerosas
povoações, fazendas, currais de gado, que edificara à esquerda
do São Francisco, desde as suas nascentes até o Rio
Carinhanha.
A Barra do Rio das Velhas, em certo tempo, seria indicada
a ser, segundo o Conde de Assumar, fronteira natural
entre a Capitanias de Minas e da Bahia.
E na pequena Guaicuí, como diz Libério Neves, “no
ermo de Guaicuí, com duras pedras sobre pedras, perdura a igreja
com sua ladainha de pedras, inacabada”, um dos mais impressionantes
templos religiosos do interior do país, à beira do
curso d’água.
A inacabada Igreja de Senhor Bom Jesus de Matozinhos
(protetor dos navegantes), também conhecida como
Igreja de Pedra, não possui nem os ornamentos barrocos
nem os quilos de ouro encontrados em exemplares de Ouro
Preto, Mariana, Diamantina e Congonhas do Campo, dentre
outras. As pedras de Cantaria que a levantaram teriam
vindo de Portugal, como lastro de navios. Entretanto, o visitante
se surpreende com a espetacular Gameleira (Ficus
Doliaria) de dezenas de metros de altura e uma copa imensa,
nascida no topo da nave. Suas raízes descem pela parede
de pedra, com quase dez metros de altura, até encontrar
o solo firme.
Duas versões explicam a inacabada igreja. Uma dá
conta que os índios que a estavam construindo temiam ser
escravizados também pelos Bandeirantes, que no século
XVII subiam o rio em busca de riquezas.
A outra aponta para as constantes enchentes do rio e
as incessantes febres que os trabalhadores sofriam, adiavam
a continuidade da obra tantas vezes que foi abandonada.
Desde 22 de março de 1985, o Iepha (Instituto Estadual
de Patrimônio Histórico e Artístico) tombou a igreja
como patrimônio estadual.
O viajante inglês Richard Burton, em passagem pela região em sua viagem ao Brasil, em 1867, relata: ‘O único
prédio digno de nota, cujo telhado alto, espalhafatoso e inclinado
chama logo a atenção do viajante, é a igreja do Senhor Bom Jesus
de Matozinhos (...). Construída em pedra de cantaria e cal, mostra
que, tempo da colônia, o lugar conheceu melhores dias; como
sempre, é uma obra semi-construída. A entrada do lado Sul nunca
chegou a ser coberta por um telhado (...). E um arco de alvenaria
destinado a marcar o lugar do altar-mor, ao norte, está coberto
de ervas daninhas‘, anotou à época, confirmando que a obra
nunca chegou a ser finalizada. Ali pode estar, mesmo, o
Caçador das Esmeraldas, renascendo junto coma Gameleira...
“Viverás quando, feito em seiva o sangue, aos ares/ Subires,
e, nutrindo uma árvore, cantares/ Numa ramada verde, entre um
ninho e uma flor.”
ELOGIO A VIRGÍLIO ABREU DE PAULA
Mara Yanmar Narciso
Cadeira nÀ 98
Patrono: Virgílio de Abreu de Paula
Quando o pai é ícone numa profissão, desafio se dá
quando o filho tem talento para a mesma área, e trabalha
lado a lado com esse progenitor. É preciso destacar a importância
do trabalho de Virgílio Abreu de Paula como
folclorista e historiador que foi, e mostrar o motivo de
ele ser o patrono da cadeira 98, a qual ocupo neste Instituto
Histórico.
Nascido em 26 de maio de 1946, filho de Hermes
Augusto de Paula e Josefina de Abreu Paula, Virgílio foi
o terceiro filho do casal, após Valéria e Walmor e antes
de Virgínia.
Quando criança praticava natação e andava no seu
cavalo Brinquedo, com grande alegria. Carmen Netto escreveu: “lembro-me mais do menino Virgílio, de calça branca,
suspensórios e camisa Valisére xadrez, sempre ao lado
do irmão Walmor”. Fez o pré-primário com as irmãs Mercedárias
e o curso primário no Grupo Escolar Gonçalves
Chaves. Como já sabia ler aos seis anos, e não era permitido
ir para o primário antes dos sete anos, fez um teste juntamente
com sua futura colega Maria Inês Narciso, e foram
aprovados. Nessa ocasião o Rotary Club instituiu uma premiação
para “Meu melhor companheiro”, vencido pelo
menino Virgílio, após votação entre os colegas. “Era muito
inteligente, alegre e fechado ao mesmo tempo, um grande
amigo. Convidava os colegas a frequentar a piscina em sua
casa, uma coisa rara naquela época. Era espirituoso e gosta-va de falar jogando com as
palavras de forma humorística,
para divertir os
amigos” diz sua ex-colega
Maria Inês.
Ainda na infância
fez parte de grupos de teatro
amador, participando
da peça “A Descoberta do
Espelho”, de autoria do
Dr. Plínio Ribeiro, entre
outras. Fez o curso ginasial
no Ginásio e Escola
Normal Oficial de Montes
Claros. Como tinha aptidão
para ciências, foi escolhido
secretário das aulas
do professor Francolino Pereira.
Aos 14 anos foi morar em Belo Horizonte , onde fez o
curso científico no Colégio Santo Antônio. Aprendeu a tocar
viola, e deu ao seu instrumento o nome de Rosa Hortência
Margarida. Ao fim do curso, prestou vestibular para
Medicina – esta em Coimbra, Portugal e Odontologia. Passou
em ambos, mas optou por fazer Odontologia na UFMG.
Devido à grande sensibilidade, não foi possível lidar com
cabeças humanas em formol, então voltou a Montes Claros,
passando a lecionar Ciências na Escola Estadual Dulce
Sarmento e Colégio São Norberto. Foi trabalhar como laboratorista
no Laboratório de Análises Clínicas Santa Mônica,
o primeiro da cidade e propriedade do seu pai.
Fascinado pelo Natal, plantava o arroz dia 13 de dezembro,
ajudava a montar o presépio, pendurava bolas na árvore durante horas, e depois ficava calado apreciando a
sua obra. Foi como exímio tocador de caixa, outro instrumento
que tinha nome de mulher, Maria Júlia, que entrou
para o Grupo de Serestas João Chaves de Montes Claros, em 1967. Em 1969 casou-se com Gláucia Almeida Leão, tendo
uma única filha, Patrícia de Leão e Paula, nascida em
1970. Em 1977 o casal se divorciou. Esta filha deu-lhe uma
neta, Anna Victória.
Mantendo-se no laboratório até seu fechamento,
Virgílio de Paula passou a aplicar exames de psicotécnico
no Instituto Médico de Psicologia em 1972. Em 1974
representou o Norte de Minas na Funarte do Rio de Janeiro,
com uma palestra sobre Música dos Catopês, com
boa repercussão. Depois fez apresentações sobre o folclore
de Montes Claros, falando para diversos públicos,
principalmente estudantes.
Também trabalhou no DER onde permaneceu até
os anos 1980. Nessa ocasião conheceu e se apaixonou por
Vera Lúcia de Oliveira, de quem ficou noivo, porém o
casamento não se realizou devido à morte da sua amada
por rompimento de um aneurisma cerebral um mês antes
do casamento.
Também como caixista participou do “Grupo Corriola
Mineira”, com Jorge Santos, e em 1981 entrou de corpo e
alma como folião no Terno de Folia de Reis.
Nos anos 1990 prestou concurso na Prefeitura e, passando
com boa classificação, assumiu o cargo de Assessor
Cultural no Centro Cultural Hermes de Paula, onde permaneceu
até sua aposentadoria em 2004.
Em 1992 publicou uma coletânea sobre as viagens do
Grupo de Serestas João Chaves, que batizou como sugestivo
nome “Serestórias e Outros Escritos”, que incluía crônicas
e poemas. Assim, a realização pessoal de Virgílio de
Paula, apaixonado pelas artes e cultura locais, se deu fora
do seu trabalho oficial, pois se destacou na área da História,
Folclore e Cultura Popular. Grande estudioso, sabia os
dados históricos de cor, e não precisava recorrer a livros ou
documentos para dar entrevistas ou responder a questionário
de estudantes que visitavam sua casa.
Irritava-se com invenções e descaso com os fatos reais. Muito amigo da sua prima Raquel Mendonça, junto com
ela não permitia deturpações de nomes, datas e locais. Quando
alguémse referia ao antigo nome de Montes Claros como “Montes Claros das Formigas”, corrigia com um sonoro“Montes Claros de Formigas”. Também fazia pesquisa de
músicas e modinhas populares, entendia a fundo suas origens,
estudando letra e melodia, antes de incluí-las no repertório
do Grupo de Serestas João Chaves.
Foi colaborador de jornais e revistas da cidade, escrevendo
uma coluna no Jornal de Notícias com o pseudônimo
Fátima Moura Imperial. Apreciador do Carnaval, também
desfilava na bateria do bloco carnavalesco “Biô e Salomé”,
criado por Waldomiro Leão.
Seu projeto mais audacioso foi o poema “A Flor de
Granada” de 2005, que teve capa e ilustrações. Gostava
tanto da informática que se tornou um produtor de CD,
editando um compact disc com escritos de pessoas da
família. Mesmo que dissessem ser impossível, colocou
em três CDs todo o trabalho do Grupo de Serestas João
Chaves. Também se tornou colaborador do mural do site
montesclaros.com. Em 2006 escreveu o poema “Iracunhã”
em homenagem a Denise, participante da seresta, seu
amor maduro e musa inspiradora.
Aborreceu-se vendo um dos casarões da Praça da
Matriz ser derrubado, como também assistindo nossa história
ser adulterada, por isso continuou, mesmo depois
de sair do Conselho do Patrimônio Histórico, a juntar documentos
e fotos, os quais retocava ao computador com
grande perfeição.
A filha Patrícia relata: “Papai foi um homem muito
especial. Vítima do prazer que virou vício e encerrou sua
passagem muito antes da hora. Introspectivo, falava pouco
ou nada de suas dores. Sofria por amor, por não domar o
vício, pela doença, por assistir seu corpo definhando e ver
o fim se aproximando. Calado, pensativo, sempre sorria
quando alguém se aproximava. Simples no ser e no pensar Papai era um romântico, e passava bom tempo em silêncio
no seu quarto ouvindo os clássicos e pensando”. Acamado
desde novembro devido a uma cirrose hepática veio a falecer
no dia 3 de dezembro de 2006. Muitos acreditam ter
ouvido naquele dia o batuque da sua famosa caixa. No
momento final sua única filha estava ao seu lado e afirma
que ele “era insuperável como caixeiro. Fechava os olhos e
tocava com a alma, desde sempre”. E é assim, feliz da vida,
que ela quer dele se lembrar.
IRACUNHÃ
Virgílio de Paula (2005)
Em festa a tribo
E o velho cansado
Sozinho consigo
Relembra o passado,
O tempo já ido
De jovem ousado
Audaz, destemido
Feroz, arrojado.
- De que serve a vida
Doente e só?
Que triste legado
Do fado sem dó.
Não importa morrer.
Desvalido, magoado,
Que serve viver?
Mas vê, de repente
Visagem encantada
No meio da gente
Que enche a taba
Uma bela tupi.
Seus lisos cabelos
Sua pele bronzeada
Seu rosto moreno...
- Igual nunca vi.
Da vida a chama
Sente reluzir
O fogo do amor
Aquece-lhe a alma
Por que não amar?
Por que não sentir,
Mesmo em segredo,
O doce calor?
Melhor que penar,
Seu sol ressurgir.
E feliz se descobre
Guardando segura
Na mente e no peito
A imagem tão nobre
A bela figura
O porte perfeito
Da doce cunha
Da doce criatura,
Iracunhã.
Perdido de amores
À sombra deitado
O céu contemplando
De nuvens tomado
Qual flocos de lã
Ao sol da tardinha
Se esquece das dores
E vê, fascinado,
Sua doce indiazinha,
Iracunhã.
Na mata sozinho
Pergunta ao vento:
Por que só agora?
Por que nesse tempo,
Com o corpo desfeito.
Por que não outrora
Que, com alento no peito
Caçava, pescava,
Lutava com afã?
Por que nessa hora?
Por que, oh Tupã?
Só agora a miragem
Da doce Selvagem,
Iracunhã?
De que vale o canto das águas
Entre as pedras limosas do rio?
E o estrondo da catadupa?
Se o sabiá geme suas mágoas
Se trina, alegre, o canário,
Se chora triste a jaçanã?
Um som apenas escuta
E ouve, quase em delírio
A voz meiga, entoada,
De sua doce Iracunhã.
Quando o vento sopra, sereno
Espalhando o perfume das flores
E a abelha, tonta de ciúme
Beija a flor numa orgia pagã
A despeito de tantos olores
Só sente, ama, o perfume
O perfume suave, ameno,
De sua doce Iracunhã.
E ao deitar o corpo exaurido
Numa prece pede a Tupã:
- Que os deuses de amor imbuídos
Aliados a Jaci, tua irmã,
Te protejam dos fluidos medonhos
Emanados do vil Anhangá.
Te revejo, talvez em meus sonhos
Onde sempre, sempre estás,
Ou nas nuvens efêmeras, douradas
Pela luz do sol da manhã.
Minha doce querida, minha amada
Minha doce Iracunhã.
SOBRE DATAS, NOMES
E CIRCUNSTÂNCIAS
Maria de Lourdes Chaves – „Lola‰
Cadeira NÀ 65
Patrono: José Gonçalves de Ulhoa
Os fatos históricos são imutáveis.
As datas, lugares circunstancias onde acontecem os
fatos históricos não podem ser modificados, sob pena de
banalizarem acontecimentos muito ou menos importantes.
É de grande responsabilidade dos membros do Instituto
Histórico e Geográfico de qualquer lugar, ao escreverem
memórias, casos, assuntos relatados entre acontecimentos
das evoluções de uma cidade, seus costumes e seus habitantes.
Qualquer erro por menor que seja, traz uma avalanche
de outros erros sucessivos, transfigurando a verdade.
Em nossa cidade, acontecem fatos sobre nomes de
logradouros, datas e circunstancias trocados que comprometem
a veracidade da nossa história.
Há anos atrás, o conservatório Lorenzo Fernandez,
quando Dona Marina Lorenzo era diretora e entre muitas
professoras lecionavam naquele estabelecimento, Cecy Tupinambá
e Arlete Macedo, foi realizado o 1º concurso de
canto. Lograram os primeiros lugares no feminino. Maria
de Lourdes Chaves “Lola” e na categoria masculino, o cronista
social, Magnus Medeiros, como presente, ganhei um
colar de cristal verde, doado por Dr. Luis de Paula. Anos
após, foi noticiada a realização como sendo o 1º concurso
de canto, com o nome da professora Arlete Macedo, muito
justa a escolha do nome. Entretanto, tal concurso foi o 2º e
não o primeiro.
Em certa ocasião, um prefeito de Montes Claros, queria mudar o nome da praça Dr. Chaves para praça Padre
Dudu. Telefonando para mim, ficou sabendo da importância
do homenageado da praça e desistiu da idéia. Outro fato
de querer fazer mudanças de nome, um deputado quis
mudar o nome do fórum Gonçalves Chaves, para o nome
de um Juiz de Direito seu amigo.
A meu ver os fatos históricos não podem ser mudados
por esse ou aquele cidadão, sem antes pesquisarem
minuciosamente o porquê da homenagem. Devemos ter
cuidado para não adulterarmos nossa história.
Fatos Extraordinários do Serviço de Registro Civil das
Pessoas Naturais desta Comarca
Há neste Serviço de Registro Civil, registros de óbito
de vários suicidas. Notamos em sua grande maioria serem
do sexo masculino. São profissionais liberais, médicos, advogados,
dentistas, bancários, funcionários públicos e comerciantes.Ultimamente se suicidam muitos jovens.
1º Caso: Uma mulher nasceu em um dos distritos de
Montes Claros. Sendo mulher foi criada como se fosse homem.
Usava roupas masculinas, camisa com dois bolsos
para disfarçar os seios.
Na idade adulta, casou-se com uma mulher. Depois
faleceu. Após seu falecimento, seus irmãos requereram a
nulidade do seu matrimônio. O Juiz de Direito desta Comarca,
Dr. Lourenço Pimenta de Figueiredo decretou a nulidade
daquele casamento.
2º Caso:Umdia, chegaram a este ofício, dois homens.
Um deles falou que tinha um irmão que de vez em quando
sumia e depois aparecia. Sua família, sendo comunicada a
comparecer à Santa Casa para reconhecer o corpo de um
finado, um dos familiares compareceu e reconheceu o corpo
como sendo do irmão deles. Algum tempo depois, eis
que o irmão aparece e naquele momento, o homem que estava
com ele, rindo era o suposto morto.
3º Caso: Uma senhora foi internada para fazerumtratamento
na Santa Casa. Seu companheiro não apresentou os documentos exigidos. Num certo dia, a esposa dele veio
ao Ofício pedir uma certidão de seu nascimento. Quando a
funcionária abriu o livro na folha e sobre o nº citado, viu à
margem do seu registro a anotação do seu óbito. O citado
homem apresentou no Hospital o registro de nascimento
de sua esposa para internar sua amante.
Encerrando a história do Serviço Civil, esclareço o que
se segue: No dia 15 de Outubro de 1.971, pelo governador
Rondon Pacheco, Maria de Lourdes Chaves foi nomeada
para Oficial do Registro Civil das pessoas Naturais desta
Comarca de Montes Claros - MG. O ato foi publicado no
Jornal “Minas Gerais”, aos 16 de Outubro de 1.971. Tomou
posse aos 25 de Outubro de 1.971, assumindo a titularidade
da serventia.
Todos esses acontecimentos foram após ter tirado o
1º lugar nas provas escritas e orais, diante da seguinte banca
examinadora: Presidente: Dr. Emerson Tardieu Pereira -
Diretor do Fórum,, Cândido Simões Canela - escrivão do 1º
Ofício, Dr. Leontino Chaves - Promotor de Justiça de Francisco
Sá –MG e o advogado Dr. Osmar Peres Caldeira.
Três meses depois, foi nomeada Suboficial, a Sra. Lígia
de Figueiredo Chaves e Oliveira, em Novembro de 1.972.
GRÃO MOGOL,
O DIAMANTE DO SERTÃO
Maria Lúcia Becattini
Cadeira nÀ 30
Patrono: Dona Tiburtina
Nessa semana visitei Grão Mogol na companhia de
simpáticas amigas do Grupo Lisieux. Fiquei encantada com
a beleza da bucólica cidade, o carinho com que fomos recebidas
e as muitas atrações turísticas.
Muitas vezes, viajamos quilômetros, para visitar pontos
turísticos e nos esquecemos que temos verdadeiros paraísos
aqui tão perto!
Opovoado Serra de Sto Antonio do Itacambiraçú, atual
Grão Mogol, teve sua origem relacionada à descoberta
de diamantes no final do século 17. No ano 1839, o lugar
era chamado de Arraial da Serra de Grão Mogol e atraiu
estrangeiros (portugueses, franceses, alemães) que atuavam
na exploração de diamantes. A Coroa portuguesa enviou
um representante para assumir o controle da exploração e
comercialização dos diamantes.
Existem duas versões quanto à origem do nome da
cidade. A primeira se relaciona com a descoberta, em 1550,
de um grande diamante na Índia, chamado Grão Mogol. A
segunda versão é devido ao grande número de conflitos e
assassinatos na disputa pelos diamantes, dando origem ao
nome Grande Amargor, modificado para Grão Mogol. O
lugar preserva seu traçado original, com ruas estreitas e íngremes, calçadas de pedras. Uma verdadeira jóia! São
vários prédios antigos, ruínas, sítios arqueológicos, festas
religiosas, artesanato e a típica comida mineira. Há pouco
tempo o empresário Lúcio Benquerer presenteou sua cida-de natal comumenorme presépio natural. Denominado “As
mãos de Deus” é considerado o maior do mundo, (3600m
quadrados). Foi inaugurado em dezembro de 2011 e já tem
milhares de visitas registradas.Opresépio iluminado a noiteé maravilhoso! São muitas as atrações deste pequeno paraíso:
a Igreja matriz de Santo Antonio, com suas grossas paredes
de pedra feitas por escravos, representa séculos da
história local, a Casa da Cultura, o museu, a praia do Val,
as belíssimas cachoeiras, o artesanato e muitos outros. Não
dá tempo de visitar tudo em um dia. Um dos motivos de
minha visita foi também visitar minha amiga Vilma, esposa
do benfeitor Lúcio Benquerer. Não havia então compreendido
como escolheram morar em Grão Mogol, em vez de
París ou mesmo Belo Horizonte. Mas ao conhecer a beleza
do lugar e constatar o entusiasmo e alegria que brilhavam
nos olhos de minha amiga, compreendi tudo. Eles fizeram
a escolha certa! O filósofo Rousseau tinha razão em declarar
que, conviver com a natureza é um caminho para a felicidade.É bem verdade que é mais fácil encontrar a felicidade
na simplicidade e tranqüilidade de um pequeno paraíso
do que no tumulto e violência das grandes cidades.
Visitem Grão Mogol!
LEMBRANÇAS DOS TEMPOS
DE ESTUDANTE
Palmyra Santos Oliveira
Cadeira nÀ 64
Patrono: José Gomes de Oliveira
Em 1933, recebi o meu diploma de curso primário,
que na época era considerado um grande feito, com distinção
e louvor, isto é dez em todas as matérias escritas e orais.
Emsetembro de 1929, mudamos para a cidade de Presidente
Prudente, no Estado de São Paulo, e o resto do ano
não freqüentei escola porque meu pai faleceu, no dia 20 de
outubro, obrigando-nos a voltar para Montes Claros.
Em 1932, no mês de agosto, o meu tio Ambrosino faleceu.
Ele era pai de Emília, da “Feira das Louças”, e por
muitos dias fiquei com minha avó em sua casa, deixando
de ir às aulas pelo resto do ano. Só no ano seguinte tirei
meu diploma.
Em 1934, por meio de prova, fui classificada para a
turma “A”do primeiro ano de Adaptação, cujos professores
eram: Português e Francês, Joana D’Arc Veloso dos
Anjos; Ciências, Anelita Valle Ulhoa; Geografia e História,
João Neto; Matemática, Cândida Câmara (Doninha); Música
e Canto, Dulce Sarmento; Educação Física, Felicidade
Tupinambá; Desenho e Trabalhos Manuais, Maria de Lourdes
Pinheiro (Taúde).
Durante dois anos, fizemos o Curso de Adaptação.
Depois, no curso denominado “Normal” – que era o que de
melhor havia naquela época, em Montes Claros, para moças
e rapazes. Nesse curso, tivemos os seguintes professores:
Português, a farmacêutica Lília Câmara; Matemática,
João de Andrade Câmara; Francês, Dr. Alfredo de Souza Coutinho; Geografia e História, Dr. José Thomaz de Oliveira;
Ciências Naturais, Dr. Plínio Ribeiro; Música e Canto,
Dulce Sarmento’Desenho, Nieta Veloso.
Na nossa turma, tínhamos dois colegas do sexo masculino:
Eulídson Novais e Jayme Silveira.
Nosso diretor era o Sr. José Raymundo Neto, ótima
pessoa, homem sábio e profundo conhecedor de normas
educativas. Ele nos reunia semanalmente para nos transmitir
ensinamentos de moral e civismo.
Em 1938, o governador Benedito Valadares Ribeiro
suprimiu a Escola Normal Oficial de Montes Claros. Por
isso, fomos concluir os estudos no Colégio Imaculada Conceição.
Exceto os dois colegas, porque, na época, aquele
Colégio era exclusivo para o sexo feminino. Constituímos a
primeira grande turma do Colégio, composta de 48 alunas.
Ali, tivemos as seguintes professoras: Português, Irmã
Rosalina (substituída depois pela Irmã De Lourdes); Matemática
e Religião, Irmã Emília; Metodologia, Irmã Inês
Mendes; Educação Física, Ieda Vechio Maurício; Música e
Canto, Alzira Cruz.
A sessão solene de nossa formatura, no final de 1938,
foi no Cine Metrópole – onde posteriormente funcionou o
Cine São Luiz -, na Rua Simeão Ribeiro. Todas nós de vestidos
brancos, longos, sapatos de salto alto – que vendi logo
após a formatura -, e anel de grau, feito sob encomenda,
por ourives de Diamantina.
O nosso paraninfo foi o advogado e ex-professor da
Escola Normal, Dr. Alfredo de Souza Coutinho, que sempre
nos cativou com seu cumprimento amável. Curvava-se
e dizia: - Senhorita! Isso nos encantava, na época...
A FORÇA DA CACHAÇA DE SALINAS
Roberto Carlos Morais Santiago
Cadeira nÀ 44
Patrono: Heloísa Veloso dos Anjos Sarmento
O agronegócio da cachaça de Salinas já é uma importante
atividade econômica do município que gera renda,
emprego e recurso público ao erário municipal Nas últimas décadas, o município norte-mineiro de
Salinas tem sido reconhecido como a capital nacional da
cachaça artesanal, onde são produzidas as mais cobiça das marcas de cachaças do país. Turistas de todo o Brasil
e até mesmo do exterior visitam Salinas para conhecer e
degustar a bebida no Festival Mundial da Cachaça, cujo
evento é realizado todos os anos desde 2002 pela Associação
de Produtores Artesanais de Cachaça de Salinas
(Apacs), que conta com o apoio logístico e financeiro da
prefeitura do município.
Salinas possui a maior concentração de marcas de
cachaça artesanal do Brasil com mais de sessenta marcas e
produção estimada em cerca de cinco milhões de litros por
safra. Historicamente, a safra se inicia em maio e se estende
até dezembro, movimentando dezenas de alambiques,
gerando renda, emprego e recurso público ao erário municipal
na forma de repasse de ICMS pelo estado.
Amarca de cachaça artesanal mais tradicional do Brasil
atualmente é produzida em Salinas. É a famosa cachaça
Havana-Anísio Santiago, reconhecida Patrimônio Cultural
Imaterial de Salinas por meio de Decreto Municipal nº.
3.728/2006, fato inédito no Brasil. Também é de Salinas o
maior produtor do estado em volume de produção comercializada
sob as marcas Boazinha, Saliboa e Seleta. Outras
marcas tradicionais como Beija-Flor, Canarinha, Cubana,
Erva Doce, Indaiazinha, Lua Cheia, Majestade, Nova Aliança,
Piragibana, Sabor de Minas, Salineira, Terra de Ouro,
dentre outras, fazem sucesso junto ao consumidor que a
cada dia vem apreciando e degustando a mais genuína bebida
brasileira: a cachaça.
As evidências do sucesso da cachaça de Salinas são
muitas. Vejamos algumas:
Em 1990, a revista PLAYBOY (edição de maio) lançou
seu primeiro ranking de cachaça. A cachaça Havana,
do produtor Anísio Santiago (1912-2002) ficou em
primeiro lugar.
Em 2007, a revista PLAYBOY (edição de abril), elegeu
sete marcas de Salinas entre as vinte melhores do país:
Anísio Santiago-Havana (2º. Lugar), Canarinha (3º. Lugar), Boazinha (6º. Lugar), Piragibana (10º. Lugar), Indaiazinha
(12º. Lugar), Lua Cheia (16º. Lugar) e Seleta (18º. Lugar),
tendo representatividade de 35% do rol das marcas eleitas.
Em 2009, a revista PLAYBOY elegeu duas marcas
entre as melhores do pais: Anísio Santiago-Havana (1º. lugar)
e Canarinha (6º. lugar).
Em 2010, a conceituada revista VEJA (edição de janeiro
2010) lançou seu primeiro ranking de cachaça, sendo
que a cachaça Anísio Santiago-Havana ficou em primeiro
luga na categoria cachaça envelhecida. A marca Canarinha
ficou em quatro lugar.
Em2011, no último ranking da revista PLAYBOY (edição
de julho), duas marcas de Salinas foram eleitas entre as
vinte melhores do país: Anísio Santiago-Havana (1º. lugar)
e Canarinha (6º. lugar).
Na literatura da cachaça, Salinas é destaque nos mais
diversos livros lançados nos últimos anos. Todos os autores
destacam a importância da cachaça produzida no município
pela sua qualidade, tradição e variedade de marcas.
Outra evidência da força da cachaça de Salinas está
na arrecadação de ICMS, imposto sobre circulação de mercadorias
e serviços, de competência estadual. O ICMS é um
excelente indicador para mensuração da atividade econômica
pois permite fazer correlação com outros setores da
economia. Permite, ainda, fazer análise sobre aspectos da
formalidade e informalidade do setor.
Cerca de um terço da arrecadação de ICMS é proveniente
da atividade produtiva de cachaça nos alambiques
do município. Os dados da arrecadação de ICMS apontam
Salinas como único município mineiro que possui
cadeia produtiva consolidada com expressiva participação
na economia local.
A tabela abaixo, com dados obtidos na Receita Estadual
de Minas Gerais, consolidada em março 2013, demonstra
de forma inequívoca a força da cachaça de Salinas
na região.
A microrregião de Salinas, composta por dezessete
municípios, possui 45 produtores de cachaça formalizados
(inscritos na Receita Federal, Receita Estadual e Ministério
da Agricultura), sendo que 27 produtores (60%) estão localizados
no município de Salinas. Em 2012, os produtores de
Salinas faturaram 26,8 milhões de reais, 9,24% a mais em
em relação a 2011, que foi de 24,4 milhões de reais.
Aparticipação dos produtores de Salinas foi de 72,43%
em relação ao total faturado pelos produtores da região em
2012. No ano anterior a participação foi de 75,48%. Demonstra
que Salinas vem buscando a formalidade ao longo dos últimos anos com expressiva participação na economia do
município.
Poucas cidades brasileiras possuem símbolo que reflete a economia e cultura local. Salinas possui a cachaça
artesanal como símbolo de sua vocação econômica e cultural.
A genuína bebida brasileira ali produzida está cada vez
mais cobiçada pela sua qualidade, tradição e variedade de
marcas. Maria das Vitórias Cavalcanti, presidente do Programa
Brasileiro de Desenvolvimento da Cachaça (PBDC),
em depoimento para o livro “O Mito da Cachaça Havana-
Anísio Santiago” (Editora Cuatiara: Belo Horizonte, 2ª. edição,
2007, 292 páginas) afirma que “É indiscutível a importância
da região de Salinas para o desenvolvimento do mercado
da cachaça no Brasil e no exterior. A busca dos produtores da
região em desenvolver marcas e produto de qualidade diferenciada
colocou Minas Gerais na liderança da produção de cachaça
artesanal no Brasil”.
O processo de expansão e diversificação da economia
brasileira ao longo das últimas décadas vem forjando e incrementando
atividades econômicas com produtos típicos
da cultura do Brasil com forte impacto nas economias locais.
Neste aspecto, através de diversos fatores como clima, solo,
conhecimento e tradição, Salinas vem promovendo desenvolvimento
sócioeconômico, bemcomo ocupando espaço no
mercado interno e externo através de bebida que expressa
parte da cultura e identidade brasileira: a cachaça.
O Museu da Cachaça de Salinas, inaugurado em dezembro
de 2012, com recurso do tesouro estadual é o reconhecimento
oficial do governo mineiro, fato inédito no Brasil,
da importância da cachaça para Salinas e Minas Gerais.
Foi graças ao trabalho épico dos produtores que o município
de Salinas virou sinônimo de cachaça no Brasil.
Um brinde à cachaça de Salinas!
ALGUMAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
À CACHAÇA DE SALINAS
ALCÂNTARA, Araquém. BEATO, Manoel. Cachaça.São Paulo:
Transbrasil, 2011.
ALENCAR, Girleno. Cachaça Havana provoca „guerra‰ no norte.
Hoje em Dia, Caderno de Minas, Belo Horizonte, 1º março, p. 9.
BEM-VINDO ¤ terra da Havana. Revista Globo Rural, São Paulo, nº 3,
1988.
CAVALCANTE, Messias S. A verdadeira História da Cachaça. São
Paulo: Editora Sá, 2011.
FEIJÓ, Ataneia. MACIEL, Engels. Cachaça Artesanal: Do Alambique à
Mesa. Rio de Janeiro: Senasc, 2002.
FIGUEIREDO, Renato. De Marvada a Bendita. São Paulo: Matriz,
2011.
PAIVA, Fernando. Viagem ao país da cachaça. Revista Mitsubishi nº
13, São Paulo, março 2004.
Revista PLAYBOY (edições de maio 1990, abril 2007, agosto 2009 e
julho 2011).
RIBEIRO, Ronaldo. A Safra Seguinte. Revista National Geographic
Brasil, outubro 2003.
SANTIAGO, Roberto Carlos Morais Santiago. O Mito da Cachaça
Havana-Anísio Santiago. Belo Horizonte: Cuatiara, 2006.
VENTURA, Sandra. GIRALDEZ, Ricardo. Cachaça: Cultura e Prazer
Brasileiro. São Paulo: Dalmara, 2006.
WEIMANN, Erwin. Cachaça: A Bebida Brasileira. São Paulo: Terceiro
Nome, 2006.
NATURALISTAS E VIAJANTES
DO RIO SÃO FRANCISCO
Roberto Pinto da Fonseca
Cadeira N. 92
Patrono: Sebastião Tupinambá
Os diversos olhos d’água que nascemno platô da Serra
da Canastra, Minas Gerais, se juntam formando a magnífica
cachoeira de Casca d’Anta, no distrito de São José do Barreiro,
São Roque de Minas, Minas Gerais, dando início à nascente
histórica do Rio São Francisco, que percorrerá, na direção nordeste,
2.814 km em território brasileiro, até desaguar no mar.
Percorre os estados de Minas, Bahia, Pernambuco,
Alagoas e Sergipe, atravessando Paulo Afonso e lançando
suas águas no Atlântico, entre Brejo Grande (SE) e Piaçabuçu
(AL). Sua bacia também atinge parte do Distrito Federal
e Goiás, abrangendo atualmente 504 municípios, englobando
uma população de 18 milhões de pessoas. O Rio das
Velhas é seu principal afluente, num total de 168 rios, sendo
que 99 são perenes. Abrange 7,5% do território nacional.
Sua bacia hidrográfica possui uma área de 634.000 km2.
A foz do rio-mar, Opará, na língua tupi-guarani, foi
vista em 4 de outubro de 1501, pelo navegante Américo
Vespúcio, recebendo o nome de São Francisco, em homenagem
ao santo do dia.
A vasta região do rio começou a ser colonizada a partir
da fundação de uma feitoria em 1545 - a atual cidade de Penedo
-, por Duarte Coelho, donatário da Capitânia de Pernambuco.
Surgiram as primeiras plantações de cana-de-açúcar, os
currais de gado e missões religiosas. De Salvador, sede do
governo colonial, se deu, a partir de 1600, o desbravamento
do médio São Francisco, com as grandes boiadas e latifúndiospenetrando o agreste. Nos anos de 1700 já se realizavam as
primeiras romarias ao Santuário de Bom Jesus da Lapa (BA).
Por essa mesma época, registra-se a incursão, na região
do alto São Francisco, de paulistas à procura de índio
para aprisionar.
Com a descoberta do ouro nas Minas Gerais, o Velho
Chico passou a ser a entrada natural da região, via Rio das
Velhas. Com o advento do ouro, se desenvolve uma imensa
rota comercial entre a região das minas e os currais de
gado do São Francisco. Desenvolvem-se diversos entrepostos
comerciais ao longo do grande rio, que se converteram
em núcleos urbanos mineiros, como Januária, Barra do
Guaicuí, São Romão, Matias Cardoso. Na Bahia surgem
dois polos importantes: Carinhanha e Juazeiro.
Mesmo após o declínio das minas, as diversas rotas
comercias desenvolvidas em torno do rio não perderiam
seu ímpeto desenvolvimentista, interligando as regiões sudeste,
centro-oeste e nordeste.
Na primeira metade do século XIX, o grande rio seria
alvo de atenção de grandes cientistas europeus, naturalistas,
botânicos, que estimulados
com a vinda da
corte portuguesa para
o Brasilem1808, se voltaram
para nosso interior,
buscando conhecer,
estudar e desbravar
ainda mais as nossas
potencialidades.
Augustin François
César Prouvençal
de Saint-Hilaire (1779-1853), botânico francês,
percorreu o Brasil entre
1816 e 1822, viajando
pelo Rio de Janeiro, Minas, Espírito Santo, Goiás, São Paulo, Santa Catarina e Rio
Grande do Sul. Publicou em francês, no ano de 1847, o seu
relatório “Viagem às Nascentes do Rio São Francisco”. Sobre a
nascente do São Francisco, escreveu:
Auguste de Saint-Hilaire
“Para ter uma ideia de como é fascinante a paisagem ali, o
leitor deve imaginar estar vendo em conjunto tudo o que a
natureza tem de mais encantador: um céu de um azul
puríssimo, montanhas coroadas de rochas, uma cachoeira
majestosa, águas de uma limpidez sem par, o verde cintilante
das folhagens e, finalmente, mais matas virgens, que
exibem todos os tipos de vegetação tropical.”
Todo o material colecionado por ele no Brasil formou
um herbário de 30.000 exemplares, englobando 7.000 espécies
- na época, 4.500 espécies foram consideradas desconhecidas.
Sentia-se encantado diante da exuberância de
nossa natureza. Já nessa época sentia-se preocupado com a
devastação da natureza, sobretudo com as queimadas.
Carl Friedrich Philipp Von Martius
Von Martius (1794-1868) foi botânico, médico
e antropólogo, sendo
considerado um dos maiores
pesquisadores alemães
a percorrer e estudar
o Brasil. Viajou pelo país
entre 1817 e 1820. Foi um
dos primeiros cientistas a
estudar os indígenas e os
colonos. Suas atividades
não se restringiam apenas à botânica, se interessou
pela metodologia histórica,
pesquisou nosso folclore,
etnografia e línguas
indígenas.
Carl Friedrich Philipp Von Martius
Onaturalista alemão
Von Spix (1781-1827) veio em 1817
para o Brasil com seu
colega Von Martius.
Faziam parte da Missão
que acompanhava
a futura rainha do Brasil,
a princesa Leopoldina.
Em 1820 encerra
a sua viagem, retornandoà Europa com
9.000 espécies de plantas
e animais, coleção
que formaria o conjunto
mais importante do Museu de História Natural de Munique.
Suas pesquisas estão muito ligadas a Von Martius.
Publicaram “Viagem pelo Brasil 1817-1820”, que foi publicado
em Munique em 1823, dividido em três volumes. Esse
importante livro sobre nosso território só foi publicado no
Brasil em 1916, sendo que a edição integral seria lançada
em 1938. Os dois cientistas percorreram a região mineira
do S. Francisco, além do trecho da Estrada Real entre Ouro
Preto e Diamantina. “A Flora Brasiliensis” foi um trabalho
tão grandioso que foram gastos 66 anos para a sua completa
organização. Dividida em 40 volumes, 3.000 gravuras,
onde estão catalogadas 20.000 espécies, sendo que 6000 eram
totalmente desconhecidas.
Johann Baptist Von Spix
Sir Richard
Francis Burton
(1821-1890), nascido
na Irlanda, foi um
dos maiores exploradores
e orientalistas
britânicos. Disfarçado
de afegão,
foi um dos primeiros
europeus a viajarà cidade proibida
de Meca, expressamente
vetada a
qualquer não muçulmano.
Fez a mesma aventura na Somália percorrendo,
também sob disfarce, a ruas da capital Harar, onde todo
estrangeiro - e sobretudo branco - era assassinado. Foi um
escritor prolífico, sendo o primeiro a traduzir para o inglês
o Kama Sutra (1883), provocando grande escândalo no Inglaterra
vitoriana. Em 1885, foi a vez das Mil e Uma Noites.
Em 1861, chega ao Brasil e vai morar em Santos como
membro do serviço diplomático e do Ministério do Exterior
da Inglaterra. Passa a viajar pelo interior do Brasil e escreve
dois livros importantes: “Viagem do Rio de Janeiro a
Morro Velho” e “Viagem de Canoa, de Sabará ao Oceano
Atlântico”. Escreve importantes observações sobre o rio São
Francisco, as comunidades e o povo ribeirinho.
Sobre o espanto de ver o velho Chico, escreve:
“Esse curso de água não é um rio sagrado, mas seu futuro
será mais honroso que o passado do Ganges ou dos hindus.
O vale e os Gerais que o limitam de ambos os lados
contêm todos os elementos de prosperidade necessárias a
um império.”
Retratando a visão do europeu sobre nossa sociedade,
eis como descreve o povo da cidade de São Romão, por
onde passou em 1867:
Richard Francis Burton
“Não tive boa impressão dos são-romanenses. Não vi, entre
eles, uma única pessoas branca; constituíam um magote
de bodes (mulato) e cabras (mestiço de índio e mulato),
caboclos e negros. A classe inferior, se ela existe, nessa
terra onde reina a perfeita igualdade, teórica e prática, anda
em molambos, os mais ricos vestiam-se no estilo europeu,
camisas de ‘pufos” e coletes de veludo, mas seus cabelos
escorridos e rostos chatos relembravam a origem aborígine.
Eram devotos, como mostravam as cruzes de madeiras
penduradas nas paredes; mal-educados, mal tinham a energia
suficiente para se reunirem em grupos nas portas e
janelas, os homens para observar, as mulheres para comentar
o forasteiro que passava.”
Heinrich Wilhelm
Ferdinand Halfed (1797-1873) nasceu em Hanover.
Com formação em
engenharia, veio para o
Brasil em 1825, integrando
o Imperial Corpo de
Estrangeiros.Em1836, foi
nomeado “Engenheiro da
Província de Minas Gerais”,
passando a morar
em Ouro Preto. Construiu
a estrada entre a capital
da província e Paraibuna,
na divisa como estado do
Rio de Janeiro. Esse trecho
de estrada, além de
melhorar em muito a integração do Estado, possibilitou o
desenvolvimento da cidade de Juiz de Fora.
Em 1852, foi incumbido por Dom Pedro II de realizar
todo o mapeamento do Rio São Francisco. Durante dois
anos, percorreu desde a cidade de Pirapora, todos o rio e seus afluentes. Desse trabalho, surgiu o “Atlas e relatório
concernente à exploração do Rio São Francisco”, publicado
em 1860. Nesse importante documento, foram registradas
todas as informações científicas, cartas topográficas, mapas,
as formas e possibilidades corretas da exploração dos recursos
naturais, viabilidades econômicas e navegação. Documento
ainda atualmente de extrema precisão para se consultar
sobre o rio-mar.
Heinrich Wilhelm Ferdinand Halfed
LOJINHA DAS MÚSICAS
Ronaldo José de Almeida
Cadeira nÀ 25
Patrono: Corbiniano Rodrigues dÂAquino
Quando criança, lá pelos meus 12 anos de idade, sempre
que possível, principalmente aos sábados, eu ajudava
ao meu pai na sua loja de discos e instrumentos musicais,
situada na Praça Dr. Carlos, nº 105. A minha função era
colocar para tocar os discos, quase sempre de 78 rotações,
aqueles que quebravam com a maior facilidade. Mesmo que
não houvesse clientes na loja, a música não podia parar.
Naquelaépoca, oscompradores dificilmente sabiam qual
disco queriam comprar, escolhiam, à medida que ouviam e se
gostassem.Aminhatarefa, consistiaem“passar” os discos para
os fregueses ouvir e quando gostavam, eles separavam para
comprar, tudo sob os olhares atentos da gerente Eny.
Os discos vendidos eram colocados em sacos de papel
no mesmo formato, com o nome da loja, e bastante destacado
a tarja, “Definitivamente não trocamos discos”, tais embalagens,
foram precursora das sacolas de plásticos, hoje tão usadas.
Os compradores, quase sempre eram pessoas oriundas
de fazendas, uma vez que, no sábado, era dia de feira e o “movimento”
no vizinho e grande mercado central, era imenso.
Também eram freguesas da loja do meu pai, as mulheres
da casa da “Roxa” e da casa da “Anália”; as duas
maiores cortesãs da região, inimigas e concorrentes no ramo.
Se por um lado os fregueses vindos das fazendas gostavam
da chamada musica sertaneja, não esta que se ouve
hoje, de Chitãozinho e Xororó; Leonardo e outros cantantes,
mas, a autêntica, a sertaneja de raiz, de Tônico e Tinoco; Tião Carreiro e Pardinho e outros mais; por outro lado às
meretrizes gostavam de Nelson Gonçalves; Orlando Dias;
Cauby Peixoto, etc.
Devo dizer que como ótimos clientes também haviam
os bancários, considerados pelas famílias, “bons partidos”,
rapazes que frequentavam bastantes festas, e eram
disputados pelas moças casadoiras.
Nesta época, já começavam a despontar Sérgio Murilo,
Demétrius, Altemar Dutra, Rosemary e mais alguns artistas
com relativos sucessos.
Os hits demoravammuito a chegar em nossa loja, face às dificuldades de transportes; somente os conhecíamos por
meio do rádio e ou revistas, eis que ainda não tínhamos
ainda televisão em nossa cidade.
Quando chegavam os discos era uma festa, muitas
vezes alguns clientes conhecidos e habituais, faziam encomendas
de alguns sucessos, então deveríamos separar e
avisá-los rapidamente; quase sempre eram os bancários que
encomendavam.
Assim era o cotidiano da pequena loja de disco do
meu pai.
Relato tais fatos, uma vez que me fluiu na lembrança
e com muita saudade, motivado pela simples visão de um
CD, que encontrei no Supermercado Bom Preço, no Shopping
de Itabuna/Ba.
Gosto muito de vasculhar as prateleiras de CDs e dias
atrás encontrei na parte de liquidação por R$ 6,50, um CD,
composto do melhor repertório da nossa MPB, bem selecionado,
com excelente arranjo, da cantora Walesca, uma das
preferidas do poeta Vinícius de Morais e do maestro Tom
Jobim, que tanto sucesso fez e ainda faz nas boates de São
Paulo. Ninguém comprava e nem mesmo a conhecia; algumas
garotas até debochavam, mais adiante numa parte destinada
a “lançamentos”, vários jovens admiravam e compravam
o novo CD do pseudo cantor, Latino.
Completa inversão de valores.
DOUTOR RAMETA E
“OS MENINOS DO SAPÉ”
Wanderlino Arruda
Cadeira nÀ 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Nascido em São Paulo, mas transmudado de vida e
vivências para a velha vila do Sapé, meio de mata e canteiro
de construção ferroviária, José Rameta enriqueceu-se de
realismo mágico e purificou-se de simplicidade interiorana,
qualidades endereçadas à sua futura atividade literária.
Acompanhando Salvador, pai, no trabalho, e D. Lia, mãe,
no trato com as coisas de Deus e da casa, fez escola de humanismo,
preparou-se para conferir às pessoas e aos assuntos,
existência de eternidade. Observador sensível, dotado
de bondade e finura, nem a timidez lhe tira a capacidade
de construção do bem.
Escrever, contar “causos” tem sido um complemento
das horas de trabalho do doutor ginecologista, sempre
muito ocupado, trabalhador que trabalha em área de diversão
de muitos, segundo poderia dizer a fala alegre dos
humoristas. Bom contista, é espelho refletindo universos
do consultório médico, das salas de parto ou de cirurgia,
que podem estar em qualquer parte do mundo. Tem bom
poder de enredar, criar, construir ambientes, sugerir dramas,
despertar emoções. Nele é sempre perceptível a busca
e a espera do clímax.
Em “Os Meninos do Sapé”, Rameta demonstra-se um
saudosista que sabe evocar cenas de encantamento tipo primeira
noite de um homem, recordos do garoto e do rapaz
estudante. Muitas são as visões que circulam entre o cômico
e o trágico, sempre temperadas de malícia comedida, com doses de místico fatalismo.Ummisterioso, muitas vezes saudado
pela maestria do balanço das frases e das palavras, todas
tão simples como o seu modo de ser e de viver. Estas são
as facetas que vão despertar o leitor para uma leitura gostosa,
transparente como as águas do Rio Verde, que inspiraram
o escritor, a exemplo do rio da antiga Arcádia.
Os lugares criados pela escrita de Rameta são geográficos
e reais, embora universais e universalizantes, no
ponto em que estão isentos de fronteiras da política ou da
ideologia, uma contida cosmovisão da nossa pequena humanidade.
Seus dramas nunca constituem flagelos ou catástrofes,
porque, aí, a miséria e as fraquezas nunca se mostram
em clima de fratura exposta. A dor maior é acidental e
não causa gritos de estertor nem nos partos difíceis, já que,
com amor, quase religioso, anestesiado. A dor menor, esta
vem de fininho, matreira, solerte, bem comportada, nunca
ferindo nem corpo nem alma.
Rameta trabalha bem com as suas personagens, convive
com elas, alegra-se e sofre em fraterno companheirismo.
Dá-lhes foco de luz e boa movimentação. Envolve-as com o
toque cuidadoso, escuta-lhes o coração, deixa-as em atmosfera
de confiança, sem barulho, sem pressões, cobrindo com
branco lençol as partes de maior pudor. Seu espaço médico/
poético/literário tanto pode ser um hospital de estudantes
em Belo Horizonte como a clínica que divide com a doutora
Maria de Jesus, sua mulher e colega. Seu tempo/espaço pode
ser também Montes Claros ou as ruas poeirentas do Sapé, o
bairrinho antigo de onde nasceu Burarama, a cidade filha do
Capitão Enéas e de Salvador Rameta.
Assim, não precisa nosso contista criar um mundo fictício,
não tem necessidade de formar, inventar, machucar as
palavras, para delas extrair verdades ou meras ilusões. Filho
de Dona Lia Rameta, de suave misticismo, ele, sacerdote simpático
de corpo e alma, sabe mostrar fotografias mentais dos
acontecimentos sugestivos de sua profissão. Em torno dele,
os fatos simplesmente acontecem encantados ou não, nem sempre com sangue ou envoltos com placentas e cordões
umbilicais. Vindo à luz como artista da palavra e do bisturi,
Rameta é, sobretudo, um doador de existências, com choros
e com sorrisos. Um agende de felicidades.
Os leitores de “Os Meninos do Sapé” – ao contrário
dos antigos romanos – dizem e poderão dizer sempre: Salve,
nobre Amigo, os que vão viver te saúdam.
AGOSTO DE CINQUENTA E TRÊS
Wanderlino Arruda
Cadeira nÀ 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Quando Celso Brant dedicou toda a revista ACAIACA
de agosto de 53 a Montes Claros, comandavam esta cidade
o Capitão Enéas Mineiro de Souza e o Coronel João
Lopes Martins, duas patentes ainda bem vivas na lembrança
de leitores mais velhos, cada uma delas com personalidade
bem forte, à moda da época, revolucionários e conservadores,
marcantes de paixão, um tanto próximos do caudilhismo
com feição regional. A Câmara Municipal, dirigida
pelo flegmático João F. Pimenta, tinha a respeitabilidade
da década, uma saudosa coerência de bom comportamento.
Dos quinze cidadãos com acento na casa, nenhum
mais aqui para servir de testemunha. Também já não temos
o juiz Ariosto Guarinello, o bispo Luiz Victor Sartori, o
delegado José Coelho de Araújo, nem os colaboradores da
revista padre Agostinho Beckhauser, Nelson Washington
Vianna, Alfred Hannemann, José Monteiro Fonseca, Neném
Barbosa, Pedro Sant’Ana, Irmã Rudolfa e os poetas
Geraldo Freire e Dulce Sarmento. Ninguém mais para contar
a história, pois todos na longa viagem da eternidade...
Com sessenta anos passados, é bom que ainda reste a
lembrança de amigos como o professor Belisário Gonçalves,
figura e estilo tão próximos de Castro Alves, do repórter
José Prates, nosso primeiro jornalista de rua e de redação,
ainda no batente, escrevendo do Rio de Janeiro para o
Montesclaros.com. Também já ausentes do plano físico,
Felicidade Tupinambá, João Vale Maurício, Konstantin Christoff, Flora Pires Ramos, Cândido Canela, Irmã Maria
de Lourdes, Orestes Barbosa e Lourdes Martins,Áflio Mendes
de Aguiar, Afonso Pimenta e Feliciano Oliveira. Vivos,
bem vivos, muito vivos, aproximando-se gloriosamente dos
cem anos, Luiz de Paula Ferreira e Yvonne Silveira, companheiros
da Academia Montesclarense de Letras e do Instituto
Histórico e Geográfico de Montes Claros. Todos juntos,
formaram um belo corpo editorial, de prosa e poesia e de
desenho, agradáveis, bemfeitos, até comum lindo toque de
romantismo pelo muito amor a terra montes-clarense.
Confesso que o mais gostoso na velha revista ACAIACA
era o conjunto de anúncios, alguns até de página inteira,
muitos com ilustrações interessantíssimas. Yvonne
Silveira e Luiz de Paula que me digam se estou ou não falando
a verdade, se é ou não salutar o direito de ter saudades.
Quem – dos mais velhos - não se lembra, por exemplo,
de nomes importantes como, Casa Alves, Imperial Casa Ramos,
Big-Bar, Salão Rex, Joalheria Coelho, Assombro da Pirotécnica,
Casa Elza, Loyola e Companhia, Turmalina, Instituto
de Beleza Gilda, Casa Paulino, Alfaiataria Ribeiro, Macarrão
Iracema, Bar de Tito Versiane? Quem não tem ainda
gravados namemória nomes tão conhecidos como Hotel São
Luiz, Hotel São José, Hotel Santa Cruz, João Souto Consignações,
Casa para Todos, A Construtora, Ayres Alfaiate,
Joalheria Cima, Transportadora Armênio Veloso, Farmácia
Americana, Maternidade Santa Helena? São gratificantes
pedaços de lembranças, coloridos no tempo e nos sonhos...
Tudo na revista é interessante, mas o sensacional
mesmo são as fotografias feitas pela mão de mestre de José
Figueiredo Pinto, também inesquecível. Na página infantil,
retratos dos garotos Jorge Enéas e Catarina. Nas páginas
de esportes, flagrantes de momentos históricos dos atletas
do Montes Claros Tênis Clube, Moema, Zembla, Glória,
Eunice, Ilza, Marlene, Shirley, Wilma, Norma Maria, Stela,
Zenaide, Clarissa, Consolação. No bloco da educação, fotos
de alunas e professoras, do Colégio Imaculada. Como fe chamento de ilustração, bonitos exemplares das raças gir e
indubrasil das fazendas de Dominguinhos Braga, Osmane
e Neném Barbosa, João Alencar, Antônio Augusto e Geraldo
Athayde.
Naquele tempo, havia os Bancos do Brasil, Hipotecário
e Agrícola, Minas Gerais, do Comércio, Crédito Real. Não
havia Banco do Nordeste. O Banco do Estado de Minas Gerais
ainda era chamado de Banco Mineiro de Produção.
FAFIL, PIONEIRA
DO ENSINO SUPERIOR
Wanderlino Arruda
Cadeira nÀ 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Creio que o grande laboratório de ideias a usina de
sonhos tenha sido mesmo as salas de aulas da Universidade
Federal de Minas Gerais, onde moças montes-clarenses
terminavam diferentes cursos, tão distantes uns dos outros
que iam da História à Pedagogia, das Letras à Matemática,
da Geografia às Ciências Sociais. Diplomadas, portadoras
de muito saber e incentivo de antigos professores da capital,
Isabel Rebelo de Paula, as irmãs Baby e Mary Figueiredo,
Sônia Quadros Lopes, Florinda Ramos Marques, Dalva
Santiago de Paula, ansiosamente, se uniram a outros idealistas,
e o resultado foi o nascimento da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras do Norte de Minas – Fafil - aqui em
Montes Claros. Verdade é que não houve oposição ao seu
trabalho e até não faltou crédito ou aquele sempre necessário
voto de confiança. Todo mundo acreditou nelas, com o
Colégio Imaculada Conceição cedendo espaço físico e moral,
a Fundação Educacional Luiz de Paula fornecendo recursos
e entusiasmo, professores como Jorge Ponciano Ribeiro,
dando logo a sua quota de serviços.
Foi uma beleza o começo, um sucesso o primeiro cursinho
de Montes Claros. Lembro-me bem, da primeira aula
de francês que tivemos com a professora Baby Figueiredo,
com texto solto, impresso fora de livro, uma novidade! Lembro-me do Adélia Miranda elaborando, como secretária, os
primeiros relatórios, apertando os primeiros alunos retardatários
para não atrasarem no pagamento das mensalidades ou início das aulas. Era uma experiência interessantíssima
com passagens de se emocionar!
Era tanta sabedoria nova, um conhecimento tão organizado,
uma perspectiva de aprendizagem tão grande,
que problemas apareciam a toda hora, todos querendo aproveitar
de tudo, sorver de vez todo um alimento que por não
existir antes, estava sendo negado a quem muito o desejava.
Acontecia então o troca-troca de salas, uma espécie de
mineração de assuntos, um descobrir quem era o melhor
professor, um abeberar de toda uma nova filosofia de vida.
Não posso contar tudo sobre as aulas de nossos cursos, nos
primeiros dias do semestre, porque os acontecimentos vinham
aos borbotões, quase sufocando a curiosidade, até
confundindo as cabeças. Era como se fosse um vasto ciclo
de conferências de palestras, um eterno comício. Hamilton
Lopes, calouro, ensaiava os primeiros passos da política
estudantil, João Valle Maurício, José Nunes Mourão, Hélio
Vale Moreira, Mauro Machado Borges, alunos mais vividos,
mostravam uma compenetração pouco natural de estudantes.
Yvonne Silveira, esta numa santa vaidade de literata,
se desmanchava em sorrisos e sutilezas numa alegria
quase infantil.
Tudo foi uma longa festa intelectual, uma corrida de
muita sede à fonte, todos considerando um grande privilégio,
uma oportunidade a mais de vencer na vida, em campos
profissionais já longamente seguidos. Pela primeira vez,
vimos professorinhas ensinando para velho elenco de construtores
do futuro! Olhado de longe, cinquenta depois, quase
uma loucura, maravilhosa loucura! Que o diga Isabel
Rebelo de Paula, a primeira diretora. Que o digam os primeiros
graduados dos cursos de Letras, História, Geografia,
Pedagogia e Matemática. Alguns já nem mais na romagem
terrena...
FACULDADE DE DIREITO,
REENCONTRO DE SAUDADES
Wanderlino Arruda
Cadeira nÀ 33
Patrono: Enéas Mineiro de Souza
Muitas saudades marcaram os meus cinco anos de
Faculdade de Direito, saudades em que com todos os tipos
de alegrias e sensações, me trazem de volta um delicioso
tempo de juventude. Cinco anos, pequeno e longo período,
com uma boa percentagem de tempo de vida. Cinco anos
com as preocupações de acompanhamento de programas,
estudos constantes nem que fossem em época de provas,
estágios, concursos, seminários, um universo de
atividades das quais ninguém conseguiu escapar, bastou
ter passado no vestibular e feito matrícula. Período de amadurecimento
de ideias, afirmação do que é certo e do que é
errado, do que deve ou não deve, do que pode ou não pode
ser feito por alguém com consciência de cidadania. Cinco
anos de excelentes amizades, algumas rusgas, pintadas aqui
e ali de desentendimentos, para depois tudo correr num
oceano psicológico de boa navegação.
Tempo de saudades, por que não? Afinal, tem que
ser muito importante, principalmente com os colegas que
são as feições mais constantes, passageiros da mesma condução,
gente por todos os lados, uns tímidos, uns por demais
aparecidos, alguns sempre abertos em sorrisos, faladores
num humor de encantar, outros desconfiados, arredios
como quem daria um reino por um momento de silêncio
ou de esquecimento. Com os mestres, um intercâmbio
menor, porque nenhum acompanhando a turma o tempo
todo, os cinco anos, alguns apenas por dois semestres, outros
parecendo fugazes cometas de passagem rápida, em substituição aos titulares em viagens. Como o professor é
um entre muitos, da cara dele ninguém se esquece, o semblante
fica gravado a existência inteira.
Tempo bom de Faculdade de Direito, com jovens donzelas
quase impúberes, moços no dealbar dos dezoito, jovens
senhoras, balzaquianas, pais de família na fase dos
trinta, cavalheiros que começam a vida (a vida começa aos
quarenta!), cinquentões, e atéumsexagenário, ora pois!Um
corte bonito no perfil social, amostra importante para crítico
nenhum botar defeito, nem antes nem depois. Quem
desejar experimentar um cadinho de esforços humanos e
sobre-humanos, chegue para perto de uma turma de universitários
de Direito, meça o valor das partes e do conjunto,
observe as reações, sinta os dramas, pergunte sobre os
compromissos para com o futuro, penetre no mundo ideológico,
intercepte entusiasmos. Quem estiver querendo encurtar
distâncias para um conhecimento mais rápido, pergunte
aos professores, que eles saberão dizer muito pelo
muito acompanhar em cada aula.
Alguns anos depois, volto à estimada Faculdade de
Direito, de cuja fundação pude participar ativamente em
1964, e não me contenho de contentamento ao encontrar os
mentores e amigos de quem eu tinha tantas saudades. Não
mais nas salas de aula, não mais a separação hierárquica
professor/aluno, mais ainda um respeito profundo a cada
um, consideração que nunca poderá faltar, mestre eternamente
mestre. Com que prazer, encontrei e reencontrei o
nobre Georgino Jorge de Souza na cadeira de diretor, solene,
respeitabilíssimo, oferecendo grandeza ao cargo, presença
visível de sabedoria mercê de muitos estudos. Emoções
ao cumprimentar, na secretaria, Raul e Cleonice; na
sala dos professores, entre muitos, os mestres Adão Múcio,
Sebastião Vieira, Danilo Borges, José Carlos, Clídio Moura,
Noraldino, Alciliano, Castro, Álvaro, Rita, Paulo César,
Geraldo Barbosa, para dizer apenas os que lecionaram na
minha turma. Que grande falta as ausências dos doutores
José Nunes Mourão e Simeão Ribeiro Pires!
Valeu a pena passar por lá.
A PRAÇA DR. CARLOS
Yvonne de Oliveira Silveira
Cadeira nÀ 05
Patrono: Antônio Ferreira de Oliveira
O Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros,
fundado pelos acadêmicos Wanderlino Arruda e Dário
Cotrim, tem realizado os objetivos de divulgar a História e
a Geografia da Região, através de sua revista semestral, com
excelentes artigos dos sócios, e ainda colaborando para a
preservação de nosso patrimônio histórico.
O atual presidente, acadêmico Itamaury Teles de Oliveira,
vem continuando, com o mesmo entusiasmo, o trabalho
do Instituto Histórico e Geográfico, e, com as Academias
Montes-clarense e Feminina de Letras e a Associação
Amigas da Cultura promove o desenvolvimento cultural
da cidade que se projeta, ao revelar o seu potencial de escritores,
poetas, jornalistas, historiadores e geógrafos.
O Instituto, que é a Casa de Simeão Ribeiro Pires, foi
contemplado com a biblioteca do seu patrono, uma das
maiores de nossa região, pela doação da esposa Teresinha
Gomes Pires – rico patrimônio – e maior fonte de saber, que
só se adquire com os bons livros. Aberta ao público, está
contribuindo para abrir os horizontes do leitor, que deseja
crescer intelectualmente. Ela estará mais enriquecida com
as publicações dos sócios na sua Revista e livros.
O último número desta – edição número IX - tem a
capa ilustrada com fotografia de parte da Praça Dr. Carlos
Versiani – meu mundo na infância e adolescência – ao lado
da Rua Padre Augusto.
Vendo-a, surgiram as lembranças. O nosso velho e caro Mercado, os bruaqueiros e os animais com as bruacas,
uma de cada lado do lombo, para o transporte dos produtos
da lavoura: cereais, legumes, cana-de-açúcar, grãos de
café, frutas silvestres, frangos, ovos, carnes, toucinho, mel,
rapaduras, doces, queijos, farinha, goma – um montão de
coisas, como dizíamos, ao fazermos as compras com os pais,
aos sábados da grande feira,
O Mercado, onde hoje se encontra o Shopping Popular,
como este, ficava entre as ruas Rui Barbosa e Cel. Antônio dos
Anjos, abaixo, loja e residência de Carlos Pereira – loja era o
nome das casas de negócio atuais, e ainda outra casa.
Na fotografia, vê-se apenas parte do Mercado e da
residência de João Fróes, na esquina da Rui Barbosa com a
Bocaiúva – hoje Dr. Santos, e, na outra esquina com a praça,
o sobrado de Juca Versiani.
Revejo, porém, toda a Praça Dr. Carlos Versiani com
a loja de meu avô Francisco Peres de Souza, um dos primeiros
comerciantes dali, tendo se iniciado com a vendinha de
rapadura, que ficou de pé bem tempo, depois de inaugurada
a Casa Peres. Mais importante, logo depois, nossa residência
e a farmácia do meu pai, o farmacêutico Antônio
Ferreira de Oliveira, também jornalista, escritor e poeta.
Do alto da jabuticabeira que dava para a Praça, vejo-a
com todas as residências e casas comerciais. A casa de seu
Herculano Trindade, já no início da Rua Quinze e a Camilo
Prates, D. Carlota dos Anjos com a “baratinha”, segundo
automóvel da cidade, para os passeios à tarde, sempre acompanhada
de uma de nós, filhas das amigas, pois não podia
ir só com o Zé Motorista. O sobrado do Cel. Antônio dos
Anjos, pai de Cyro dos Anjos, tendo, também, uma loja, na
outra esquina a Farmácia Fróes e a seguir a loja de seu Cocó
– José Costa, a residência de Cel. Joaquim Sarmento, pai de
Dulce Sarmento, e ao centro o jardim sem traçado artístico,
feito pelo farmacêutico Mário Veloso, quando era Agente
Executivo, cercado de arame farpado, para evitar a invasão
de animais que chegavam.
Praça do Mercado, Praça Dr. Carlos Versiani, praça
da minha infância, de lembranças, que não morrem. Brincadeiras
no jardim, compras na feira, à noite, os adultos,
nas cadeiras, à porta da casa e nós a brincarmos. Minha
família, meu mundo revivido com a capa da Revista do Instituto,
o mundo que depois foi para a Rua Padre Augusto.
Ambos inesquecíveis, cantando e chorando na alma.